TRF3 determina concessão de benefício assistencial a portadora de diabetes mellitus e insuficiência cardíaca 

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Para magistrados, ficou comprovado que autora preenche o requisito da deficiência e não possui meios de prover a própria manutenção

Decisão Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) confirmou sentença que determinou ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) conceder o Benefício de Prestação Continuada (BPC) a uma mulher portadora de diabetes mellitus, hipertensão arterial e insuficiência cardíaca.

Para os magistrados, ficou comprovado nos autos que ela preenche o requisito da deficiência e não possui meios de prover a própria manutenção ou de tê-la custeada por sua família.

Para o recebimento do BPC, a lei considera pessoa com deficiência aquela com impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial que pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

Com base em exames físicos e laboratoriais, o perito considerou que a autora da ação está impossibilitada de modo permanente para atividades braçais.

“Considerando a idade, as patologias, o analfabetismo, o fato de que sempre exerceu atividades laborativas como trabalhadora braçal e, consequentemente, a ausência de qualificação profissional, não vislumbro nenhuma possibilidade de reabilitação profissional com sucesso”.

Ao analisar o caso, o relator do processo, desembargador federal Carlos Delgado, ressaltou que a perícia médica comprovou o impedimento de longo prazo para o trabalho.

“A demandante é incapaz e totalmente insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, sobretudo, em virtude do seu contexto socioeconômico e das patologias de que é portadora”, apontou.

O magistrado relatou que a hipossuficiência econômica também restou incontroversa, pois o INSS não impugnou o capítulo da sentença que a reconheceu.

A Justiça Estadual de Amabai/MS, em competência delegada, havia condenado a autarquia previdenciária a conceder o benefício e o pagamento dos atrasados.

Após a decisão, o INSS ingressou com recurso no TRF3, sob o fundamento de que a mulher não comprovou a existência de impedimento de longo prazo.

No Tribunal, a Sétima Turma negou provimento ao recurso e determinou a implantação do benefício e o pagamento dos valores atrasados a partir da data do requerimento administrativo.

O recurso ficou assim ementado:

PROCESSUAL CIVIL. CONSTITUCIONAL. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO IDOSO E À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. BENEFÍCIO DE VALOR MÍNIMO PAGO AO IDOSO. EXCLUSÃO. ART. 34, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI Nº 10.741/03. APLICAÇÃO POR ANALOGIA. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS DO STJ (REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA). STF. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO § 3º DO ART. 20 DA LEI Nº 8.472/93, SEM PRONÚNCIA DE NULIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO ISOLADA. ANÁLISE DA MISERABILIDADE EM CONJUNTO COM DEMAIS FATORES. IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO CONFIGURADO. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA INCONTROVERSA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DEVIDO. DIB. DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA. CONSECTÁRIOS LEGAIS ALTERADOS DE OFÍCIO.

1 – O art. 203, V, da Constituição Federal instituiu o benefício de amparo social, assegurando o pagamento de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.

2 – A Lei nº 8.742/93 e seus decretos regulamentares estabeleceram os requisitos para a concessão do benefício, a saber: pessoa deficiente ou idoso com 65 anos ou mais e que comprove possuir renda familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo.

3 – Pessoa com deficiência é aquela incapacitada para o trabalho, em decorrência de impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com uma ou mais barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, na dicção do art. 20, §2º, com a redação dada pela Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015.

4 – A Lei Assistencial, ao fixar a renda per capita, estabeleceu uma presunção da condição de miserabilidade, não sendo vedado comprovar a insuficiência de recursos para prover a manutenção do deficiente ou idoso por outros meios de prova. Precedente jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso representativo de controvérsia.

5 – No que diz respeito ao limite de ¼ do salário mínimo per capita como critério objetivo para comprovar a condição de miserabilidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Reclamação nº 4374/PE, reapreciou a decisão proferida em sede de controle concentrado de constitucionalidade (ADI nº 1.232-1/DF), declarando a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.

6 – Pleiteia a parte autora a concessão de benefício assistencial, uma vez que, segundo alega, é incapaz e não possui condições de manter seu próprio sustento ou de tê-lo provido por sua família.

7 – O profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com base em exame realizado em 08 de março de 2018 (ID 131556696, p. 80/85), quando a demandante tinha 59 (cinquenta e nove) anos de idade, o diagnosticou com “diabetes mellitus tipo II, hipertensão arterial sistêmica e insuficiência cardíaca”.

8 – Com base em “exames físicos e laboratoriais” e na aferição de “cansaço frequente, dispneia e fatigabilidade aos médios esforços”, o perito considerou que a requerente está impossibilitada de modo “permanente para as atividades braçais”.

9 – Em seguida, embora o profissional tenha respondido abstratamente que a incapacidade da autora é apenas parcial, ao contextualizar e individualizar a situação da requerente, a conclusão é de que, na prática, não se apresentam possibilidades concretas de retorno ao trabalho, como se observa nas próprias palavras do expert: “Considerando a idade de 59 anos e 9 meses; considerando as patologias da mesma; considerando o analfabetismo; considerando o fato de que sempre exerceu suas atividades laborativas  como trabalhadora braçal e consequentemente, a ausência de qualificação profissional; considerando a pouca oferta de trabalho, condizente com a realidade local (Amambaí – MS), não vislumbro nenhuma possibilidade de reabilitação profissional com sucesso”.

10 – Da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu do que dispõe o artigo 479 do Código de Processo Civil e do princípio do livre convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.

11 – Saliente-se que a perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente, o qual respondeu aos quesitos elaborados e forneceu diagnóstico com base na análise de histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando demais análises que entendeu pertinentes, e, não sendo infirmado pelo conjunto probatório, referida prova técnica merece confiança e credibilidade.

12 – Dessa forma, tem-se que a demandante é incapaz e totalmente insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, sobretudo, em virtude do seu contexto socioeconômico e das patologias de que é portadora, restando configurado o impedimento de longo prazo.

13 – A hipossuficiência econômica restou incontroversa nos autos, na medida em que o INSS não impugnou o capítulo da sentença que a reconheceu.

14 – Desta feita, presentes os requisitos legais, a parte autora faz jus ao beneplácito assistencial.

15 – Acerca do termo inicial do benefício, firmou-se consenso na jurisprudência que este se dá na data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua inexistência. (AgRg no REsp 1532015/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/08/2015, DJe 14/08/2015).\” Assim, tendo em vista a apresentação de requerimento administrativo pela parte autora em 02/06/2017 (ID 126278533, p. 1), de rigor a fixação da DIB em tal data.

16 – A caracterização da deficiência e da miserabilidade ao longo do processo, por meio da perícia técnica ou do estudo social, têm como resultado retroagir os seus efeitos para a data em que pela primeira vez foram alegadas, é dizer, apenas se confirma situação pretérita já existente. Essa é a lógica do entendimento jurisprudencial.

17 – Assim, tendo em vista a apresentação de requerimento administrativo pela parte autora em 25/07/2013 (ID 131556696, p. 12), de rigor a fixação da DIB em tal data. Observa-se que na própria perícia as queixas de afastamento do trabalham datam de aproximadamente cinco anos antes, corroborando a existência do impedimento de longo prazo à época do requerimento administrativo.

18 – A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.

19 – Os juros de mora devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.

20 – A partir da promulgação da EC nº 113/2021, publicada em 09/12/2021, para fins de atualização monetária e compensação da mora, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente.

21 – Saliente-se que, não obstante tratar-se de benefício assistencial, deve ser observado o tópico do Manual atinente aos benefícios previdenciários, a teor do disposto no parágrafo único do art. 37 da Lei nº 8.742/93.

22 – Apelação do INSS desprovida. Consectários legais alterados de ofício.

Apelação Cível 5003258-83.2020.4.03.9999

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