Atraso na entrega de imóvel comprado na planta, em regra, não dá direito a dano moral

O atraso na entrega de imóvel comprado na planta, em regra, não dá ao comprador o direito de receber pagamento de dano moral da construtora responsável pela obra. A decisão unânime foi da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao analisar um caso que aconteceu em Brasília.

Em 2009, um casal adquiriu uma loja, duas salas comerciais e três garagens em prédio ainda em construção no Setor Hoteleiro Norte, área nobre da capital federal, com a promessa de entrega para 2011. Um ano depois da data marcada, no entanto, os imóveis ainda não tinham sido entregues.

Por causa da demora, o casal decidiu ajuizar uma ação na Justiça. Nas argumentações, os adquirentes alegaram que a ideia era receber os imóveis, alugá-los e utilizar os valores auferidos com os aluguéis para pagar o restante do saldo devedor. Como houve atraso, essa estratégia não foi possível, e eles tiveram que arcar com o pagamento sem os aluguéis.

Recurso

Na ação, o casal pediu, além de danos materiais e multa contratual, que a construtora fosse condenada ao pagamento de dano moral pelo atraso da obra.  O pedido foi aceito parcialmente na primeira instância. A construtora recorreu ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), que acolheu parcialmente o apelo. Inconformados, os cônjuges e a construtora recorreram ao STJ.

O caso foi julgado pela Terceira Turma do STJ, especializada em direito privado, cabendo a relatoria ao ministro Villas Bôas Cueva. Em voto de 20 páginas, o ministro abordou todas as questões levantadas pelo casal e pela construtora para manter o acórdão (decisão colegiada) do TJDFT.

Ao negar o pedido do casal para receber dano moral, o ministro ressaltou que o “simples inadimplemento contratual não é capaz, por si só, de gerar dano moral indenizável, devendo haver consequências fáticas que repercutam na esfera de dignidade da vítima, o que não se constatou no caso concreto”.

Com base nesses fundamentos, o relator destacou ainda que rever as conclusões do TJDFT para estabelecer a existência de dano moral mostra-se inviável, pois demandaria a apreciação de matéria fático-probatória, o que é vedado aos ministros do STJ (Súmula 7 do STJ).

O recurso ficou assim ementado:

RECURSOS ESPECIAIS. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEIS NA PLANTA. ENTREGA DA OBRA. ATRASO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. PROPRIETÁRIO PERMUTANTE. LEGITIMIDADE. CLÁUSULA PENAL. RECIPROCIDADE. LUCROS CESSANTES. CUMULAÇÃO. POSSIBILIDADE. EXCEÇÃO DE CONTRATO NÃO CUMPRIDO. PROVA. ÔNUS. RÉU. EXCESSO DE CHUVAS. ESCASSEZ DE MÃO DE OBRA. CASO FORTUITO. FORÇA MAIOR. NÃO CONFIGURAÇÃO. LUCROS CESSANTES. TERMO FINAL. REEXAME DE PROVAS. INVIABILIDADE. SÚMULA Nº 7⁄STJ. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. DANOS MORAIS.
1. Os recursos especiais têm origem em ação de indenização por perdas e danos decorrentes de atraso na conclusão de obra objeto de contrato de compromisso de compra e venda para fins de aquisição de unidades imobiliárias em empreendimento comercial.
2. O proprietário permutante do terreno não responde pelos atos de incorporação quando se limita à mera alienação do terreno para a incorporadora sem participar de nenhum ato tendente à comercialização ou construção do empreendimento.
3. Na espécie, as instâncias de cognição plena, à luz da prova dos autos, e analisando os contratos celebrados entre as partes, concluíram que a alienante permutante do terreno figurou nos contratos de promessa de compra e venda ora na condição de “vendedora” ora na condição de credora hipotecária, transmitindo para o adquirente⁄consumidor a ideia de solidariedade na efetivação do empreendimento, de forma que não pode ser reconhecida a sua ilegitimidade passiva.
4. A cláusula penal inserta em contratos bilaterais, onerosos e comutativos deve voltar-se aos contratantes indistintamente, ainda que redigida apenas em favor de uma das partes.
5. É possível cumular a cláusula penal decorrente da mora com indenização por lucros cessantes pela não fruição do imóvel, pois aquela tem natureza moratória, enquanto esta tem natureza compensatória.
6. A alegação de exceção de contrato não cumprido arguida em defesa deve ser comprovada pelo réu, pois é seu o ônus de demonstrar o fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, nos termos no artigo 333, inciso II, do CPC⁄1973.
7. Essa Corte já se pronunciou em inúmeras oportunidades no sentido de que a inversão das conclusões da Corte local para afirmar, por exemplo, que o excesso de chuvas e a escassez de mão de obra configuram fatos extraordinários e imprevisíveis, enquadrando-se como hipóteses de caso fortuito ou força maior, demandaria o reexame do conjunto fático-probatório dos autos.
8. A conclusão da Corte local para fixar a data da expedição da carta de habite-se como termo final do pagamento dos lucros cessantes resultou da análise das circunstâncias fáticas, bem como da interpretação de cláusulas contratuais.
9. O simples inadimplemento contratual não é capaz, por si só, de gerar dano moral indenizável, devendo haver consequências fáticas que repercutam na esfera de dignidade da vítima, o que não se constatou no caso concreto.
10. Recursos especiais parcialmente conhecidos e não providos.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1536354

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