Proposta de seguro encaminhada por consumidor após o sinistro não tem validade

Mesmo sendo dispensáveis a apólice ou o pagamento do prêmio, para que o contrato de seguro se aperfeiçoe são indispensáveis tanto o envio da proposta pelo interessado ou pelo corretor quanto o consentimento, expresso ou tácito, da seguradora.

Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou pedido de pagamento de indenização feito por consumidora que encaminhou proposta de seguro de automóvel após o sinistro.

Segundo o relator do caso, ministro Villas Bôas Cueva, para que o contrato de seguro possa ser concluído, ele necessita passar, comumente, por duas fases: a da proposta, em que o segurado fornece as informações necessárias para o exame e a mensuração do risco, indispensável para a garantia do interesse segurável; e a da aceitação do negócio pela seguradora, ocasião em que esta emitirá a apólice.

Consentimento recíproco

Villas Bôas Cueva afirmou que “a proposta é, portanto, a manifestação da vontade de apenas uma das partes e, no caso do seguro, deverá ser escrita e conter a declaração dos elementos essenciais do interesse a ser garantido e do risco. Todavia, apesar de obrigar o proponente, não gera por si só o contrato, que depende do consentimento recíproco de ambos os contratantes”.

O relator acrescentou ainda que a seguradora, recebendo a proposta, tem um prazo de até 15 dias para recusá-la, do contrário, o silêncio importará em aceitação tácita.

No caso, a cliente não enviou a proposta, nem mesmo por intermédio de corretor, antes do acontecimento do sinistro (furto do automóvel), ou seja, não manifestou a sua vontade de firmar o contrato em tempo hábil; tampouco houve a concordância, ainda que tácita, da seguradora. Na realidade, quando a cliente decidiu fazer o seguro, já não havia mais o objeto do contrato.

“Poderia ter sido concluído o contrato na própria concessionária, com o preenchimento e o envio do formulário da proposta à seguradora, com os cálculos do prêmio deste, o que geraria a concordância mútua, mas preferiu retirar o veículo antes de segurá-lo”, ressaltou o ministro.

Ação de cobrança

A consumidora comprou um carro zero quilômetro em uma concessionária, mas não fechou o contrato de seguro na hora. Ela preferiu retirar o veículo da concessionária antes de fazê-lo e teve o bem furtado no dia seguinte.

Após o furto, ela enviou a proposta à seguradora Liberty Paulista Seguros S/A e pagou a primeira parcela do seguro. Entretanto, a seguradora só foi informada do furto do veículo 20 dias após o acontecimento. Por ausência de aceitação em tempo hábil, a seguradora não pagou a indenização.

A cliente, então, ajuizou uma ação de cobrança com o objetivo de conseguir a indenização securitária.

A sentença entendeu que o bem não estava protegido porque a proposta ainda estava sob análise da seguradora, de modo que o contrato de seguro ainda não havia se efetivado quando o sinistro ocorreu. Em apelação, o Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a decisão.

No STJ, a cliente alegou que o documento enviado pela seguradora, consistente na proposta de seguro, “deixava perfeitamente claro que o veículo estava segurado”, argumentação sem sucesso no julgamento realizado pela Terceira Turma.

O recurso ficou assim ementado:

RECURSO ESPECIAL. CIVIL. SEGURO DE AUTOMÓVEL. FORMAÇÃO DO CONTRATO. NÃO OCORRÊNCIA. ENVIO DA PROPOSTA APÓS O SINISTRO (FURTO DO VEÍCULO). VONTADE DO CONSUMIDOR MANIFESTADA A DESTEMPO. AUSÊNCIA DE ACEITAÇÃO EXPRESSA OU TÁCITA DA SEGURADORA. PERDA DO OBJETO DO CONTRATO. INEXISTÊNCIA DE RISCO SEGURÁVEL.
1. Ação de cobrança visando ao pagamento de indenização securitária, cingindo-se a controvérsia a perquirir se o contrato de seguro de automóvel, após prévias negociações, perfectibiliza-se quando a proposta for encaminhada pelo consumidor à seguradora depois de ocorrido o sinistro.
2. O contrato de seguro, para ser concluído, necessita passar, comumente, por duas fases: i) a da proposta, em que o segurado fornece as informações necessárias para o exame e a mensuração do risco, indispensável para a garantia do interesse segurável, e ii) a da recusa ou aceitação do negócio pela seguradora, ocasião em que emitirá, nessa última hipótese, a apólice.
3. A proposta é a manifestação da vontade de apenas uma das partes e, no caso do seguro, deverá ser escrita e conter a declaração dos elementos essenciais do interesse a ser garantido e do risco. Todavia, apesar de obrigar o proponente, não gera por si só o contrato, que depende de consentimento recíproco de ambos os contratantes.
4. A seguradora, recebendo a proposta, terá o prazo de até 15 (quinze) dias para recusá-la, caso contrário, o silêncio importará em aceitação tácita (cf. Circular Susep nº 251⁄2004).
5. No contrato de seguro de automóvel, o início da vigência será a partir da realização da vistoria, exceto para os veículos zero quilômetro ou quando se tratar de renovação do seguro na mesma sociedade seguradora, pois, nessas situações, a vigência será a partir da data da recepção da proposta pelo ente segurador (art. 8º, caput e § 1º, da Circular Susep nº 251⁄2004).
6. Para que o contrato de seguro se aperfeiçoe, são imprescindíveis o envio da proposta pelo interessado ou pelo corretor e o consentimento, expresso ou tácito, da seguradora, mesmo sendo dispensáveis a apólice ou o pagamento de prêmio.
7. Não há contrato de seguro se o particular envia a proposta após ocorrido o sinistro (a exemplo de furto de veículo), visto que não há a manifestação da vontade em firmar a avença em tempo hábil, tampouco existe a concordância, ainda que tácita, da seguradora. Além disso, nessa hipótese, quando o proponente decidiu ultimar a avença, já não havia mais o objeto do contrato (interesse segurável ou risco futuro).
8. Recurso especial não provido.

Leia a íntegra do voto do relator.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1273204

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