A suspensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) como forma de coagir um devedor a pagar suas dívidas só pode ser feita em “casos excepcionalíssimos”. Este é o entendimento do Tribunal de Justiça, reafirmado pelo desembargador Marcus Tulio Sartorato em decisão monocrática prolatada em 22 de fevereiro deste ano.
Uma mulher de Criciúma interpôs agravo de instrumento contra decisão de 1º grau que, em ação de execução de alimentos, indeferiu o pedido de suspensão da CNH do ex-marido. “Diante do insucesso das outras medidas faz-se necessária uma medida mais enérgica até a quitação do débito pendente”, ela argumentou.
O pedido foi feito com base no artigo 139, inciso IV, do Código de Processo Civil: “O juiz poderá determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária”.
Porém, para o desembargador Sartorato, em que pese a disposição do artigo 139, “não é possível deferir a suspensão da CNH porque tal pedido tem natureza excepcionalíssima e só vem sido admitido por esta corte em casos muito particulares, quando esgotadas as outras medidas”.
Recentemente, lembrou, o Superior Tribunal de Justiça concluiu que a medida de suspensão de CNH – ao contrário da suspensão de passaporte ou outras restrições mais gravosas – não ocasiona ofensa ao direito de ir e vir do paciente.
“(É) fato que a retenção deste documento tem potencial para causar embaraços consideráveis a qualquer pessoa e, a alguns determinados grupos, ainda de forma mais drástica, caso de profissionais que têm na condução de veículos a fonte de sustento”, anotou.
E esse foi outro ponto a pesar na decisão: o devedor em questão é motoboy e tira seu sustento dessa atividade. Sem a CNH, não teria como trabalhar e isso, obviamente, dificultaria a quitação do débito.
Com isso, o desembargador manteve a decisão do juiz Marlon Jesus Soares de Souza, da Vara da Família da comarca de Criciúma, e indeferiu o pedido de antecipação dos efeitos da tutela recursal .
O recurso ficou assim ementado:
PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. DECISÃO QUE INDEFERIU O PEDIDO DE SUSPENSÃO DA CARTEIRA NACIONAL DE HABILITAÇÃO (CNH) DO EXECUTADO. APLICAÇÃO DO ART. 139, IV, DO CPC. PEDIDO DE NATUREZA EXCEPCIONAL. ENTENDIMENTO DO STJ DE QUE A RESTRIÇÃO NÃO É CABÍVEL QUANDO A PROFISSÃO DO EXECUTADO EXIGE LOCOMOÇÃO POR VEÍCULO. DEVEDOR QUALIFICADO COMO MOTOBOY NO CASO EM APREÇO. INVIABILIDADE DA RESTRIÇÃO. MEDIDA QUE IRIA CONTRA A PRÓPRIA POSSIBILIDADE DE SATISFAÇÃO DO DÉBITO. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.
“A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que a suspensão da Carteira Nacional de Habilitação não configura ameaça ao direito de ir e vir do titular, sendo, assim, inadequada a utilização do habeas corpus, impedindo seu conhecimento. É fato que a retenção desse documento tem potencial para causar embaraços consideráveis a qualquer pessoa e, a alguns determinados grupos, ainda de forma mais drástica, caso de profissionais, que tem na condução de veículos, a fonte de sustento. É fato também que, se detectada esta condição particular, no entanto, a possibilidade de impugnação da decisão é certa […]” (RHC 97.876/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 05/06/2018, DJe 09/08/2018).
Agravo de Instrumento n. 4004848-55.2019.8.24.0000