Embora a prática tenha sido considerada reprovável, não houve comprovação de dano.
A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o recurso de um operador mantenedor da Ambev S. A. que alegava que a empresa, ao premiar o cumprimento de metas e pagar horas extras com cervejas, estaria induzindo os trabalhadores ao alcoolismo. Entre outros pontos, a improcedência do pedido levou em conta a ausência de demonstração do dano e o fato de o empregado nem sequer alegar ter desenvolvido dependência.
“Vales-cerveja”
Na reclamação trabalhista, o operador sustentou que a Ambev tinha por prática premiá-lo com caixas de cerveja sempre que realizava muitas horas extras ou atingia as metas, como forma de complementar seu salário, mediante a entrega de “vales-cerveja”. Como prova, apresentou e-mails com frases como “E aí, quem vai levar mais cerveja??????? Está lançado o desafio, agora, time, o negócio é correr!!!!!” e “O resultado do mês passado sai até segunda-feira, na sequência liberamos as cervejas”. O fundamento do pedido foi o artigo 458 da CLT, que veda, em qualquer hipótese, o pagamento de salário com bebidas alcoólicas ou drogas nocivas.
Sem habitualidade
O pedido de indenização foi rejeitado desde o primeiro grau. O juízo da 2ª Vara do Trabalho de Lages (SC) concluiu, com base nos depoimentos de testemunhas, que não havia habitualidade no fornecimento de cerveja e que os empregados não eram obrigados a aceitá-la. Embora considerando reprovável a conduta da empresa, a sentença observa que a bebida era entregue a título de prêmio, e não de salário. “O dano não foi demonstrado, pois o empregado nem sequer alega a existência de dependência”, assinalou o juízo“.
A decisão foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (SC).
Fatos, provas e impertinência temática
Ao julgar a matéria, a Sétima Turma do TST não chegou a entrar no mérito da questão, mas acabou por manter a decisão de negar o pedido de indenização. Para o colegiado, a constatação de que o TRT decidiu a controvérsia com base no conjunto fático-probatório inviabiliza o cabimento do recurso de revista, nos termos da Súmula 126 do TST.
Além disso, o dispositivo de lei apontado como violado (artigo 458 da CLT) não tem pertinência com o tema, pois não versa sobre o direito à indenização por dano moral decorrente de ato ilícito do empregador, mas aborda, especificamente, a questão concernente ao salário in natura.
O recurso ficou assim ementado:
RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE. INTERPOSIÇÃO EM FACE DE ACÓRDÃO PUBLICADO ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. HORAS EXTRAS – INTERVALO INTRAJORNADA – COMPROVAÇÃO. (violação aos artigos 7º, XVI, da CF/88, 58 e 71 da CLT e contrariedade à Súmula nº 437 do TST) A constatação de que o acórdão recorrido decidiu a controvérsia com base no conjunto fático-probatório inviabiliza o cabimento do recurso de revista, nos termos da Súmula nº 126 do TST. No caso, o TRT, soberano na definição do quadro fático ( Súmula/TST nº 126 ), ao examinar o tema recorrido, deixou claro que o trabalhador não tem direito às horas extras, mesmo àquelas decorrentes da supressão do intervalo, a partir de 15/02/2011, visto que não comprovado ter ” havido manipulação de jornada no período posterior à implantação do sistema de ponto da Portaria 15/10/09 “. Recurso de revista não conhecido.
HORAS IN ITINERE – INCOMPATIBILIDADE ENTRE OS HORÁRIOS DA JORNADA DE TRABALHO E O TRANSPORTE PÚBLICO REGULAR. (contrariedade à Súmula nº 90, II, do TST) Constou do acórdão regional que “ ficou provado nos autos que o local de trabalho do autor não era de difícil acesso, sendo servido por várias linhas e horários “ . Logo, ao indeferir as horas in itinere , o TRT decidiu em consonância com a Súmula nº 90, item I, desta Corte, segundo o qual ” O tempo despendido pelo empregado, em condução fornecida pelo empregador, até o local de trabalho de difícil acesso, ou não servido por transporte público regular , e para o seu retorno é computável na jornada de trabalho “. Óbices do artigo 896, §7º, da Consolidação das Leis do Trabalho e da Súmula nº 333 do TST. Recurso de revista não conhecido .
SOBREAVISO – COMPROVAÇÃO. (contrariedade à Súmula nº 428 do TST) No caso, restou delimitado no acórdão regional que “ não comprovado o cerceamento de locomoção ou a obrigatoriedade de responder ao chamado de sobreaviso “ . Logo, ainda que se admitisse a eventual divergência jurisprudencial à nova redação da Súmula nº 428 do TST , o recurso de revista não mereceria seguimento, eis que o primeiro fundamento utilizado no acórdão (ausência de comprovação do cerceamento de locomoção ou a obrigatoriedade de responder ao chamado de sobreaviso ) restaria ileso, justificando o acerto da decisão regional. Consoante a Súmula nº 23 desta Corte, ” não se conhece da revista ou dos embargos, quando a decisão recorrida resolver determinado item do pedido por diversos fundamentos, e a jurisprudência transcrita não abranger a todos “. Recurso de revista não conhecido .
ADICIONAIS DE PERICULOSIDADE E DE INSALUBRIDADE – CUMULAÇÃO. (violação aos artigos 1º, III, IV, 7º, XXII, XXIII, 200, VIII, 225, da CF/88, 189, 192, 193, §2º, da CLT, Lei nº 7.369/85 e Decreto nº 93.412/86, assim como contrariedade à Súmula nº 364 do TST). Da análise do acórdão regional, verifica-se que o TRT não apreciou a controvérsia à luz da impossibilidade de acumulação dos adicionais, mas, sim, em razão de não restar comprovado o requisito necessário ao recebimento do adicional de periculosidade (exposição não eventual). Dessa forma, quanto a essa discussão, incide o teor da Súmula/TST nº 297. De todo o modo, por qualquer ângulo que se examine a questão, seja porque não é devida a acumulação dos adicionais de insalubridade e de periculosidade, seja porque sequer foi comprovado o contato não eventual do trabalhado com agente de risco, não há como se dar seguimento ao recurso de revista. Recurso de revista não conhecido .
MULTA DO ART. 477 DA CLT. (violação ao artigo 477, §8º, da CLT) De acordo com a jurisprudência pacificada nesta Corte, a multa do artigo 477, § 8º, da CLT tem como escopo compensar o prejuízo oriundo, unicamente, do pagamento das verbas rescisórias fora do prazo legal estabelecido em seu § 6º. Na hipótese dos autos, contudo, o TRT deixou explicitamente registrado que constou do termo de rescisão homologado pelo sindicato que o reclamante recebeu o valor que lhe era devido “(…)dentro do prazo legal previsto no art. 477, §6°, ‘b’, da CLT (…)”. Recurso de revista não conhecido .
DANO MORAL/EXISTENCIAL – JORNADA EXAUSTIVA – CONFIGURAÇÃO. (violação aos artigos 1º da CF/88, 186, 187 e 927 do CC) A jurisprudência desta Corte Superior vem se consolidando no sentido de que o mero descumprimento de obrigações trabalhistas, como a imposição de jornada excessiva, por si só, não enseja o reconhecimento automático da ocorrência de dano moral, com o consequente dever de indenizar, sendo necessária a demonstração de que tal fato ofendeu os direitos da personalidade, afastando, por exemplo, o empregado do seu convívio social. Na hipótese dos autos, no entanto, não há registro fático no sentido da limitação do convívio social do reclamante, pelo que não é possível se revolver o acervo probatório a fim de verificar tal circunstância. Aplicabilidade da Súmula/TST nº 126. Recurso de revista não conhecido.
ASSÉDIO MORAL – VALOR DA INDENIZAÇÃO. (violação aos artigos 1º, III e IV, 5º, V e V, 170, 193 da CF/88, 186, 187, 944 do CC, e 8º da CLT) O valor fixado pelo Tribunal Regional tem por objetivo compensar a dor da pessoa, requer, por parte do julgador, bom-senso. E mais, a sua fixação deve-se pautar na lógica do razoável, a fim de se evitar valores extremos (ínfimos ou vultosos). O juiz tem liberdade para fixar o quantum . É o que se infere da leitura do artigo 944 do Código Civil. O quantum indenizatório tem um duplo caráter, ou seja, satisfativo-punitivo. Satisfativo, porque visa a compensar o sofrimento da vítima, e punitivo, porque visa a desestimular a prática de atos lesivos à honra, à imagem das pessoas. Dessa forma, o valor deferido a título de indenização por dano moral, de R$ 3.000,00 (três mil reais) , não se afigura desarrazoado, tampouco irrisório, visto que o Tribunal Regional levou em consideração a extensão do dano, o porte econômico da reclamada e o caráter pedagógico da pena, além de observar os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Recurso de revista não conhecido.
DANO MORAL – INDUÇÃO AO ALCOOLISMO. (violação ao artigo 458 da CLT). A constatação de que o acórdão recorrido decidiu a controvérsia com base no conjunto fático-probatório inviabiliza o cabimento do recurso de revista, nos termos da Súmula nº 126 do TST. Ademais, o único dispositivo legal apontado como violado (art. 458 da CLT), não revela estrita pertinência com o tema, pois não versa sobre o direito à indenização por dano moral decorrente de ato ilícito do empregador, mas aborda especificamente a questão concernente ao salário in natura . Recurso de revista não conhecido.
RECURSOS DE REVISTA DA RECLAMADA. INTERPOSIÇÃO EM FACE DE ACÓRDÃO PUBLICADO ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS – JUROS DE MORA E MULTA – FATO GERADOR. (violação aos artigos 150, III, “a”, 195, I, “a”, da CF/88, 43, §§ 2º e 3º da Lei nº 8.212/93 [má-aplicação] e 276 do Dec.nº 3.048/99 e divergência jurisprudencial) Na espécie, imperiosa a reforma do acórdão regional a fim de ajustá-lo aos termos da Súmula nº 368, itens IV e V, do TST, os quais dispõem, respectivamente, que “Considera-se fato gerador das contribuições previdenciárias decorrentes de créditos trabalhistas reconhecidos ou homologados em juízo, para os serviços prestados até 4.3.2009, inclusive, o efetivo pagamento das verbas, configurando-se a mora a partir do dia dois do mês seguinte ao da liquidação (art. 276, “caput”, do Decreto nº 3.048/1999). Eficácia não retroativa da alteração legislativa promovida pela Medida Provisória nº 449/2008, posteriormente convertida na Lei nº 11.941/2009, que deu nova redação ao art. 43 da Lei nº 8.212/91 ” e que ” Para o labor realizado a partir de 5.3.2009, considera-se fato gerador das contribuições previdenciárias decorrentes de créditos trabalhistas reconhecidos ou homologados em juízo a data da efetiva prestação dos serviços. Sobre as contribuições previdenciárias não recolhidas a partir da prestação dos serviços incidem juros de mora e, uma vez apurados os créditos previdenciários, aplica-se multa a partir do exaurimento do prazo de citação para pagamento, se descumprida a obrigação, observado o limite legal de 20% (art. 61, § 2º, da Lei nº 9.430/96)” . Recurso de revista conhecido e provido em parte.
A decisão foi unânime.
Processo: RR-1079-49.2012.5.12.0029