A 7ª Turma Cível do TJDFT manteve, por unanimidade, condenação por danos morais de jornalista do Rio Grande do Norte que ofendeu a honra da ex-Procuradora-Geral da República, Raquel Dodge, com a publicação de termos misóginos nas redes sociais Twitter e facebook. O réu deverá, ainda, conceder direito de resposta ou retratação à autora.
Conforme os autos, o réu teria publicado matérias, nas quais fez uso das expressões “a cadela do fascismo”, a “cadela do fascismo está sempre no cio” e “a cadela do @MPF_PGR”, este último numa referência ao perfil oficial da Procuradoria-Geral da República para divulgação institucional. Todas as falas foram publicadas em alusão à autora.
No recurso, ele alega que o julgador da primeira sentença se valeu do termo cadela isoladamente e distante do contexto das publicações veiculadas por ele. Afirma que suas manifestações foram feitas “sob o pálio da liberdade de imprensa e da livre manifestação do pensamento”, garantidas pela Constituição Federal. Explica que, na condição de jornalista, difundiu em suas redes sociais que a “’cadela do fascismo’ está de volta ao País”, para não dizer o próprio fascismo – regime onde as liberdades individuais e coletivas são cerceadas. Garante que não usou a expressão para rotular a autora, que à época exercia o cargo de Procuradora-Geral do Brasil, tão pouco para macular sua honra ou imagem, muito menos depreciar sua condição de mulher. Requer que seja retirada a condenação ou reduzido o valor dos danos morais arbitrados.
A autora, por sua vez, afirma que o discurso discriminatório não pode ser artificialmente confundido com liberdade de expressão. Assim, solicitou o aumento da indenização para R$ 50 mil, direito de resposta e retratação pública do réu, nas mesmas redes sociais em que as ofensas foram publicadas.
Ao analisar os fatos, o desembargador relator destacou que a informação jornalística é legítima se preencher três requisitos: o interesse social da notícia, a verdade do fato narrado e a contingência da narração. Contudo, de acordo com o magistrado, haverá responsabilidade civil se o informante ultrapassar a pauta estabelecida.
O julgador registrou que é direito da imprensa informar à coletividade os acontecimentos e ideias, bem como a coletividade também tem direito a essa informação. No entanto, se, eventualmente, surge colisão entre os direitos fundamentais da intimidade, honra, imagem e vida privada versus o direito de imprensa e liberdade de expressão, a solução deve ser encontrada sob o critério da razoabilidade e da proporcionalidade.
“Apesar de o apelante [réu] defender a utilização jornalística da célebre frase de Bertold Brecht ‘a cadela do fascismo está sempre no cio’, como crítica jornalística a uma possibilidade de se reproduzir o fascismo no Brasil, o que se evidencia é que a utilização da expressão permitiu um trocadilho para se difundir um sentido misógino e ofensivo de interpretação, possível por ser mulher a Procuradora-Geral da República, à época, a senhora Raquel Elias Ferreira Dodge. […] de forma que, indubitavelmente, atingiu a autora em sua honra, bom nome, intimidade e vida privada”, afirmou.
Diante disso, o colegiado concluiu que restou evidente a prática de ato ilícito e o consequente dever de reparação por danos morais. No entendimento dos desembargadores, a quantia de R$ 25 mil deve ser mantida, pois satisfaz a proporcionalidade entre o ilícito e o dano sofrido pela autora, bem como atende ao caráter compensatório e inibidor de novos atos dessa natureza.
O réu deverá, também, conceder direito de resposta ou retificação das matérias, em formato de nota, a ser publicada em face de todos os veículos de comunicação social que tenham divulgado, publicado, republicado, transmitido ou retransmitido a publicação original, como preceitua a Lei 13.188/2015. A publicação integral da sentença condenatória não se confunde com o direito de resposta.
O recurso ficou assim ementado:
CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INFORMAÇÃO JORNALÍSTICA VEICULADA EM REDES SOCIAIS (TWITTER E FACEBOOK). PROCURADORA-GERAL DA REPÚBLICA. OFENSA À HONRA, À INTIMIDADE E À VIDA PRIVADA DA AUTORA. COMPROVAÇÃO. CONFIGURAÇÃO DE DANOS MORAIS. QUANTUM INDENIZATÓRIO. DIREITO DE RESPOSTA OU RETIFICAÇÃO RECONHECIDO.
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A violação da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem dá ensejo à reparação por danos morais e patrimoniais, nos exatos termos do artigo 5º, inciso X, da Carta Magna.
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Em contrapartida, reconhece-se o direito de a imprensa informar à coletividade os acontecimentos e ideias, bem como o direito dessa coletividade à informação, também garantido pelo artigo 5º, inciso XIV, da CF. Entretanto, se surge, eventualmente, colisão desses direitos fundamentais (intimidade, honra, imagem e vida privada x direito de imprensa e liberdade de expressão), a solução é encontrada a partir da ponderação dos princípios concorrentes no caso concreto, avaliando-os sob o critério da razoabilidade e da proporcionalidade.
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A informação jornalística é legítima se preencher três requisitos: o interesse social da notícia, a verdade do fato narrado e a contingência da narração. Contudo, haverá responsabilidade civil se o informante desbordar dessa pauta estabelecida.4. No caso dos autos, as matérias não foram legítimas, porquanto não apoiadas apenas na narrativa dos fatos e do momento crítico da notícia, mas sim fazendo um juízo de valor negativo e utilizando-se de expressão que permitiu trocadilho misógino e ofensivo, desbordando o limite da informação, de forma que, indubitavelmente, atingiu a autora em sua honra, bom nome, intimidade e vida privada, restando evidente a prática de ato ilícito por parte do réu e consubstanciado o dever de reparação por danos morais.
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Na fixação da indenização por danos morais, deve considerar o Juiz a proporcionalidade e a razoabilidade da condenação em face do dano sofrido pela parte ofendida e o seu caráter compensatório e inibidor, mediante o exame das circunstâncias do caso concreto. Quantum mantido.
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É assegurado o direito de resposta ou retificação ao ofendido em matéria jornalística, o que deve ser deferido com base no artigo 2º da Lei nº 13.188/2015. Com efeito, o direito de resposta ou retificação deve ser publicado “em face de todos os veículos de comunicação social que tenham divulgado, publicado, republicado, transmitido ou retransmitido o agravo original” (§ 1º do Art. 3º da lei nº 13.188/2015).
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A publicação integral da sentença condenatória não se confunde com o direito de resposta. Precedente do STJ.
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Recurso da autora parcialmente provido. Recurso do réu não provido.
Acesse o PJe2 e confira a íntegra do processo: 0726268-51.2018.8.07.0001