Para a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), na hipótese de contrato verbal sem licitação, o poder público tem a obrigação de indenizar a prestação de serviços, ainda que eles tenham sido subcontratados e realizados por terceiros, desde que haja provas da subcontratação e de que os serviços terceirizados tenham revertido em benefício da administração pública.
O entendimento foi estabelecido pelo colegiado ao reformar acórdão que considerou descabido o município de Bento Gonçalves (RS) pagar por serviços de terraplanagem subcontratados sem autorização, sob o fundamento de violação ao artigo 72 da Lei 8.666/1993.
O caso teve origem em ação de cobrança ajuizada por uma empresa de terraplanagem contra o município gaúcho, para que o ente público a indenizasse pela prestação de serviços contratados verbalmente. Em contestação, o município alegou que não houve a comprovação da contratação e que, mesmo se fosse reconhecido o acordo, seria vedada a subcontratação dos serviços nos moldes realizados.
Em primeiro grau, o município foi condenado a indenizar a empresa pelos serviços efetivamente prestados e que não foram objeto de subcontratação. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) apenas ajustou os índices de correção monetária e juros de mora.
Segundo a corte estadual, a subcontratação dos serviços acordada verbalmente com a empresa só poderia ocorrer com autorização expressa da administração, o que não foi comprovado no caso.
Contrato nulo não afasta dever de pagamento por serviços efetivamente prestados
O ministro Herman Benjamin, relator do recurso da empresa de terraplanagem, apontou que a jurisprudência do STJ está orientada no sentido de que, mesmo sendo nulo o contrato firmado sem licitação prévia, é devido o pagamento pelos serviços efetivamente prestados, nos termos do artigo 59 da Lei 8.666/1993, sob pena de enriquecimento ilícito da administração pública.
“O STJ reconhece, ademais, que, ainda que ausente a boa-fé do contratado e que tenha ele concorrido para a nulidade, é devida a indenização pelo custo básico do serviço, sem qualquer margem de lucro”, completou o ministro.
De acordo com Herman Benjamin, o fato de não haver autorização da administração para a subcontratação não é suficiente para afastar o dever de indenização, como no caso analisado, tendo em vista que a própria contratação da empresa foi irregular, pois feita sem licitação e mediante contrato verbal.
“Assim, desde que provadas a existência de subcontratação e a efetiva prestação de serviços, ainda que por terceiros, e que tais serviços se reverteram em benefício da administração, será devida a indenização dos respectivos valores”, concluiu o ministro ao dar parcial provimento ao recurso da empresa.
O recurso ficou assim ementado:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. CONTRATO VERBAL. SUBCONTRATAÇÃO SEM AUTORIZAÇÃO. RECURSO ESPECIAL DE TODESCATO TERRAPLANAGEM LTDA. OBRIGAÇÃO DE O ENTE PÚBLICO EFETUAR O PAGAMENTO PELOS SERVIÇOS EFETIVAMENTE PRESTADOS. VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL DO MUNICÍPIO DE BENTO GONÇALVES. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DE FUNDAMENTO AUTÔNOMO E DEFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. SÚMULAS 283⁄SF E 284⁄STF.1. Trata-se, na origem, de ação de cobrança ajuizada contra o Município de Bento Gonçalves visando condenar o réu a indenizá-la pela prestação de serviços, contratados verbalmente, no período de 24.3.2012 até 8.9.2012, de retroescavadeira, pá carregadeira, caminhão toco e prancha para transporte de equipamentos. Aduziu que o valor total dos serviços é de R$ 102.570,20, mas que pende de pagamento a quantia de R$ 85.068,70 válidos para fevereiro de 2017.2. Em primeiro grau o pedido foi julgado parcialmente procedente para condenar o réu a indenizar os serviços prestados no período apontado que não foram objeto de subcontratação, devendo o valor ser auferido em liquidação.3. A Apelação da parte autora não foi provida, e a do réu foi provida na parte relativa aos índices de correção monetária e juros de mora.4. O aresto recorrido entendeu devida a indenização pelos serviços executados, a despeito da irregularidade da contratação, por não se admitir o enriquecimento ilícito da Administração. Todavia, entendeu descaber pagamento dos serviços prestados ao município que foram objeto de subcontratação, sob o fundamento de que em desacordo com o art. 72 da Lei 8.666⁄93.5. A jurisprudência do STJ é de que, mesmo que seja nulo o contrato realizado com a Administração Pública, por ausência de prévia licitação, é devido o pagamento pelos serviços prestados, desde que comprovados, nos termos do art. 59, parágrafo único, da Lei 8.666⁄1993, sob pena de enriquecimento ilícito da Administração.6. O STJ reconhece que, ainda que ausente a boa fé do contratado e que tenha ele concorrido para nulidade, é devida a indenização pelo custo básico do serviço, sem qualquer margem de lucro.7. A inexistência de autorização da Administração para subcontratação é insuficiente para afastar o dever de indenização, no caso dos autos, porque a própria contratação foi irregular, haja vista que não houve licitação e o contrato foi verbal. Assim, desde que provada a existência de subcontratação e a efetiva prestação de serviços, ainda que por terceiros, e que tais serviços se reverteram em benefício da Administração, será devida a indenização dos respectivos valores. Na mesma linha: REsp n. 468.189⁄SP, Rel. Min. José Delgado, Primeira Turma, julgado em 18⁄3⁄2003, DJ de 12⁄5⁄2003, p. 221.8. Não há como conhecer do Recurso Especial do Município de Bento Gonçalves. O recorrente não infirma o argumento de que, ainda que haja irregularidade na contratação dos serviços, é devida a indenização dos efetivamente prestados sob pena de indevido enriquecimento sem causa do Município. O ente federativo nada discorreu acerca da tese de inviabilidade de locupletamento ilícito. Aplicam-se, por analogia, as Súmulas 283⁄STF e 284⁄STF, ante a ausência de impugnação de fundamento autônomo.9. Agravo conhecido para não conhecer do Recurso Especial do Município de Bento Golçaves. Recurso Especial de Todescato Terraplanagem Ltda. parcialmente provido para assegurar o direito de ser indenizada pelos serviços subcontratados pelo custo básico deles, desde que provada a existência de subcontratação, bem como a efetiva prestação de serviços, mesmo que por terceiros, e ainda que tais serviços se revertam em benefício da Administração.
Leia o acórdão no REsp 2.045.450.