Trabalho rural irregular e difícil não se confunde com o crime de redução à condição análoga à de escravo

Ainda que as condições de trabalho em que oito pessoas encontradas por fiscalização sejam irregulares e duras, em um local de extrativismo vegetal e queima de madeira no município de Pedra Azul/MG, tais condições não podem ser confundidas com o crime de redução à condição análoga à de escravo. Com esse fundamento, a 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) manteve a sentença que decidiu que as provas trazidas ao processo pelo Ministério Público Federal (MPF) são insuficientes para se configurar o crime do art. 149 do Código Penal (CP).

Segundo a denúncia, na fazenda foram encontradas oito pessoas trabalhando em condições desumanas, submetidas a jornadas exaustivas e com locomoção restringida devido a dívidas com o empregador. Não dispunham de equipamento de proteção individual, Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) ou remuneração digna, disse o MPF, pontuando haver provas suficientes do crime.

Porém, para o relator, juiz federal convocado Saulo Casali Bahia, “o diagnóstico de que o trabalhador foi (ou não) submetido a ‘trabalhos forçados’; a ‘jornada exaustiva’ de trabalho; ‘a condições degradantes de trabalho’ ou que teve restringida, ‘por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto’, exige quase sempre a realização de um juízo de valor”.

Irregularidades x crime – Segundo o magistrado, no caso, a restrição da locomoção tem como causa a dificuldade de acesso do local de trabalho, e não em razão das dívidas contraídas pelo trabalhador, conforme prova testemunhal. Portanto, prosseguiu o juiz federal em seu relatório, conforme os precedentes da Turma, verificou-se que, ainda que as condições de trabalho não fossem as ideais, duras pela própria natureza do trabalho rural, as irregularidades descritas não demonstraram a existência do crime.

“A condenação somente se justifica em casos graves e extremos, sem razoabilidade, quando a violação aos direitos do trabalho é intensa e persistente, alçando-se níveis gritantes, tudo sob o crivo da prova judicial”, observou.

O recurso ficou assim ementado:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. ART. 149, DO CP. CRIME DE REDUÇÃO À CONDIÇÃO ANÁLOGA À DE ESCRAVO. TIPO MISTO ALTERNATIVO CONDIÇÕES DEGRADANTES. DEMONSTRAÇÃO PROBATÓRIA INSUFICIENTE.

1. Segundo a denúncia, em fiscalização realizada em local de extrativismo vegetal e queima de madeira no município de Pedra Azul, foram encontradas 8 (oito) pessoas trabalhando em condições desumanas.

2. Ainda que as condições de trabalho ofertadas não fossem as ideais, e a despeito das irregularidades descritas, não ficou demonstrado, com suficiência penal, nenhum dos núcleos do art. 149 do Código Penal, em particular o reportado na denúncia, que se refere às condições degradantes.

3. As condições de trabalho no meio rural, usualmente braçal, duras pela própria natureza da atividade, não podem, em si mesmas, ser confundidas com redução à condição análoga à de escravo.

4. A condenação somente se justifica em casos graves e extremos, sem razoabilidade, quando a violação aos direitos do trabalho é intensa e persistente, alçando-se níveis gritantes, tudo sob o crivo da prova judicial.

5. Apelação desprovida.

O relator concluiu pela inexistência de provas suficientes e seu voto foi acompanhado pela Turma por unanimidade.

 

Processo: 0011077-96.2010.4.01.3813

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