O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) decidiu reformar a sentença que declarou a nulidade do Processo Administrativo Disciplinar (PAD) e da demissão imposta a um agente administrativo da Polícia Federal (PF) que quebrou o sigilo funcional. Com a decisão, ele não poderá mais ser restituído ao cargo, ao contrário do que havia sido determinado em primeira instância.
No julgamento da ação penal, o agente administrativo da PF foi condenado por ter acessado informações geradas em um dos sistemas da Polícia para obter informações sobre o ex-namorado de uma mulher com quem manteve relações, supostamente com o intuito de denegrir a imagem do antigo parceiro dela.
Em primeiro grau, o Juízo Federal havia acolhido os pedidos de nulidade do PAD e da demissão, feitos pelo agente da PF por entender que não havia provas robustas de que o acusado efetivamente tivesse revelado conteúdo confidencial de sistemas de uso restrito do Departamento de Polícia Federal, e por entender, também, que a Administração teria se valido de presunções incabíveis, se equivocando ao aplicar a pena máxima ao servidor (demissão).
Mas a 2ª Turma do TRF1, ao acompanhar o voto do relator, desembargador federal Rafael Paulo Soares Pinto, observou que não foi verificada qualquer ilegalidade na sanção disciplinar imposta (demissão), seja pela regularidade do processo administrativo, seja pela tipicidade das condutas praticadas. “O PAD atacado tramitou regularmente em absoluta conformidade com o Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União. A comissão processante deu ciência ao denunciado das acusações a ele atribuídas que, por sua vez, constituiu advogado e acompanhou todas as fases do processo em questão e, inclusive, apresentou defesa e teve a oportunidade de contraditar todas as provas produzidas nos autos”, destacou o relator no voto.
O magistrado também sustentou que o agente havia sido condenado pelo juízo criminal pelos mesmos fatos apurados no processo administrativo disciplinar, inclusive com trânsito em julgado. “Está o juízo cível vinculado às conclusões acerca da autoria e da materialidade do crime em questão sob pena de violação à coisa julgada formada no âmbito criminal”, concluiu.
O recurso ficou assim ementado:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. SERVIDOR PÚBLICO. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO DEVIDO PROCESSO LEGAL ADMINISTRATIVO. REVELAÇÃO DE SEGREDO APROPRIADO EM RAZÃO DO CARGO. PENALIDADE DE DEMISSÃO. CONDENAÇÃO CRIMINAL EM RAZÃO DOS MESMOS FATOS. RECONHECIMENTO DA AUTORIA E MATERIALIDADE. VINCULAÇÃO DO JUÍZO CÍVEÇ. INTELIGÊNCIA DO ART. 126 DA LEI Nº. 8.112/90 C/C ART. 935 DO CÓDIGO CIVIL. APELAÇÃO DA PARTE RÉ PROVIDA.
1. Foi instaurado em desfavor do apelado processo administrativo disciplinar que culminou na imposição da penalidade de demissão por ter se valido do cargo para lograr proveito pessoal ou de outrem, em detrimento da dignidade da função pública, por ter incorrido em improbidade administrativa e por ter revelado informações confidenciais, extraídas de sistema de uso restrito do Departamento de Polícia Federal, das quais se apropriou em razão do cargo, em conformidade com os arts. 117, IX e 132, IV e lX, ambos da nº. Lei 8.112/90.
2. Entretanto, não se verifica qualquer ilegalidade da sanção disciplinar imposta ao apelado, seja pela regularidade do processo administrativo disciplinar atacado, ou mesmo pela tipicidade das condutas praticadas pelo apelado, puníveis com demissão.
3. Não restou comprovada a existência de qualquer mácula ao devido processo legal administrativo, bem como aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, uma vez que o PAD atacado tramitou regularmente em absoluta conformidade com Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União. A comissão processante deu ciência ao acusado das acusações a ele atribuídas, que, por sua vez, constituiu advogado e acompanhou todas as fases do processo em questão, e, inclusive, apresentou defesa e teve a oportunidade de contraditar todas as provas produzidas nos autos.
4. Improspera o argumento de que a comissão processante se baseou em prova anulada de oficio pela Administração para a indiciação do acusado, uma vez que, por ocasião da anulação parcial do PAD em questão, a Administração, acatando sugestão da Corregedoria-Geral, expressamente convalidou as provas até então produzidas.
5. Por outro lado, por influxo do princípio pas de nulité sans grief, ante a ausência de demonstração de qualquer prejuízo ao acusado, decorrente do excesso de prazo para a conclusão do processo administrativo disciplinar, não há que se falar em nulidade do PAD atacado, muito menos da penalidade de demissão imposta.
6. Quanto ao mérito, o art. 125 da lei nº. 8.112/90, de fato, consagra a independência entre as instâncias cível, penal e administrativa, estando afastada a responsabilidade administrativa do servidor nos casos de absolvição criminal que negue a existência do fato ou de sua autoria, conforme art. 126 do referido estatuto. A contrario sensu, conclui-se que as instâncias cível e administrativa estão vinculadas à condenação criminal que reconheça a existência do fato ou sua autoria. Não é outra a determinação do art. 935 do Código Civil. Precedentes.
7. No caso, em relação aos fatos objeto do PAD em questão, por sentença penal transitada em julgado, o apelado foi condenado pela prática do crime de violação de sigilo funcional, capitulado no art. 325 do Código Penal, consistente em “revelar fato de que tem ciência em razão do cargo e que deva permanecer em segredo, ou facilitar-lhe a revelação”.
8. Assim, tendo sido o apelado condenado pelo Juízo criminal, pela prática dos mesmos fatos apurados no processo administrativo disciplinar, com trânsito em julgado, está o Juízo cível vinculado às conclusões acerca da autoria e materialidade do crime em questão, sob pena de violação à coisa julgada formada no âmbito criminal, ex vi do art. 935 do Código Civil, conduta que se subsume, igualmente, ao disposto no art. 132, lX da nº. Lei 8.112/90, suficiente, por si só, à imposição da penalidade de demissão.
9. Apelação provida para, reformando a sentença, julgar improcedentes os pedidos formulados, com a condenação da parte apelada ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios sucumbenciais, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, ex vi do art. 20, §§ 3º e 4º do CPC/1973 e art. 85, § 3º, I e § 4º, III do NCPC, suspensa a cobrança da referida parcela na forma do revogado art. 12 da lei nº. 1.060/50 e do art. 98, § 3º do NCPC, por ser a parte beneficiária da justiça gratuita. Sem condenação ao pagamento das custas processuais, ex vi do art. 4º, II da lei nº. 9.289/96.
Processo: 0020410-22.2016.4.01.3600