“O interesse e a consequente legitimidade do credor fiduciário para cobrança da taxa de ocupação existem e se mantêm até o momento da arrematação do imóvel em leilão. A partir desse momento, no entanto, o interesse do arrematante se sobressai, e passa a ser ele o legitimado ativo para a ação de cobrança.”
Esse foi o entendimento da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em julgamento de recurso especial interposto pelo Banco Industrial do Brasil S.A. contra decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que declarou a ilegitimidade ativa da instituição financeira em ação de cobrança de taxa de ocupação de imóvel arrematado.
Para o Banco Industrial, o acórdão violou o artigo 37-A da Lei 9.514/97, pois, apesar de o imóvel ter sido arrematado, a propriedade e o registro do bem ainda estavam em seu nome e, por essa razão, seria o único legitimado a promover ação de cobrança da taxa de ocupação, que visa a indenizar o proprietário do imóvel pela privação do exercício de posse.
Sucessor
O relator, ministro Luis Felipe Salomão, não acolheu o argumento. Ele citou o artigo 30, também da Lei 9.514, que estabelece que é assegurada ao fiduciário, seu cessionário ou sucessores, inclusive ao adquirente do imóvel em leilão público, a reintegração na posse do bem, que será concedida liminarmente, para desocupação em 60 dias, desde que comprovada a consolidação da propriedade em seu nome.
Para Salomão, se a lei confere legitimidade ao credor fiduciário e ao arrematante para ação de reintegração de posse, e esta interessa obviamente a quem está injustamente privado da posse, o interesse do arrematante se sobressai, uma vez que, após o leilão, é seu o direito que passa a ser objeto de proteção legal.
Legítimo possuidor
Em relação à condição imposta pelo artigo 30, de exigir que seja comprovada a consolidação da propriedade em nome do fiduciário, seu cessionário ou sucessores, o relator destacou que depois da arrematação o registro do imóvel nem sempre é rápida, mas que o arrematante pagou pelo bem e possui a carta de arrematação em seu nome.
“Essa taxa de ocupação tem por finalidade compensar o legítimo possuidor do imóvel que se encontra impedido de fruir do bem por injusta ocupação do devedor fiduciante, e a partir da arrematação é a posse do arrematante que está sendo obstada”, destacou Salomão.
Entendimento em sentido contrário, completou o ministro, conferiria ao banco vantagem patrimonial não prevista na lei, geradora de enriquecimento sem causa, pois ele já recebeu o que lhe cabe.
O colegiado ressalvou no julgamento que o termo inicial de incidência da taxa de ocupação é o momento da arrematação em leilão.
O recurso ficou assim ementado:
RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535, II, DO CPC⁄1973. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE IMÓVEL. ART. 37-A DA LEI N° 9.514⁄97. AÇÃO DE COBRANÇA DE TAXA DE OCUPAÇÃO. BEM ARREMATADO EM LEILÃO EXTRAJUDICIAL. ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM DO CREDOR FIDUCIÁRIO APÓS A ARREMATAÇÃO. LEGITIMIDADE DO ARREMATANTE. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. SIMILITUDE FÁTICA NÃO COMPROVADA.
1. Não há violação ao artigo 535, II, do CPC⁄1973, quando embora rejeitados os embargos de declaração, a matéria em exame foi devidamente enfrentada pelo Tribunal de origem, que emitiu pronunciamento de forma fundamentada, ainda que em sentido contrário à pretensão da recorrente.
2. Dispõe o art. 37-A da Lei n. 9.514⁄1997 que “o fiduciante pagará ao fiduciário, ou a quem vier a sucedê-lo, a título de taxa de ocupação do imóvel, por mês ou fração, valor correspondente a um por cento do valor a que se refere o inciso VI do art. 24, computado e exigível desde a data da alienação em leilão até a data em que o fiduciário, ou seus sucessores, vier a ser imitido na posse do imóvel”.
3. “A mens legis, ao determinar e disciplinar a fixação da taxa de ocupação, tem por objetivo compensar o novo proprietário em razão do tempo em que se vê privado da posse do bem adquirido, cabendo ao antigo devedor fiduciante, sob pena de evidente enriquecimento sem causa, desembolsar o valor correspondente ao período no qual, mesmo sem título legítimo, ainda usufrui do imóvel” (REsp 1328656⁄GO, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, DJe 18⁄09⁄2012).
4. A legitimidade ativa para a ação de cobrança da taxa de ocupação é, nos termos do art. 37-A da Lei n. 9.514⁄1997, do credor fiduciário ou do arrematante do bem dado em garantia fiduciária, a depender do momento em que proposta a demanda e o período de sua abrangência.
5. Ajuizada a ação de cobrança em momento anterior à arrematação do bem, é o credor fiduciário o legitimado para a cobrança da taxa referida. Por outro lado, proposta em momento em que já havida a arrematação, é do arrematante a legitimidade ativa da ação de cobrança da taxa de ocupação.
6. É entendimento assente do Superior Tribunal de Justiça a exigência do prequestionamento dos dispositivos tidos por violados, ainda que a contrariedade tenha surgido no julgamento do próprio acórdão recorrido. Incidem por analogia, na espécie, as Súmulas 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal.
7. Não se conhece de recurso especial com base na alínea “c” do permissivo constitucional, quando o julgado for fundado em fatos e provas, como ora se apresenta, por ser inviável a demonstração de similitude fática. Precedentes.
8. Recursos especiais não providos.