A empresa não demonstrou que o contrato firmado com a administração pública admitia salário inferior
A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou o Consórcio Agiliza Rio, do Rio de Janeiro (RJ), a pagar diferenças salariais a uma atendente contratada com salário inferior ao previsto no edital de licitação dos serviços prestados pela empregadora. Para o colegiado, embora o valor do edital não vincule a vencedora do certame, a empresa teria de demonstrar que, no contrato firmado com a administração pública, havia previsão de salário inferior.
Licitação
O consórcio foi o vencedor de procedimento licitatório aberto em 2007 pelo governo do Estado do Rio de Janeiro para a gestão de centrais de atendimento ao cidadão. A atendente trabalhou lá entre 2011 e 2013.
Na reclamação trabalhista, ela argumentou que o edital da licitação previa, para o seu cargo, o salário de R$ 1.012. No entanto, ela fora admitida para receber R$ 627, e sua maior remuneração foi de R$ 708. Pedia, assim, as diferenças salariais, entre outras parcelas.
O consórcio, em sua defesa, sustentou que não há obrigatoriedade de pagamento do salário previsto no edital nem direito a ele, uma vez que a contratação se deu pela CLT.
Lucro indevido
O juízo de primeiro grau deferiu as diferenças, por entender que, ao participar da licitação, o consórcio havia aderido às regras do edital e teria de cumprir o salário estabelecido. Segundo a sentença, a diferença entre os valores pagos pela administração pública à prestadora de serviços e o salário pago por ela à empregada constituiria lucro indevido.
Mera referência
Contudo, para o Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região, o valor apontado na planilha do edital é apenas o preço de referência do custo da obra e não gera direito a terceiros. De acordo com esse entendimento, a concorrência é uma modalidade de licitação para contratação de grande vulto, e não um concurso, destinado à realização de trabalho técnico, científico ou artístico. Somente nesse caso, segundo o TRT, seria garantido aos participantes a remuneração prevista no edital. Com isso, afastou a condenação.
Princípio da vinculação
Prevaleceu, no julgamento do recurso de revista da atendente, o voto do ministro Cláudio Brandão. Ele observou que, de fato, o orçamento estimativo do edital não necessariamente vincula o licitante vencedor. Mas o mesmo não se pode afirmar quanto às cláusulas contratuais firmadas por ele com a administração pública – entre elas a econômico-financeira, que abrange detalhadamente todos os custos informados na proposta.
Na avaliação do relator, a empregadora deveria ter demonstrado por quanto efetivamente se obrigara a remunerar os empregados terceirizados, por se tratar de fato impeditivo ou modificativo do direito da empregada. “Ocorre que a parte não apresentou nenhum documento para comprovar esse ponto – como a cópia do contrato e seus aditivos”, ponderou. “Ela se limitou a afirmar, na defesa, que a planilha de referência não a vinculava de forma alguma. Por esse fundamento, são devidas as diferenças”, concluiu.
O recurso ficou assim ementado:
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO EM FACE DE ACÓRDÃO PUBLICADO APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014, MAS ANTES DA LEI Nº 13.105/2015, DA EDIÇÃO DA IN/TST Nº 40/2016 E DA LEI Nº 13.467/2017. DIFERENÇAS SALARIAIS – SALÁRIO PREVISTO NO EDITAL DE LICITAÇÃO – PRINCÍPIO DA VINCULAÇÃO. Demonstrada divergência jurisprudencial válida e específica, recomendável o processamento do recurso de revista, para melhor exame da matéria veiculada em suas razões. Agravo de instrumento provido .
RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO EM FACE DE ACÓRDÃO PUBLICADO APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014, MAS ANTES DA LEI Nº 13.105/2015, DA EDIÇÃO DA IN/TST Nº 40/2016 E DA LEI Nº 13.467/2017. DIFERENÇAS SALARIAIS – SALÁRIO PREVISTO NO EDITAL DE LICITAÇÃO – PRINCÍPIO DA VINCULAÇÃO. Cinge-se a controvérsia em saber se a planilha anexada ao edital da licitação , com valores de referência , vincula, ou não, a empresa vencedora do certame, no que diz respeito aos salários e demais vantagens pagas aos empregados por ela contratados. De início, ressalte-se que a juntada de planilhas com o orçamento de custos estimados é requisito de todo edital de licitação regida pela Lei nº 8.666/93, conforme previsão expressa do seu artigo 40, § 2º, II . Desse modo, tem-se que a planilha ora em discussão, com custos de “referência”, tem por objetivo tão somente apresentar o orçamento estimativo feito pela Administração – o qual servirá de base para as demais fases do certame, especialmente a de julgamento das propostas – , e não fixar preços mínimos a serem praticados pela empresa vencedora . Mesmo porque a fixação de preços mínimos – ou mesmo de variações a partir dos custos de referência – é expressamente proibida , nos termos do artigo 40, X, da Lei nº 8.666/93. Apesar disso, é possível que os valores ali fixados eventualmente venham a ser devidos pela empresa vencedora, caso a proposta por ela apresentada possua valores coincidentes com aqueles . Ora, se é verdade que o orçamento estimativo do edital não necessariamente vincula o licitante vencedor, o mesmo não se pode afirmar quanto às cláusulas contratuais por ele firmadas com a Administração Pública – dentre elas a econômico-financeira, que abrange detalhadamente todos os custos informados na proposta. No caso , o consórcio reclamado afirma em contrarrazões que: “a proposta apresentada pela Recorrente foi a vencedora, pois apresentou o menor preço , sendo certo que a Recorrente não recebe do Poder Público, os valores constantes no Edital, já que estes são apenas especificações do Edital” (destaquei). Por essa razão, para afastar a alegação da autora, era necessário que demonstrasse por quanto efetivamente se obrigou, perante a Administração Pública, a remunerar os empregados terceirizados , por se tratar de fato impeditivo ou modificativo do direito da reclamante, nos termos dos artigos 818, II, da CLT e 373, II, do CPC . Ocorre que a parte não juntou aos autos nenhum documento a comprovar esse ponto – a exemplo da cópia do contrato administrativo e de seus aditivos – , e se limitou a afirmar, na defesa, que a planilha de referência não a vinculava de forma alguma . Por esse fundamento, são devidas as diferenças postuladas. Recurso de revista conhecido e provido .
Processo: RR-10967-14.2014.5.01.0050