Não há previsão nas normas coletivas da categoria.
A Seção Especializada em Dissídios Coletivos (SDC) do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o pedido do Sindicato das Empresas de Vigilância, Segurança e Transporte de Valores do Estado de Mato Grosso do Sul de adoção de jornada de trabalho em regime de tempo parcial para os vigilantes patrimoniais do estado. Segundo o colegiado, devem ser consideradas válidas apenas as jornadas discriminadas, de forma expressa, nas convenções coletivas da categoria.
Interpretação de cláusula coletiva
Três sindicatos representantes da categoria no estado ajuizaram dissídio coletivo para definir a interpretação correta da cláusula das convenções coletivas de trabalho de 2020/2022, firmadas com o sindicato patronal, que autorizavam jornadas de trabalho com escalas de 12×36, 7×7, 15×15, 6×1 e 5×2, com o limite de 8 horas e 48 minutos diários e 44 horas semanais.
O impasse em relação à jornada teve início quando a Security Segurança venceu uma licitação do Banco do Brasil para prestação de serviços no estado, mediante edital que previa o regime de tempo parcial, de 20 ou 30 horas semanais. Segundo as entidades representativas da categoria, as empresas, para concorrerem à licitação, passaram a praticar jornadas prejudiciais aos trabalhadores, contrárias às previstas na convenção coletiva.
O sindicato que representa as empresas, por sua vez, defendeu que a cláusula da convenção coletiva não vedava a adoção da jornada em regime de tempo parcial, que, por sua vez, é autorizada no artigo 58-A da CLT.
Jornada discriminada
O Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região (MS) considerou válidas apenas as jornadas de trabalho expressamente discriminadas nas convenções coletivas. Para o TRT, a intenção da norma foi, rigorosamente, afastar a jornada de trabalho em regime de tempo parcial para os vigilantes, do contrário, a categoria não teria recusado a sua inclusão em duas oportunidades.
Intervenção mínima
A relatora do recurso do sindicato das empresas, ministra Delaíde Miranda Arantes, explicou que, no exame das convenções ou dos acordos coletivos, a Justiça do Trabalho deve seguir o princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade das partes. Diante de uma norma coletiva com várias interpretações possíveis, o julgador deve dar preferência à que mais se aproxima da verdadeira intenção das partes na fase de negociação.
No caso, ela observou que o sindicato das empresas propôs, por mais de uma vez, durante as negociações, a inclusão de autorização para a jornada parcial, o que sempre fora rechaçado pelos sindicatos profissionais. Nessas condições, o objetivo da cláusula foi restringir as jornadas aplicáveis aos vigilantes, autorizando somente os regimes nela previstos.
Por fim, a ministra destacou que a Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017) estabeleceu a prevalência das normas coletivas negociadas sobre as normas previstas em lei, em particular quando se tratar de jornada de trabalho, desde que observados os limites da Constituição Federal. “Ainda que a lei preveja jornadas distintas das discriminadas no instrumento normativo, como é o caso do regime de tempo parcial, a sua aplicação, no caso, é juridicamente inválida, diante do que expressamente acordaram as partes em convenção coletiva de trabalho”, concluiu.
O recurso ficou assim ementado:
RECURSO ORDINÁRIO. DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA JURÍDICA. INTERPRETAÇÃO DE CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO NO QUE DIZ RESPEITO ÀS JORNADAS DE TRABALHO AUTORIZADAS AOS VIGILANTES PATRIMONIAIS (12×36, 7×7, 15×15, 6×1 e 5×2). 1 – O presente dissídio coletivo foi ajuizado com o objetivo de buscar a correta interpretação da Cláusula 35 das Convenções Coletivas de Trabalho acostadas aos autos, no que diz respeito às jornadas de trabalho autorizadas aos vigilantes patrimoniais, cuja redação estabelece: “Ficam na presente CCT autorizadas às jornadas de trabalho aos vigilantes patrimoniais, além da jornada 12×36, 7×7, 15×15, 6×1 e 5×2”. 2 – A tarefa interpretativa consiste em definir o real objetivo da norma: se ela visa autorizar a realização das jornadas excepcionais ali discriminadas, em concorrência com as demais jornadas autorizadas por lei, ou se ela pretende restringir os regimes de trabalho àqueles mencionados, impossibilitando, dessa forma, a adoção de qualquer outro tipo de jornada laboral. 3 – De acordo com os arts. 8º, § 3º, e 611-A, § 1º, da CLT, no exame de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, a Justiça do Trabalho balizará a sua atuação pelo princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva. Isso significa dizer que, diante de uma norma coletiva da qual se possam extrair várias interpretações possíveis, deve o julgador trabalhista dar preferência àquela que mais se aproxime da verdadeira intenção das partes na fase de negociação. 4 – No caso dos autos, é incontroverso – pois afirmado na petição inicial e não impugnado em defesa – que o sindicato patronal propôs por mais de uma vez durante a fase de negociação a inclusão nas Convenções Coletivas de autorização para a jornada parcial, o que sempre foi rechaçado pelos sindicatos profissionais. 5 – Diante disso, fica claro que a verdadeira intenção dos atores sociais ao negociarem a Cláusula 35 foi restringir as jornadas possíveis de aplicação à categoria dos vigilantes patrimoniais, possibilitando-lhes o exercício apenas dos regimes 12×36, 7×7, 15×15, 6×1 e 5×2, com exclusão de qualquer outra, ainda que legal. 6 – Cumpre destacar que, com a edição da Lei 13.467/2017, o legislador ordinário trouxe a lume o instituto da “prevalência do negociado sobre o legislado”, fazendo constar de forma expressa na CLT que a norma coletiva de trabalho tem prevalência sobre a lei quando dispuser sobre “pacto quanto à jornada de trabalho, observados os limites constitucionais”. 7 – Por essa razão, ainda que a lei preveja jornadas distintas daquelas discriminadas no instrumento normativo, tal como é o caso do regime de tempo parcial, expresso no art. 58-A da CLT, a sua aplicação aos vigilantes patrimoniais revela-se juridicamente inválida, diante do que expressamente acordaram as partes em Convenção Coletiva de Trabalho. 8 – Nesses termos, revela-se correta a conclusão adotada pelo Tribunal Regional no acórdão recorrido, no sentido de “conferir interpretação restritiva à Cláusula 35º da CCT 2020/2022 e considerar válidas apenas as jornadas expressamente nela discriminadas, rejeitando-se a adoção em regime de tempo parcial prevista no art. 58-A da Consolidação das Leis do Trabalho”. Recurso ordinário conhecido e não provido .
A decisão foi unânime.
Processo: ROT-24517-80.2020.5.24.0000