Mantida a condenação da União e do Estado do Amazonas a fornecer e manter em estoque medicamento de alto custo na rede publica de saúde

Por unanimidade, a 6ª Turma do TRF 1ª Região negou provimento à apelação da União e do Estado do Amazonas contra a sentença, do Juízo da 2ª Vara Federal da Seção Judiciária do Amazonas, que julgou procedente o pedido da parte autora e determinou aos réus o imediato fornecimento do medicamento Novoseven 240KUI 4,8 mg na rede pública de saúde e a manutenção em estoque da quantidade mínima de dez caixas por mês.

Em sua apelação, o Estado do Amazonas alegou ser impossível o pedido, em face da vedação da interferência do Poder Judiciário nas ações executivas da Política Nacional de Medicamentos, sob pena de violação ao princípio da separação dos poderes; ser parte ilegítima para figurar no polo passivo da relação processual; ser hipótese de violação do princípio da isonomia e da universalidade de acesso à saúde; ser impossível a condenação do poder público ao custeio de fornecimento de medicamento específico e ser hipótese de incidência da cláusula da reserva do possível.

A União, por sua vez, asseverou ser parte ilegítima para figurar no polo passivo da relação processual; ser impossível o custeio de fornecimento de medicamento específico pela Administração; ser necessário observar os planos e as previsões orçamentárias e ser a determinação judicial ofensiva ao princípio da isonomia.

O relator, juiz federal convocado Roberto Carlos de Oliveira, ao analisar o caso, rejeitou os argumentos trazidos nos autos afastando de imediato as preliminares de ilegitimidade passiva suscitadas pelos apelantes.

Isso porque, segundo o magistrado, o Supremo Tribunal Federal (STF) já firmou entendimento no sentido que “o tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto de responsabilidade solidária dos entes federados”, de modo que “o polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente ou conjuntamente”.

Para concluir o voto, o juiz federal fez também referências a julgados de outros tribunais superiores, com orientações no sentido de que não podem os direitos sociais ficar condicionados à boa vontade do administrador, portanto, entendeu o magistrado que é improcedente a alegação de impossibilidade de interferência do Poder Judiciário nos demais poderes. Isso porque, “na esteira da orientação firmada no âmbito do Colendo Superior Tribunal de Justiça, não podem os direitos sociais ficar condicionados à boa vontade do Administrador, sendo de fundamental importância que o Poder Judiciário atue como órgão controlador da atividade administrativa, de modo que não há que se falar em violação ao princípio da separação dos poderes”.

O recurso ficou assim ementado:

CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO ORDINÁRIA. ILEGITIMIDADE PASSIVA. INEXISTÊNCIA. MEDICAMENTO. CONCESSÃO JUDICIAL. POSSIBILIDADE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. RESERVA DO POSSÍVEL. SEPARAÇÃO DOS PODERES. SENTENÇA MANTIDA.

I – “O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente.” (RE 855178 RG, Relator(a): Min. LUIZ FUX, julgado em 05/03/2015, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-050 DIVULG 13-03-2015 PUBLIC 16-03-2015).

II – Inadmissível condicionar a fruição de direito fundamental e inadiável à discussão acerca da parcela de responsabilidade de cada ente da Federação em arcar com os custos de medicamento/tratamento médico cujo fornecimento foi determinado por meio de decisão judicial, não podendo a divisão de atribuições ser arguida em desfavor do cidadão, questão que deve ser resolvida em âmbito administrativo ou por meio das vias judiciais próprias.

III – A concessão de medidas judiciais tendentes a assegurar a realização de tratamentos médicos e o fornecimento de medicamentos, nas hipóteses excepcionais em que comprovado o risco iminente à saúde e à vida do cidadão, não viola o princípio da isonomia, da legalidade, da indisponibilidade ou da universalidade. Não há que se falar, outrossim, em impossibilidade de condenação do Estado a tratamento específico, sendo certo que, comprovada a doença da qual a paciente é portadora e sua miserabilidade econômica, devido o fornecimento do medicamento pleiteado. IV – “Não se mostra razoável a invocação de desrespeito a limites orçamentários quando se verifica que a medicação vindicada é essencial para a garantia à vida de quem a requer, tornando-se secundárias as considerações de ordem orçamentária ou financeira.” (AGA 0065325-05.2010.4.01.0000/MG, Rel. Desembargador Federal Kássio Nunes Marques, Sexta Turma, e-DJF1 p.335 de 14/08/2014).

V – A cláusula da reserva do possível “(…). não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade”. Precedente do Excelso Supremo Tribunal Federal na APDF Nº 45, da qual foi relator o eminente Ministro Celso de Mello.

VI – Não podem os direitos sociais ficar condicionados à boa vontade do Administrador, sendo de fundamental importância que o Poder Judiciário atue como órgão controlador da atividade administrativa, de modo que não que se falar em violação ao princípio da separação dos poderes. Precedentes.

VII – Recursos de apelação interpostos pela União e pelo Estado do Amazonas, bem como remessa oficial aos quais nega provimento.

Nesse contexto, o Colegiado, acompanhado o voto do relator, negou provimento às apelações.

Processo: 0003553-15.2008.4.01.3200

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