Pedido de vista do ministro Joaquim Barbosa suspendeu o julgamento da Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 46, que questiona o monopólio de serviço postal exercido pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT). A ADPF foi proposta pela Associação Brasileira das Empresas de Distribuição (Abraed), que defende o direito das instituições privadas de atuarem no mercado. Votaram, nesta quarta-feira (15), o relator, ministro Marco Aurélio, pela procedência do pedido da associação e o ministro Eros Grau, pela manutenção do monopólio estatal.
Na ação, a entidade afirmou que o serviço postal tem natureza de atividade econômica, não podendo ser objeto de monopólio estatal e que restariam violados os preceitos fundamentais da livre iniciativa (art. 1º, IV da CF), da liberdade do exercício de qualquer trabalho (art. 5º, XIII da CF), da livre concorrência (art. 170, IV da CF) e do livre exercício de qualquer atividade econômica (art. 170, parágrafo único da CF).
O ministro Marco Aurélio entendeu que a Lei nº 6.538/78 (especialmente, os artigos 9º e 27), que instituiu o monopólio da atividade postal no Brasil, não foi recepcionada pela atual Constituição Federal. Em seu voto, ele ressaltou que a preservação do interesse público nem sempre é sinônimo de atuação estatal. “Ao reverso, o que a experiência vem demonstrando é que, em muitos casos, mais se atende ao interesse social quando o Estado se retira da prestação direta e passa a atuar de outra maneira, como ente capaz de regular, fiscalizar e impor sanções de acordo com os ditames do artigo 174 da CF e liberta a atividade econômica para seus verdadeiros titulares, a iniciativa privada”, explicou.
Marco Aurélio afirmou que as razões que determinaram o monopólio dos Correios há anos não mais existem diante das inovações tecnológicas e da tendência, firmada a partir da década de 80, de o Estado se retirar da atividade econômica. Ele acentuou que o que pode ser realizado de maneira satisfatória pelas empresas privadas não deve ser assumido pelo Estado.
O relator ainda sustentou que a prestação dos serviços em regime de concorrência entre as diversas empresas que disputam o mercado consumidor acaba atendendo melhor ao interesse público, pois estimula a busca constante por melhorias tecnológicas, a redução dos custos operacionais e a conseqüente queda dos preços oferecidos pelos serviços.
Quanto à previsão constitucional (artigo 21, inciso X) de que a União deve manter o serviço postal, o ministro Marco Aurélio disse que a expressão “manter” não significa monopólio, mas a garantia de que o Estado exercerá a atividade quando não houver interesse privado pela atividade em determinados pontos do território nacional.
Divergência
Ao divergir do voto do relator, o ministro Eros Grau julgou inteiramente improcedente a ADPF 46, por considerar que “o serviço postal é um serviço público por definição constitucional”. Eros alegou que a premissa sustentada pela Abraed é equivocada, pois “o serviço postal não consubstancia a atividade econômica em sentido estrito a ser explorada por empresa privada. Por isso que toda a argumentação em torno da livre iniciativa e da livre concorrência acaba caindo no vazio, perde o sentido”, afirmou o ministro ao proferir o seu voto.
O ministro lembrou que o artigo 42 da Lei 6538/78 define o crime de violação do privilégio postal da União. O ministro considera tecnicamente inadequado o termo “monopólio” atribuído à atividade postal. Em sua avaliação, o correto seria falar em “privilégio” e prossegue: “os nomes não alteram a substância da exclusividade e eu tenho sistematicamente afirmado em obra e em trabalho acadêmico de que se trata de uma exclusividade”.
Segundo o ministro Eros Grau, os regimes jurídicos sob os quais são prestados os serviços públicos importam no desenvolvimento de atividades sob privilégios. Esse virtual privilégio, na avaliação do ministro, é que torna atrativa a prestação do serviço público por parte do setor privado quando atua na condição de concessionário ou permissionário.
Ao justificar o seu voto divergente, o ministro Eros Grau salientou que “para que a empresa privada pudesse ser admitida à prestação do serviço postal – que é serviço público – seria necessário que a Constituição dissesse que o serviço postal é livre à iniciativa privada”.
O ministro usou como exemplo as áreas de saúde e educação que são serviços públicos, e podem ser prestados independentemente de concessão ou permissão, porque os artigos 199 e 209 da Constituição Federal excepcionam o artigo 175 para dizer que a prestação da saúde e da educação é livre à iniciativa privada.
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