Repetitivo desobriga planos de fornecer medicamento não registrado pela Anvisa

Em julgamento de dois recursos especiais sob o rito dos recursos repetitivos, relatados pelo ministro Moura Ribeiro, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que as operadoras de plano de saúde não são obrigadas a fornecer medicamentos não registrados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

De acordo com o ministro relator, o entendimento firmado abrange tanto medicamentos nacionais quanto importados, visto que a lei de controle sanitário (Lei 6.360/76) exige de todo fármaco, nacionalizado ou não, o seu efetivo registro.

O julgamento do tema, cadastrado sob o número 990 no sistema dos repetitivos, fixou a seguinte tese: “As operadoras de plano de saúde não estão obrigadas a fornecer medicamento não registrado pela Anvisa”.

Esse entendimento já consta da jurisprudência do tribunal, mas passa agora à condição de precedente qualificado, com ampla repercussão em toda a Justiça. De acordo com o artigo artigo 927 do Código de Processo Civil, a definição da tese pelo STJ vai servir de orientação às instâncias ordinárias, inclusive aos juizados especiais, para a solução de casos fundados na mesma questão jurídica.

Com o julgamento do tema, voltam a tramitar os processos que, por tratar da mesma controvérsia, estavam suspensos em todo o território nacional à espera da definição do STJ. Só nos tribunais de segunda instância estavam sobrestados 204 recursos especiais a respeito da matéria, segundo Moura Ribeiro.

Câncer e hepatite

No REsp 1.726.563, a Amil Assistência Médica Internacional S.A. se recusou a cobrir despesas com tratamento de câncer de pâncreas à base dos medicamentos Gencitabina e Nab-Paclitaxel (Abraxane). Já no REsp 1.712.163, a Amil e a Itauseg Saúde se negaram a fornecer o medicamento Harvoni, para tratamento de hepatite C.

Em ambos os casos, decisões de segunda instância fundamentadas no Código de Defesa do Consumidor (CDC) obrigaram as operadoras a fornecer o tratamento prescrito pelos médicos.

No STJ, o ministro Moura Ribeiro explicou que as disposições do CDC têm aplicação apenas subsidiária aos contratos firmados entre usuários e operadoras de plano de saúde, “conforme dicção do artigo 35-G da Lei 9.656/98, razão pela qual, nas hipóteses de aparente conflito de normas, pelos critérios da especialidade e da cronologia, devem prevalecer as normas de controle sanitário, que visam ao bem comum”.

Infrações

Além disso, o relator observou que a obrigação de fornecer “não se impõe na hipótese em que o medicamento recomendado seja de importação e comercialização vetada pelos órgãos governamentais, porque o Judiciário não pode impor que a operadora do plano de saúde realize ato tipificado como infração de natureza sanitária, prevista no artigo 66 da Lei 6.360/76, e criminal também, prevista na norma do artigo 273 do Código Penal”.

Segundo o ministro, não há como o Poder Judiciário “atropelar todo o sistema criado para dar segurança sanitária aos usuários de medicamentos, sob pena de causar mais malefícios que benefícios”. Isso não impede – acrescentou – que pacientes prejudicados por suposta omissão da Anvisa no registro de medicamentos venham a ajuizar ações específicas para apurar possível responsabilidade civil da agência reguladora.

Recursos repetitivos

O novo Código de Processo Civil regula a partir do artigo 1.036 o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos recursos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.

A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica.

No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como saber a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações.

O REsp nº 1726563 ficou assim ementado:
RECURSO ESPECIAL. RITO DOS RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS. PLANO DE SAÚDE. CONTROVÉRSIA ACERCA DA OBRIGATORIEDADE DE FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO NÃO REGISTRADO PELA ANVISA.
1. Para efeitos do art. 1.040  do NCPC:
1.1. As operadoras de plano de saúde não estão obrigadas a fornecer medicamento não registrado pela ANVISA.
2. Aplicação ao caso concreto:
2.1. Não há ofensa ao art. 535 do CPC⁄73 quando o Tribunal de origem enfrenta todas as questões postas, não havendo no acórdão recorrido omissão, contradição ou obscuridade.
2.2. É legítima a recusa da operadora de plano de saúde em custear medicamento importado, não nacionalizado, sem o devido registro pela ANVISA, em atenção ao disposto no art. 10, V, da Lei nº 9.656⁄98, sob pena de afronta aos arts. 66 da Lei nº 6.360⁄76 e 10, V, da Lei nº 6.437⁄76. Incidência da Recomendação nº 31⁄2010 do CNJ e dos Enunciados nº 6 e 26, ambos da I Jornada de Direito da Saúde, respectivamente, A determinação judicial de fornecimento de fármacos deve evitar os medicamentos ainda não registrados na Anvisa, ou em fase experimental, ressalvadas as exceções expressamente previstas em lei; e, É lícita a exclusão de cobertura de produto, tecnologia e medicamento importado não nacionalizado, bem como tratamento clínico ou cirúrgico experimental.
2.3. Porém, após o registro pela ANVISA, a operadora de plano de saúde não pode recusar o custeio do tratamento com o fármaco indicado pelo médico responsável pelo beneficiário.
3. Recurso especial parcialmente provido. Acórdão sujeito ao regime do art. 1.040 do NCPC.
O REsp 1712163 ficou assim ementado:
RECURSO ESPECIAL. RITO DOS RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS. PLANO DE SAÚDE. CONTROVÉRSIA ACERCA DA OBRIGATORIEDADE DE FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO NÃO REGISTRADO PELA ANVISA.
1. Para efeitos do art. 1.040  do NCPC:
1.1. As operadoras de plano de saúde não estão obrigadas a fornecer medicamento não registrado pela ANVISA.
2. Aplicação ao caso concreto:
2.1. Não há ofensa ao art. 535 do CPC⁄73 quando o Tribunal de origem enfrenta todas as questões postas, não havendo no acórdão recorrido omissão, contradição ou obscuridade.
2.2. É legítima a recusa da operadora de plano de saúde em custear medicamento importado, não nacionalizado, sem o devido registro pela ANVISA, em atenção ao disposto no art. 10, V, da Lei nº 9.656⁄98, sob pena de afronta aos arts. 66 da Lei nº 6.360⁄76 e 10, V, da Lei nº 6.437⁄76. Incidência da Recomendação nº 31⁄2010 do CNJ e dos Enunciados nº 6 e 26, ambos da I Jornada de Direito da Saúde, respectivamente, A determinação judicial de fornecimento de fármacos deve evitar os medicamentos ainda não registrados na Anvisa, ou em fase experimental, ressalvadas as exceções expressamente previstas em lei; e, É lícita a exclusão de cobertura de produto, tecnologia e medicamento importado não nacionalizado, bem como tratamento clínico ou cirúrgico experimental.
2.3. Porém, após o registro pela ANVISA, a operadora de plano de saúde não pode recusar o custeio do tratamento com o fármaco indicado pelo médico responsável pelo beneficiário.
2.4. Em virtude da parcial reforma do acórdão recorrido, com a redistribuição dos ônus da sucumbência, está prejudicado o recurso especial manejado por ONDINA.
3. Recurso especial interposto pela AMIL parcialmente provido. Recurso especial manejado por ONDINA prejudicado. Acórdão sujeito ao regime do art. 1.040 do NCPC.
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