Omitir ou prestar declaração falsa a autoridade fazendária constitui crime contra a ordem tributária

A 3ª Turma do Tribunal Regional Federal 1ª Região manteve a condenação de um homem que omitiu em suas declarações de imposto de renda (DIRFs), por três anos consecutivos, os valores que foram depositados em suas contas bancárias com a finalidade suprimir o tributo, resultando na constituição de crédito tributário no valor de R$2.532.107,49. O réu apelou contra a sentença, do Juízo Federal da 1ª Vara de Vitória da Conquista/BA, que o condenou pela prática do delito tipificado no art. 1º, I, da Lei 8.137/90 c/c art. 71, caput, do Código Penal, crime contra a ordem tributária.

Sustentou o apelante que as provas trazidas pela denúncia são nulas, pois foram obtidas por meios ilícitos e que, em razão da ausência de provas sobre a omissão de rendimentos e da ausência de dolo, deve ele ser absolvido das acusações.

O relator, juiz federal convocado José Alexandre Franco, ao analisar o caso, destacou que o ajuizamento de ação anulatória de débito fiscal não constitui óbice ao prosseguimento da ação penal nem enseja sua suspensão, pois encerrado o procedimento administrativo-fiscal e constituído o crédito tributário “não há o que se falar em suspensão do curso da ação penal em face da propositura da ação anulatória no juízo cível, em que se discute a ocorrência dos fatos que ensejaram referida ação penal, tendo em vista que já houve a constituição, em definitivo, do crédito tributário na esfera administrativa, consumando-se, em tese, o crime do art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90”.

Ressaltou o magistrado que “as circunstâncias judiciais e a culpabilidade, os antecedentes criminais, a conduta social, a personalidade, os motivos, as circunstâncias e consequências do crime (art. 59), inclusive o valor sonegado e a existência de outras autuações fiscais, foram adequadamente considerados para fixar a pena-base pouco acima do mínimo (dois anos e cinco meses de reclusão e 58 dias-multa), acrescida de um quinto em virtude da continuidade delitiva, resultando em dois anos e dez meses de reclusão e 69 dias-multa, no regime aberto, substituída pelas penas restritivas de direitos e multa”.

Segundo o juiz federal convocado, a defesa teve amplas possibilidades de demonstrar que os créditos em suas contas bancárias não constituíam rendimentos, porém deixou de apresentar provas nesse sentido à autoridade fazendária e também ao juízo penal. Ainda que as testemunhas confirmem que o denunciado intermediava compras de gado e outros negócios na área rural, nada há que demonstre que os valores que transitaram em suas contas pertencessem a terceiros. O acusado não indicou o nome de uma pessoa sequer com quem tenha negociado nesses termos.

Concluindo seu voto, o magistrado afirmou que o quantitativo de dias-multa aplicado guarda proporcionalidade com a pena privativa de liberdade. Porém, o valor do dia-multa, fixado em três salários mínimos, mostrou-se excessivo. Além do mais, a situação econômica do acusado, já punido administrativamente, recomenda a fixação do valor do dia-multa em um terço do salário mínimo. Pelas mesmas razões, justifica-se a redução da multa em 30 salários mínimos em favor de entidade com destinação social para o equivalente a 10 salários mínimos.

Nesses termos, o Colegiado, acompanhando o voto do relator, deu parcial provimento à apelação apenas para reduzir o valor dia-multa para o equivalente a um terço do salário mínimo vigente à época dos fatos e o valor da multa para 10 salários mínimos.

O recurso ficou assim ementado:

PENAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. ART. 1º, I, DA LEI 8.137/1990. OMISSÃO DE RENDIMENTOS À AUTORIDADE FAZENDÁRIA. DOLO ESPECÍFICO. COMPROVADO. VALIDADE DAS PROVAS. CONDIÇÃO DE PROCEDIBILIDADE. CONSTITUIÇÃO DEFINITIVA DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. DOSIMETRIA. PARCIAL PROVIMENTO.

1. A denúncia se baseia em informações colhidas em procedimento administrativo-fiscal a partir de incompatibilidades entre os valores recolhidos pelo apelante a título de CPMF e suas DIRF’s e, também, em extratos de movimentação bancária apresentados voluntariamente à autoridade fazendária, sem quaisquer máculas que tornem nulas as provas.

2. O ajuizamento de ação anulatória de débito fiscal não constitui óbice ao prosseguimento da ação penal nem enseja sua suspensão, pois encerrado o procedimento administrativo-fiscal e constituído o crédito tributário.

3. O apelante foi condenado nas penas do art. 1º, I, da Lei 8.137/90, por ter omitido rendimentos às autoridades fazendárias em suas DIRF’s, nos anos-calendário 2002, 2003 e 2004, com o objetivo de suprimir tributo, resultando na constituição de crédito tributário no valor de R$2.532.107,49.

4. Os crimes tipificados nos art. 1º, I a IV, da Lei 8.137/90 são materiais ou de resultado, sendo necessária a existência de dolo específico para sua configuração.

5. O elemento subjetivo consiste na vontade livre e consciente de suprimir o tributo devido. O delito ocorre quando o agente omite informação ou presta declaração falsa à autoridade fazendária, não se contentando a norma com o dolo genérico, haja vista que o elemento subjetivo exigir a especial finalidade de suprimir ou reduzir pagamento de tributo.

6. As provas excluem a possibilidade de que o apelante omitiu rendimentos sem consciência da ilicitude de sua conduta, até porque reiterou a conduta em três exercícios financeiros consecutivos (anos-calendário 2002, 2003 e 2004), tendo ainda deixado de responder às intimações fiscais ou a quaisquer outros termos expedidos pela Secretaria da Receita Federal a fim de que comprovasse a origem dos valores creditados em suas contas bancárias ou mesmo sua alegada atividade de intermediação de compra e venda.

7. A prova produzida permite concluir com segurança que o crime de sonegação fiscal consumou-se, pois foi suficientemente demonstrada materialidade, autoria e o dolo específico consistente na vontade livre e consciente de omitir informação para o fim de reduzir ou suprimir tributo.

8. As circunstâncias judiciais e a culpabilidade, os antecedentes criminais, a conduta social, a personalidade, os motivos, as circunstâncias e consequências do crime (art. 59), inclusive o valor sonegado e a existência de outras autuações fiscais, foram adequadamente considerados para fixar a pena-base pouco acima do mínimo (2 anos e 5 meses de reclusão e 58 dias-multa), acrescida de 1/5 em virtude da continuidade delitiva, resultando em 2 anos e 10 meses de reclusão e 69 dias-multa, no regime aberto, substituída pelas penas restritivas de direitos, e multa.

9. O quantitativo de dias-multa aplicado guarda proporcionalidade com a pena privativa de liberdade. Porém, o valor de cada dia-multa, fixado em 3 salários mínimos, mostra-se excessivo, ainda que tendo por referencial as movimentações financeiras do apelante.

10. A situação econômica do apelante, já punido administrativamente, aconselha a fixação do valor do dia-multa em 1/3 do salário mínimo. Pelas mesmas razões, justifica-se a redução da multa arbitrada em 30 salários mínimos, em favor de entidade com destinação social, para o equivalente a 10 salários mínimos.

11. Parcial provimento da apelação apenas para reduzir o valor dia-multa para o equivalente a 1/3 do salário mínimo vigente à época dos fatos e o valor da multa para 10 salários mínimo.

Processo: 0002237-34.2008.4.01.3307

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