Ainda que a assembleia geral ordinária declare a distribuição de dividendos relativa a período em que o ex-acionista detinha papéis da empresa, o direito ao recebimento é garantido apenas àqueles que integrem o quadro de acionistas no momento dessa declaração.
O entendimento unânime foi firmado pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao restabelecer sentença que havia julgado improcedente ação de cobrança proposta por ex-acionista contra a Antarctica Polar S.A. (posteriormente incorporada pela Ambev). Segundo a ex-acionista, em 2001, ela vendeu suas ações ordinárias sob a promessa de que, além do valor referente à alienação dos papéis, também receberia os dividendos relativos ao exercício daquele ano.
Para o juiz de primeira instância, a autora não tinha direito ao recebimento dos lucros porque não fazia mais parte do quadro de acionistas no momento da realização da assembleia ordinária que declarou a distribuição de dividendos, em 2002.
Data da declaração
Em segunda instância, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul reformou a sentença por entender que a autora era titular das ações ordinárias no período utilizado pela assembleia para apuração dos valores de dividendos. Para o tribunal gaúcho, o fato de a ex-acionista ter vendido suas ações não lhe retirou o direito ao recebimento dos valores.
O relator do recurso especial da Ambev, ministro Luis Felipe Salomão, destacou inicialmente que, segundo o artigo 205 da Lei das Sociedades Anônimas, a companhia deve pagar o dividendo das ações à pessoa que, na data do ato de declaração do dividendo, estiver inscrita como proprietária ou usufrutuária da ação.
Com base em outros dispositivos da mesma lei, o relator também ressaltou que a distribuição de dividendos é vedada antes da prévia demonstração dos lucros líquidos da empresa. Apenas após a apresentação das demonstrações financeiras, ao término do exercício social, é que deverá ser realizada assembleia geral para deliberação sobre a distribuição dos valores.
“Em vista das disposições legais, tão somente o fato de deter ações no período do exercício a que correspondem os dividendos não resulta que exsurja automático direito a eles, visto que, consoante pacífico entendimento doutrinário, assiste direito apenas àquele que, na data do ato de declaração do dividendo, estiver inscrito como proprietário ou usufrutuário da ação”, concluiu o ministro ao acolher o recurso especial da Ambev.
O recurso ficou assim ementado:
RECURSO ESPECIAL. SOCIEDADE ANÔNIMA. OMISSÃO OU OBSCURIDADE. INEXISTÊNCIA. ALIENAÇÃO DE AÇÕES. DIREITO AOS DIVIDENDOS. PROPRIETÁRIO OU USUFRUTUÁRIO DAS AÇÕES. MARCO TEMPORAL. DATA DO ATO DE DECLARAÇÃO. DANO PARA O EX-PROPRIETÁRIO. INEXISTÊNCIA.
1. Por um lado, o exercício social é o período de levantamento das contas e apuração do resultado da companhia, que, consoante dispõe o art. 175, caput, da Lei n. 6.404⁄1976, terá duração de 1 (um) ano e data do término fixada no estatuto da Companhia. Por outro lado, o art. 176, incisos, do mesmo Diploma legal, estabelece que o encerramento do exercício social impõe à companhia o dever de elaborar, com base na escrituração mercantil, as demonstrações financeiras⁄contábeis que elenca, por meio das quais é possível a apuração e a distribuição dos lucros.
2. Com efeito, ainda que a companhia, por disposição estatutária ou determinação legal, possa estar obrigada a elaborar demonstrações contábeis em períodos inferiores a 1 (um) ano, ou declare dividendos intermediários com base em balanços semestrais, a Lei de Sociedades Anônimas exige o levantamento de balanço para a distribuição de dividendos, vedando que se leve a efeito a distribuição sem a prévia demonstração de lucros realizados e líquidos, que a justifique.
3. O art. 205, caput, da Lei n. 6.404⁄1976 estabelece que a companhia pagará os dividendos ou juros sobre capital próprio de ações nominativas à pessoa que, na data do ato de declaração do dividendo, for proprietária ou usufrutuária da ação – independentemente, pois, do fato de outrem ter sido proprietário das ações no período do exercício a que correspondem os proventos.
4. Não há enriquecimento sem causa ou dano que pudesse ter decorrido da operação de compra e venda de ações, haja vista que, quando uma companhia distribui dividendos ou juros sobre o capital próprio, são retirados recursos do caixa da empresa e, pois, há inequívoca depreciação do valor intrínseco da ação.
5. Recurso especial provido.