Nas ações de indenização originadas de relações de consumo, não é do consumidor o ônus de provar o defeito do produto, bastando que demonstre a relação de causa e efeito entre o produto e o dano – o que faz presumir a existência do defeito. Por outro lado, na tentativa de se eximir da obrigação de indenizar, é o fornecedor quem precisa comprovar, de forma cabal, a inexistência do defeito ou alguma outra excludente de responsabilidade.
Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que julgou improcedente a ação de indenização ajuizada pelo dono de um veículo incendiado, sob o fundamento de que o consumidor não comprovou a existência de defeito de fabricação que pudesse ter causado o sinistro.
A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso, explicou que, nos termos do artigo 12 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), o fornecedor responde, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos do produto. “O defeito, portanto, se apresenta como pressuposto especial à responsabilidade civil do fornecedor pelo acidente de consumo”, declarou.
Requisitos para a definição de responsabilidade do fornecedor
Segundo a relatora, o defeito deve ser analisado em conjunto com os demais pressupostos da responsabilidade civil objetiva: a conduta – que, no CDC, equivale à colocação do produto no mercado ou à participação na cadeia de consumo; o nexo de causalidade entre o dano gerado ao consumidor e a conduta de oferecimento do produto no mercado; e o dano efetivamente sofrido pelo consumidor.
Por outro lado, a ministra destacou que o próprio artigo 12 do CDC elenca expressamente, em seu parágrafo 3º, as excludentes de responsabilidade pelo fato do produto: não ter colocado o produto no mercado, não existir o defeito, ou haver culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. “O ônus da prova, nessa seara, é do fornecedor do produto. Para se exonerar da responsabilidade, a ele compete provar, cabalmente, alguma das hipóteses previstas no artigo 12, parágrafo 3º, do CDC”, esclareceu a ministra.
Consumidor apontou nexo causal; fornecedor não o afastou
No caso dos autos, a relatora ressaltou que o consumidor cumpriu a exigência de prova do CDC ao demonstrar que o acidente de consumo derivou do produto, uma vez que o veículo pegou fogo. Segundo a magistrada, embora a perícia não tenha identificado a causa do incêndio, a inexistência de defeito no veículo deveria ser comprovada pelas rés – a fabricante e a concessionária –, que, não o fazendo, não se eximem da responsabilidade.
“Em consequência, e principalmente para fins de averiguação e quantificação dos danos experimentados pelos recorrentes, deverá ser realizado um novo julgamento pelo tribunal de origem, observada a distribuição do ônus da prova ora definida”, concluiu a ministra.
O recurso ficou assim ementado:
DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COMPENSAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. INCÊNDIO DE VEÍCULO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. RESPONSABILIDADE CIVIL POR FATO DO PRODUTO. ÔNUS DA PROVA. FORNECEDOR.
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Ação de compensação por danos materiais e morais ajuizada em 28/02/2018, da qual foi extraído o presente recurso especial interposto em 27/10/2020 e concluso ao gabinete em 14/07/2021.
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O propósito recursal consiste em definir, para além da negativa de prestação jurisdicional, a quem incumbe o ônus de comprovar o defeito do produto, ou a sua inexistência, no âmbito do Código de Defesa do Consumidor.
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É firme a jurisprudência do STJ no sentido de que não há ofensa ao art. 1.022 do CPC/2015 quando o Tribunal de origem, aplicando o direito que entende cabível à hipótese, soluciona integralmente a controvérsia submetida à sua apreciação, ainda que de forma diversa daquela pretendida pela parte.
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O fornecedor responde, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos do produto (art. 12 do CDC). O defeito, portanto, se apresenta como pressuposto especial à responsabilidade civil do fornecedor pelo acidente de consumo. Todavia, basta ao consumidor demonstrar a relação de causa e efeito entre o produto e o dano, que induz à presunção de existência do defeito, cabendo ao fornecedor, na tentativa de se eximir de sua responsabilidade, comprovar, por prova cabal, a sua inexistência ou a configuração de outra excludente de responsabilidade consagrada no § 3º do art. 12 do CDC.
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Hipótese em que o Tribunal de origem não acolheu a pretensão ao fundamento de que os recorrentes (autores) não comprovaram a existência de defeito no veículo que incendiou. Entretanto, era ônus das fornecedoras demonstrar a inexistência de defeito.
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Recurso especial conhecido e provido.
Leia o acórdão no REsp 1.955.890.