Os ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deram provimento a um recurso para afastar condenação que impôs ao fiador a obrigação de arcar com os honorários advocatícios sucumbenciais em ação de cobrança, além dos valores pactuados na fiança.
Para o ministro relator, Marco Aurélio Bellizze, a fiança limitada decorre da lei e do contrato, e o fiador não pode ser obrigado a arcar com valor superior ao acordado. O magistrado defendeu que o fiador deve ser responsável até o limite da garantia por ele assumida, o que afasta sua responsabilização em relação aos acessórios da dívida principal e aos honorários advocatícios, que devem ser cobrados do devedor afiançado.
No caso analisado – ação de execução de aluguéis –, embora o fiador tenha realizado o depósito referente ao valor da fiança a que se obrigou, o órgão julgador entendeu que ainda remanesceria o crédito quanto aos ônus sucumbenciais, notadamente os honorários advocatícios.
Para o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), os honorários têm como causa a instauração e a perda da demanda, e não a fiança, o que justificaria a responsabilidade.
No voto, acompanhado pelos demais ministros, Marco Aurélio Bellizze explicou que o instituto da fiança limitada, pouco utilizado atualmente, deve ser interpretado de forma restrita, de acordo com o artigo 822 do Código Civil.
“Assim, se decorre do texto legal que a fiança limitada não compreende, em toda a extensão, as obrigações do devedor, inclusive quanto aos acessórios e despesas judiciais, não há fundamento legal para excepcionar os honorários sucumbenciais fixados na ação principal”, argumentou o magistrado.
Sem exceções
O ministro lembrou que a interpretação restrita da responsabilidade do fiador decorre do fato de que a obrigação de assumir responsabilidades de outrem é uma manifestação certa e positiva de vontade.
Citando a jurista Maria Helena Diniz, o relator disse que, nos casos da fiança limitada, o fiador circunscreve sua responsabilidade, sendo responsável até uma certa quantia ou certa data. Portanto, não seria justo impor uma condenação acima do limite pactuado, já que a fiança limitada não admite exceções, seja de taxas, despesas judiciais ou honorários advocatícios, como no caso analisado.
“O fiador de uma obrigação certa e determinada não responde por nenhuma outra obrigação. No caso, o recorrente assumiu como garante do contrato de locação, o que, a meu sentir, não presume a sua responsabilidade em relação aos ônus sucumbenciais, que foram impostos ao afiançado como consequência da cobrança daquele contrato”, resumiu o ministro.
O recurso ficou assim ementado:
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA DE ALUGUÉIS. LOCAÇÃO DE IMÓVEL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. FIANÇA LIMITADA. ARTS. 819, 822 E 823 DO CC. EXTENSÃO DA GARANTIA AOS HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE INTERPRETAÇÃO RESTRITA. RECURSO PROVIDO.1. Consoante dispõe o art. 822 do Código Civil, “não sendo limitada, a fiança compreenderá todos os acessórios da dívida principal, inclusive as despesas judiciais, desde a citação do fiador”. Assim, ao assumir a condição de garante da obrigação, o fiador tem a opção de ficar vinculado a limites previamente definidos (CC, art. 823), os quais podem ser parciais, ou até a integralidade da dívida, podendo ainda estabelecer prazo e condições para sua validade e eficácia.2. Por se tratar de contrato benéfico, as disposições relativas à fiança devem ser interpretadas de forma restritiva (CC, art. 819), ou seja, da maneira mais favorável ao fiador, razão pela qual, no caso, em que a dívida é oriunda de contrato de locação, tendo o recorrente outorgado fiança limitada até R$ 30.000,00 (trinta mil reais), forçoso reconhecer que a sua responsabilidade não pode ultrapassar esse valor.3. Tratando-se, portanto, de fiança limitada, a interpretação mais consentânea com o sentido teleológico da norma é a que exime o fiador do pagamento das despesas judiciais e, também, dos honorários advocatícios, uma vez que a responsabilidade do garante, que, em regra, é acessória e subsidiária, não pode estender-se senão à concorrência dos precisos limites nela indicados.4. Embora o art. 20 do CPC⁄1973 disponha que “a sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advocatícios”, dando margem ao entendimento de que a verba honorária não estaria inserida no conceito de despesas judiciais, na espécie, a controvérsia deve ser solucionada sob o enfoque do art. 822 do CC, que trata, especificamente, dos efeitos da fiança limitada, o qual deve prevalecer, como regra de interpretação, sob aquele dispositivo processual que regula, apenas de maneira geral, a fixação dos honorários, ante a observância, inclusive, do princípio da especialidade.5. Recurso especial provido.
Leia o acórdão.