Uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) afastou nulidade reconhecida pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) em um processo de demarcação de terras parcial, com origem na década de 70. Segundo os autores, a propriedade havia sido objeto de esbulho (apropriação ilegal) possessório praticado pelos réus.
Segundo o ministro relator do recurso, João Otávio de Noronha, o fato de nem todos os vizinhos terem sido citados na ação não invalida o processo, já que o objetivo inicial era demarcar a propriedade rural, com ênfase na retirada de um terceiro, que havia ocupado parte do terreno e construído casa.
Litisconsórcio
Noronha destacou que houve a correta formação do litisconsórcio (citação das partes interessadas na causa) para a solução da demanda. No caso, os terceiros poderiam integrar a demanda, mas isso era uma opção dos demandantes, e não uma obrigação processual como entendeu o TJMT.
Segundo o ministro, trata-se de ação demarcatória parcial em que foram citados os confinantes da área que se pretendia ver delimitada, para fins de repelir a invasão promovida pelos demandados. Dessa forma, não houve desrespeito ao litisconsórcio necessário, o que afasta a existência de nulidade absoluta, apreciável de ofício.
“Assim, o confinante que foi regularmente citado não tem legitimidade para arguir a nulidade por ausência de participação dos proprietários das áreas contíguas àquela objeto da demarcatória, em virtude da ausência de prejuízo que lhe teria sido causado e da não demonstração de qual benefício teria com o reconhecimento do alegado vício”, argumentou o ministro.
Limites
A decisão da Terceira Turma foi unânime. Com a medida, o processo retorna ao tribunal de origem para a análise de outros pontos da apelação. A demanda original é de 1979 e envolve proprietários de terras no interior de Mato Grosso.
Além de afastar a nulidade, os ministros decidiram também ajustar a sentença quanto aos seus efeitos. Noronha disse que a demanda inicial é clara, razão pela qual os efeitos da sentença devem ficar restritos às partes envolvidas.
“Verifica-se que se trata de ação demarcatória parcial em que só se pleiteou a demarcação da parte da área de propriedade dos autores que teria sido objeto de esbulho possessório pelos demandados especificados na inicial e que, só quanto a estes réus indicados na exordial, discutiu-se o domínio, razão pelo qual os efeitos da causa julgada devem ficar adstritos a eles”, concluiu o magistrado.
Para os ministros, a causa foi devidamente especificada para o julgamento do mérito, portanto não se configura como caso de nulidade ou retorno para citação de outras partes.
O recurso ficou assim ementado:
PROCESSUAL CIVIL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. CIVIL. AÇÃO DEMARCATÓRIA PARCIAL. CITAÇÃO DOS CONFINANTES DEMARCAÇÃO DE ÁREA PARA FINS DE REIVINDICAÇÃO DO BEM OBJETO DE ESBULHO. ILEGIMIDADE ATIVA DO CONFINANTE CITADO PARA ALEGAR NULIDADE DA SENTENÇA ANTE A AUSÊNCIA DE CITAÇÃO DE SUPOSTO LITISCONSORTE. EFEITOS DA COISA JULGADA. QUESTÃO DECIDIDA. PEDIDO E CAUSA DE PEDIR DA AÇÃO.
1. Afasta-se a alegada negativa de prestação jurisdicional quando o acórdão recorrido, integrado por julgado proferido em embargos de declaração, dirime, de forma expressa, congruente e motivada, as questões suscitadas nas razões recursais.
2. Nas demarcatórias parciais, há o litisconsórcio passivo necessário entre o demandante e os vizinhos lindeiros da área específica cuja demarcação é pretendida. Todavia, tratamento diverso se dá aos demais confinantes do imóvel de propriedade do autor da demarcatória cuja área não era objeto de demarcação, pois, quanto a estes, não há litisconsórcio passivo necessário, apenas facultativo.
3. Não se configura a hipótese de nulidade decorrente da não citação de litisconsorte necessário se o confinante que foi regularmente citado não tem legitimidade para arguir a nulidade por ausência de participação dos proprietários das áreas contíguas àquela objeto da demarcatória, em virtude da ausência de prejuízo que lhe teria sido causado e da não demonstração de qual benefício teria com o reconhecimento do alegado vício.
4. Se, da análise da causa de pedir e pedidos formulados na inicial (questões decididas), verifica-se que se intentou a demarcação de parte da área de propriedade dos autores que teria sido objeto de esbulho possessório pelos demandados especificados na inicial, somente quanto a esses réus indicados na exordial se discutiu o domínio; por essa razão, os efeitos da coisa julgada devem ficar adstritos a eles.
5. Recurso especial parcialmente provido.