A 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) manteve sentença, da 4ª Vara Federal do Amapá, que condenou um homem a oito meses de prisão, em regime inicial aberto e 20 dias-multa pelos crimes de resistência e desacato. Ao analisar o caso, o Colegiado entendeu que a penalidade aplicada estava de acordo com as provas apresentadas durante o processo e com a jurisprudência brasileira.
Em seu recurso, o denunciado alegou que não tinha a intenção de cometer os crimes mencionados e que o crime de desacato não é aplicável pelo ordenamento jurídico brasileiro devido à sua revogação pela Convenção Americana de Direitos Humanos no Brasil.
Ao votar por manter a sentença, o relator do processo, juiz federal convocado Saulo Casali Bahia, afirmou que as razões da apelação não questionam se o fato ocorreu ou se o acusado é o responsável, mas sim que não houve intenção de cometer o ato e que a conduta de desacato não pode ser aplicada no País.
Nesse sentido, o magistrado destacou que o Código Penal brasileiro, no seu art. 331, “pune o crime de desacato a funcionário público, no exercício da função ou em razão dela, exigindo-se dolo específico, consistente na vontade livre e consciente de desprezar ou humilhar servidor público, de desprestigiá-lo, com palavras ou ações, em razão da função pública por ele exercida, conforme entendimento firmado pela sentença recorrida”.
Intenção de cometer os crimes – No seu depoimento, o acusado reconheceu que xingou um dos policiais rodoviários e que resistiu ao ser algemado, o que segundo Saulo Casali, demonstra a intenção de cometer os crimes. Assim, para o juiz federal, “não há nenhuma dúvida de que a ação do acusado se voltou contra policial rodoviário federal quando exercia suas funções no posto policial do município de Macapá/AP, tendo ele (o acusado) conhecimento dessa circunstância, já que foi o próprio acusado que se dirigiu ao posto policial para obter informações acerca de um veículo que lhe pertencia e que contra si foi dada voz de prisão em razão de mandado de prisão expedido em seu desfavor por crime pretérito”.
Sobre o enquadramento do crime de desacato no ordenamento jurídico brasileiro, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a norma do art. 331 do Código Penal foi incorporada à Constituição Federal: “2. De acordo com a jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos e do Supremo Tribunal Federal, a liberdade de expressão não é um direito absoluto e, em casos de grave abuso, faz-se legítima a utilização do Direito Penal para a proteção de outros interesses e direitos relevantes”.
Em relação ao crime de resistência, o magistrado destacou que “há prova judicializada de que o apelante se opôs deliberadamente, mediante violência, contra o cumprimento do mandado de prisão, proferindo ameaças”.
Diante desse contexto, o juiz federal convocado afirmou que as razões apresentadas pelo apelante não buscam reverter a condenação, pois não invalidam a sentença, que “louvou-se nos elementos informativos dos autos, documentais e orais, dando pela procedência da ação penal, culminando na condenação do acusado pelos delitos de desacato e desobediência na medida da sua culpabilidade”.
O recurso ficou assim ementado:
PENAL E PROCESSUAL PENAL. DESACATO. FIXAÇÃO DE TESE PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. DESOBEDIÊNCIA. MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS. DOLO CONFIGURADO. DESPROVIMENTO DA APELAÇÃO.
1. O delito do art. 331 do Código Penal pune o crime de desacato a funcionário público, no exercício da função ou em razão dela, exigindo-se dolo específico, consistente na vontade livre e consciente de desprezar ou humilhar servidor público, de desprestigiá-lo com palavras ou ações, em razão da função pública por ele exercida.
2. Em julgamento de Arguição de descumprimento de preceito fundamental julgada improcedente, o Supremo Tribunal Federal fixou a seguinte tese: “Foi recepcionada pela Constituição de 1988 a norma do art. 331 do Código Penal, que tipifica o crime de desacato”. (ADPF 496, DJe-235, publicado em 24-09-2020).
3. O delito previsto no art. 329 do Código Penal exige o dolo específico na vontade de o agente não permitir a realização de ato legal, mediante ameaça ou violência.
4. Materialidade, autoria e elemento volitivo comprovados. Apelação desprovida.
O Colegiado acompanhou o voto do relator, confirmando a decisão que condenou o apelante.
Processo: 0006336-71.2017.4.01.3100