A Central de Processamento de Litígios Associados à Catástrofe Climática RS – 2024 da Justiça Federal do RS (JFRS) determinou o pagamento da prestação adicional do Benefício de Prestação Continuada (BPC) aos beneficiários residentes nos municípios reconhecidamente afetados pelo desastre climático no Rio Grande do Sul. A sentença, publicada no dia 13/11, é da juíza Rafaela Santos Martins da Rosa.
A Rede Observatório BPC ingressou com a ação, em junho, contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e a União buscando o pagamento da parcela de antecipação e a manutenção dos pagamentos dos benefícios assistenciais. Afirmou que a medida é crucial para preservar a vida e dignidade de mais de 152 mil titulares gaúchos com deficiência do BPC, já que a situação de vulnerabilidade deles é agravada em situações de calamidade.
Em sua defesa, a União argumentou que a constituição formal da associação autora é inferior há um ano, e ela não possui sede e foro no Rio Grande do Sul. Salientou que ela sequer trouxe a relação de associados e ata assemblear que consigne a autorização para a propositura da presente ação.
Já o INSS afirmou que o pagamento de modo unificado e prévio do BPC está sendo cumprido. Em relação à antecipação da prestação adicional, pontuou que ainda não teria se concretizado pela ausência de disponibilidade orçamentária.
O Ministério Público Federal (MPF) também se manifestou no processo. Defendeu a relativização quanto à exigência do lapso temporal de um ano de constituição da parte autora em ação coletiva que envolva interesse social evidenciado pela dimensão do dano e pela relevância do bem jurídico a ser protegido. Quanto à pertinência temática, afirmou que o Estatuto Social da autora prevê justamente a defesa em juízo de pessoas beneficiárias do BPC e que, de qualquer modo, caso se considerasse qualquer impedimento ao prosseguimento da Associação na condição de autora da demanda, dada a relevância do tema objeto dos autos, o MPF assumiria a ação na condição de autor.
A juíza Rafaela Santos Martins da Rosa verificou que o Estatuto Social da autora exige expressa autorização de seus associados para o ajuizamento de ações judiciais ou mesmo de providências extrajudiciais, e que não foi juntada no processo nenhuma autorização nesse sentido. Entretanto, o MPF manifestou-se que assumiria a titularidade da ação caso a associação não fosse considerada legítima, o que foi o caso.
Julgamento
A magistrada pontuou que a Previdência e a Assistência Social, juntamente com a saúde, integram o Sistema da Seguridade. O caráter alimentar das suas prestações visa assegurar um mínimo existencial e resguardar a dignidade da pessoa”. Ela pontuou que o benefício de prestação continuada destina-se aos idosos (pessoas acima dos 65 anos) e às pessoas com deficiências (física ou mentais) que não tenham condições de se manterem por conta própria.
Rosa destacou que, em circunstâncias de normalidade, o benefício já é destinado a uma das parcelas mais vulneráveis da população brasileira. O contexto que motiva a presente ação é o maior desastre climático da história do Rio Grande do Sul.
“No campo do Direito, este reconhecimento é formalizado pelos atos que reconhecem o estado de calamidade pública ou de emergência, e possui a importância fundamental de propiciar que medidas necessárias sejam efetivadas, para se lidar de modo minimamente adequado com a excepcionalidade fática que decorre da sobrevinda de um desastre de tal magnitude”, afirmou.
A magistrada ressaltou que a Política Nacional de Proteção e Defesa Civil reconhece o ciclo de vida dos desastres e a necessidade de uma atuação sistêmica envolvendo todas as fases. Segundo ela, a lei brasileira expõe exemplos concretos de medidas de compensação pós-desastre, entre elas encontram-se medidas governamentais e/ou privadas de cunho assistencial. Ela citou que, no caso do desastre ocorrido no estado gaúcho, a assistência está se fazendo presente, por exemplo, no Programa MEI RS Calamidade, do Governo do RS, e no auxílio Reconstrução, fornecido pelo Governo Federal.
“Nesta demanda, observa-se que partiu da própria União e do INSS a iniciativa, deveras louvável, de ativar duas medidas de compensação assistencial pós-desastre concretas, com foco específico em alcançar uma das parcelas mais vulneráveis da população atingida pelo desastre no Rio Grande do Sul: os beneficiários do BPC (idosos e deficientes) residentes em municípios afetados pelo desastre”.
A juíza ressaltou que a parcela da população a ser beneficiada com as medidas buscadas no presente processo “muito provavelmente sofreu de forma desproporcional as consequências do evento desastroso. As dificuldades de comunicação, as possíveis limitações de autonomia para locomoção, assim como limitações de recursos para recomporem perdas, entre outros, de utensílios essenciais, assim como medicamentos e outros bens, são fatores que demandam consideração pelos agentes públicos na tomada de decisão sobre medidas compensatórias apropriadas”.
Assim, ela afirmou ser imprescindível a iniciativa da União e do INSS específica para compensação ao desastre voltada aos beneficiários do BPC: antecipar o pagamento mensal do benefício e prover uma renda mensal adicional, a ser futuramente descontadas em parcelas mensais dos beneficiários. Ela pontuou que a primeira está ocorrendo de modo regular. Entretanto, o mesmo não acontece com a segunda medida.
Para Rosa, os argumentos apresentados pela União e INSS para justificar o atraso de quase sete meses em implementar o pagamento da renda mensal adicional é inadmissível, pois os municípios afetados e com decretos de calamidade vigentes são conhecidos, assim como os beneficiários do BPC que estão recebendo de modo unificado. “A estimativa do valor a ser liberado em razão do pagamento da renda mensal adicional é de fácil levantamento, e já poderia ter gerado a abertura do crédito extraordinário há muito tempo”.
A magistrada julgou parcialmente procedente a ação determinando as rés o cumprimento da antecipação de uma prestação adicional do BPC aos beneficiários residentes em municípios reconhecidamente afetados pelo desastre no Rio Grande do Sul. O pagamento deve ocorrer no mês de dezembro de 2024 sob pena de multa no valor de R$ 50 mil e multa diária de R$ 5 mil. Cabe recurso da decisão ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.