OAB não deve promover por execução judicial cobrança de dívidas referentes a anuidades inferiores a quatro vezes o valor cobrado anualmente

A 7ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), por unanimidade, negou provimento à apelação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) contra a sentença que extinguiu o processo, sem resolução do mérito, por inadequação da forma escolhida para execução fiscal sobre inadimplência de anuidade. O processo foi extinto pelo juízo de 1º Grau sob o argumento de que a OAB pode promover a execução de forma extrajudicial com eficácia executiva garantida pela Lei n. 12.514/2011.

Na apelação, a OAB sustentou que embora seja detentora de título executivo extrajudicial, optar pela constituição do crédito por meio de processo judicial, não gera impedimento para o prosseguimento da ação e fica preservada a competência do juízo comum. Além disso, a OAB não está restrita ao rito da Lei de Execuções Fiscais, porquanto poderá cobrar seus devedores por outro meio legal, à luz do artigo 785 do Código de processo Civil.

Ao analisar o caso, o relator, desembargador federal Hercules Fajoses, destacou a natureza jurídica sui generis da OAB, ou seja, sua característica peculiar das demais autarquias. “A OAB ocupa-se de atividades atinentes aos advogados, que exercem função constitucionalmente privilegiada, na medida em que são indispensáveis à administração da Justiça. É entidade cuja finalidade é afeita a atribuições, interesses e seleção de advogados. Não há ordem de relação ou dependência entre a OAB e qualquer órgão público. Entretanto, entendo que a OAB possui esta natureza sui generis somente com relação à sua função institucional determinada pelo art. 133 da Constituição Federal, quando desempenha papel de grande relevância junto à Sociedade, na defesa das garantias individuais e coletivas e da própria democracia. No que diz respeito à relação da OAB com seus inscritos, os Advogados, entendo ser esta eminentemente de natureza corporativa e atinente aos Conselhos Profissionais em geral, visto que exerce o papel de órgão fiscalizador da atividade profissional, cobrando contribuições e aplicando sanções de natureza disciplinar aos seus inscritos”, explicou.

O magistrado ressaltou que a Lei n. 12.514/2011 estabelece critérios rígidos para fixação das anuidades, deixando para os Conselhos Profissionais de Fiscalização a função regulamentar. Segundo o relator, a norma determinou aos Conselhos Profissionais a divulgação e fixação da anuidade conforme índices arbitrados pelo Congresso. Entre eles, o previsto no artigo 8º, o qual determina que os conselhos não executarão judicialmente dívidas referentes a anuidades inferiores a quatro vezes o valor cobrado anualmente da pessoa física ou jurídica inadimplente. “Assim, a regra contida no artigo 8º da Lei n. 12.514/2011 é de política judiciária, administração da Justiça, aplicável a todas as execuções dos Conselhos Profissionais, inclusive à OAB, salvo se houver lei especial sobre a matéria. Além disso, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) em jurisprudência já pacificou que embora a OAB possua natureza jurídica especialíssima, deve se submeter ao disposto na referida, que proíbe a execução judicial de dívidas referentes a anuidades inferiores a quatro vezes o valor cobrado anualmente da pessoa física ou jurídica inadimplente”, finalizou.

O recurso ficou assim ementado:

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE RITO ORDINÁRIO. ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. ANUIDADES. VALOR MÍNIMO. ART. 8º DA LEI Nº 12.514/2011. ART. 785 DO CPC. INAPLICABILIDADE.

1. A Ordem dos Advogados do Brasil – OAB tem natureza jurídica de autarquia sui generis já declarada pelo egrégio Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI 3026.

2. Entretanto, a OAB possui esta natureza sui generis somente com relação à sua função institucional determinada pelo art. 133 da Constituição Federal, quando desempenha papel de grande relevância junto à Sociedade, na defesa das garantias individuais e coletivas e da própria democracia. No que diz respeito à relação da Ordem dos Advogados do Brasil com seus inscritos, os Advogados, entende-se ser esta eminentemente de natureza corporativa e atinente aos Conselhos Profissionais em geral, visto que exerce o papel de órgão fiscalizador da atividade profissional, cobrando contribuições e aplicando sanções de natureza disciplinar aos seus inscritos.

3. O presente entendimento não contraria o quanto foi decidido em sede de controle de constitucionalidade levado a efeito pelo egrégio Supremo Tribunal Federal, vez que, como já acima repisado, a OAB não estaria voltada de forma exclusiva a finalidades corporativas, o que não significa dizer que estaria vedada à instituição exercer tais finalidades juntamente com o seu mister institucional, o que, de fato, ocorre.

4. Desta forma, existem duas funções distintas que são exercidas pela Ordem dos Advogados do Brasil. A primeira, de caráter exógeno, se dá pela relação entre a OAB e a Sociedade em geral, na defesa dos direitos fundamentais e da democracia (residindo aqui a sua natureza de autarquia sui generis). A segunda, de caráter endógeno, se dá pela relação entre a OAB e seus inscritos, funcionando como verdadeiro Conselho Profissional e, como tal, encontra-se sob a égide da norma geral prevista na Lei nº 12.514/2011.

5. A Lei nº 12.514/2011 estabelece critérios rígidos para fixação das anuidades (arts. 3º a 6º), deixando para os Conselhos Profissionais de Fiscalização a função regulamentar (art. 6º, § 2º).

6. O art. 8º da Lei nº 12.514/2011 estabelece que: “Os Conselhos não executarão judicialmente dívidas referentes a anuidades inferiores a 4 (quatro) vezes o valor cobrado anualmente da pessoa física ou jurídica inadimplente. Parágrafo único: O disposto no caput não limitará a realização de medidas administrativas de cobrança, a aplicação de sanções por violação da ética ou a suspensão do exercício profissional”.

7. Assim, a regra contida no art. 8º da Lei nº 12.514/2011 é de política judiciária (administração da Justiça), aplicável a todas as execuções dos Conselhos Profissionais, inclusive à OAB, salvo se houver lei especial sobre a matéria.

8. O egrégio Superior Tribunal de Justiça reconhece que: \”na cobrança de anuidade dos advogados a Ordem dos Advogados do Brasil atua como órgão de classe, não havendo propósito, por mais que tenha elementos diferenciais em relação aos outros órgãos de classe, que justifique sua exclusão da aplicação do art. 8º da Lei nº 12.514/2011. […] A jurisprudência do STJ está pacificada no sentido de que, embora a OAB possua natureza jurídica especialíssima, deve se submeter ao disposto no art. 8º da Lei nº 12.514/2011, que proíbe a execução judicial de dívidas referentes a anuidades inferiores a quatro vezes o valor cobrado anualmente da pessoa física ou jurídica inadimplente\” (REsp 1784177/MS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 02/06/2020, DJe de 21/08/2020).

9. Não há que se falar na aplicação do art. 785 do Código de Processo Civil, haja vista que a OAB está sob a égide da Lei nº 12.514/2011, em especial o art. 8º que disciplina a execução de dívida oriunda de anuidade.

10. Apelação não provida.

Processo 1070766-80.2020.4.01.3400

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