A cobrança de tarifa de liquidação antecipada para contratos bancários de crédito e arrendamento mercantil anteriores a dezembro de 2007 foi considerada válida pelos ministros da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Ao dar parcial provimento a recurso do Banco Itaú, os ministros afirmaram que até dezembro de 2007 a regulamentação bancária permitia a cobrança desse tipo de tarifa, desde que prevista nos contratos.
O ministro relator do recurso, Marco Buzzi, afirmou que a questão foi pacificada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) com a edição da Resolução 3.516, de dezembro de 2007, que vedou a cobrança. Antes dessa data, segundo o magistrado, a norma vigente (Resolução 2.303/96) permitia a cobrança.
“Impende ressaltar que, ao tempo do referido normativo, a orientação estatal quanto à cobrança de tarifas pelas instituições financeiras era essencialmente não intervencionista, ou seja, a regulamentação facultava às instituições financeiras a cobrança pela prestação de quaisquer tipos de serviços”, ressaltou Marco Buzzi.
Caso a caso
A ação foi proposta pelo Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa das Relações de Consumo (Ibedec) em setembro de 2007. Um dos pontos acolhidos no recurso foi a delimitação do período prescricional para contestar a cobrança. O acórdão recorrido estabeleceu um período de dez anos anteriores à propositura da ação, e tal período foi reduzido para cinco anos, de acordo com a jurisprudência do STJ para casos de condenação em âmbito de ação civil pública.
Marco Buzzi destacou que o caso de cada consumidor será analisado de forma individual, na fase de cumprimento do julgado, quando serão juntados os documentos referentes ao contrato para verificar se houve pactuação expressa ou se a cobrança foi feita sem previsão contratual – situação em que o banco deverá devolver os valores.
De acordo com a decisão, nos contratos assinados após a Resolução 3.516, qualquer cobrança de tarifa de liquidação antecipada também será devolvida, atendendo ao pedido do Ibedec, que afirmou que a prática continuou mesmo após sua vedação pela norma administrativa – razão pela qual é necessário analisar todos os casos.
A devolução deverá ocorrer, nos casos pertinentes, apenas no valor efetivamente pago, corrigido monetariamente. Os ministros acolheram o pedido para afastar a devolução em dobro definida em segunda instância, por entender que não houve má-fé da instituição financeira.
O recurso ficou assim ementado:
RECURSO ESPECIAL – AÇÃO COLETIVA DE CONSUMO – ANÁLISE DE CONTRATOS DE CONCESSÃO DE CRÉDITO E DE ARRENDAMENTO MERCANTIL À LUZ DE RESOLUÇÃO DO BANCO CENTRAL RELATIVAMENTE À TARIFA DE LIQUIDAÇÃO ANTECIPADA DO DÉBITO – INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS QUE JULGARAM PROCEDENTE O PEDIDO PARA DECLARAR A ILEGALIDADE DO ENCARGO. INSURGÊNCIA DA CASA BANCÁRIA⁄DEMANDADA.Hipótese: Controvérsia acerca da possibilidade de cobrança de tarifa de liquidação antecipada de contratos de mútuo e arrendamento mercantil.1. Não há falar em ausência de interesse de agir para o ajuizamento da demanda, pois, em que pese tenha sido vedada pela Resolução nº 3.516⁄07 do CMN⁄BACEN, de 6 de dezembro de 2007, a possibilidade de cobrança da tarifa de liquidação antecipada nos contratos de concessão de crédito e de arrendamento mercantil, fato é que a presente ação coletiva foi ajuizada em setembro de 2007 quando não havia notícia da referida vedação e o alcance temporal pretendido remonta aos ajustes contratuais firmados nos últimos cinco anos da data do ajuizamento da ação.2. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que a análise quanto à necessidade de produção de provas e impossibilidade de julgamento antecipado da lide esbarra no óbice da Súmula 7⁄STJ, porquanto seria necessário reexaminar as circunstâncias fáticas e o conjunto probatório constante dos autos para concluir se a produção da prova almejada pelo recorrente seria, ou não, imprescindível para o julgamento da demanda.3. A modificação e elastecimento do intervalo de abrangência da condenação já na segunda instância ensejou julgamento além do pedido e efetiva violação ao artigo 294 do Código de Processo Civil⁄73, que estabelece ao autor somente poder aditar o pedido antes da citação e, em caso de modificação posterior, a parte ré necessariamente deverá concordar, o que definitivamente não é o caso.4. Compete ao Conselho Monetário Nacional dispor sobre taxa de juros e sobre a remuneração dos serviços bancários, nos termos dos arts. 4º e 9º da Lei nº 4.595⁄64, recebida pela Constituição como lei complementar, entendimento esse, inclusive, sedimentado em sede de julgamento de recurso repetitivo no âmbito da Segunda Seção desta Corte Superior (Resp’s. 1.255.573 e 1.251.331, julgados em 28⁄03⁄2013, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti).4.1 Ao tempo da Resolução nº 2.303⁄96 que disciplinava, genericamente, acerca da “cobrança de tarifas pela prestação de serviços por parte das instituições financeiras”, a orientação estatal quanto à cobrança de tarifas pelas instituições financeiras era essencialmente não intervencionista, ou seja, a regulamentação facultava às instituições financeiras a cobrança pela prestação de quaisquer tipos de serviços, com exceção daqueles que a norma definia como básicos, desde que fossem efetivamente contratados e prestados ao cliente, assim como respeitassem os procedimentos voltados a assegurar a transparência da política de preços adotada pela instituição.4.2 Durante a vigência da Resolução CMN nº 2.303⁄1996 era lícita a cobrança pela prestação de quaisquer tipos de serviços pelas instituições financeiras, entre eles o de liquidação antecipada de operação de crédito, desde que efetivamente contratados e prestados e, somente com o advento da Resolução CMN nº 3.516, de 10 de dezembro de 2007, é que foi expressamente vedada a cobrança de tarifa em decorrência de liquidação antecipada de contratos de concessão de crédito e de arrendamento mercantil financeiro.4.3 Viabilidade da cobrança da tarifa de liquidação antecipada de contrato, desde que expressamente prevista nos contratos entabulados até a data da entrada em vigor da Resolução nº 3.501⁄2007, ou seja, para as operações de crédito e arrendamento mercantil contratadas antes de 10⁄12⁄2007 podem ser cobradas tarifas pela liquidação antecipada no momento em que for efetivada a liquidação, desde que a cobrança dessa tarifa esteja claramente identificada no extrato de conferência.5. Conforme a jurisprudência consolidada no âmbito deste Superior Tribunal de Justiça, a repetição em dobro do indébito requer a demonstração de má-fé na cobrança, o que não foi comprovado na hipótese. Precedentes.6. Não havendo comprovação da má-fé e, em virtude do princípio da simetria que deve salvaguardar a atuação das partes, não afigura viável em sede de demanda coletiva a condenação da financeira ao pagamento de honorários advocatícios.7. Recurso especial parcialmente provido.