Levou-se em conta o princípio da dignidade da pessoa humana em favor do executado.
A Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho negou o recurso de um pedreiro de São Paulo (SP) contra decisão que rejeitou seu pedido de penhora dos proventos de aposentadoria de um ex-sócio da Juriti Empreiteira de Obras S/C Ltda. O pedreiro argumentava ser ele, e não o executado, a parte hipossuficiente da relação capital x trabalho, mas o colegiado entendeu que o caso apresenta particularidades, em razão do fato de o aposentado ter 75 anos e receber salário mínimo.
Previdência
Após infrutíferas diligências para localizar bens passíveis de penhora da empresa, o juiz da 33ª Vara do Trabalho de São Paulo determinou a penhora de 50% dos ganhos líquidos do aposentado sobre o valor que recebia da Previdência Social.
Ao contestar a medida, por meio de mandado de segurança impetrado no Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP), o aposentado disse que, além da idade avançada (73 anos, na época), recebia parca aposentadoria, suficiente apenas para mantê-lo minimamente. O TRT concedeu a segurança e suspendeu a penhora.
Hipossuficiente
No recurso ordinário, o pedreiro sustentou que ele esperava a satisfação de seu crédito desde 2006 e que a demora comprometia a sua sobrevivência e da sua família. Segundo ele, é plenamente possível a penhora parcial de salário ou benefício previdenciário para satisfação de verba de caráter alimentar.
Particularidades
O relator, ministro Evandro Valadão, lembrou que o TST passou a considerar possível a determinação de penhora de vencimentos realizados a partir da vigência do novo Código de Processo Civil (CPC) para satisfação de débitos de natureza trabalhista, desde que limitada a 50% do montante recebido. Contudo, na visão do relator, o caso do aposentado apresentava particularidades em relação aos demais casos em que se aplicou esse entendimento.
Dignidade da pessoa humana
Em razão da idade do executado, hoje com 75 anos, e o valor de um salário mínimo de aposentadoria, o ministro entendeu necessário ponderar entre o direito do empregado de ver seu crédito satisfeito e a própria subsistência do executado, que, no caso, teria de sobreviver com metade de um salário mínimo até a satisfação total do débito. “Conclui-se que este se sobressai em detrimento daquele, com base na dignidade da pessoa humana”, ressaltou.
Além do fato de, em razão da idade, o executado está impossibilitado de retornar ao mercado de trabalho para complementar a renda e de o valor ser rendimento de aposentadoria, o relator observou que a situação se agrava ao quando se constata que o montante é considerado o mínimo, “dadas as circunstâncias, que uma pessoa possa receber para atender suas necessidades vitais básicas, o que, pela realidade do país, sabe-se que ainda está deveras aquém do ideal”.
O recurso ficou assim ementado:
RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DITO COATOR PRATICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.105/15.
- O art. 7º, Inciso IV, da CRFB prevê dentre os direitos e garantias fundamentais um salário mínimo, “capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo“, erigindo-o como instrumento de preservação da dignidade da pessoa humana.
- No caso concreto, durante a fase de execução da ação subjacente, ao verificar que o executado subsidiário recebia proventos de aposentadoria, o magistrado da 33ª Vara do Trabalho de São Paulo determinou a penhora de 50% de seus ganhos líquidos, com base nos arts. 833, § 2º, e 529 do Código de Processo Civil de 2015.
III. A fim de cassar os efeitos dessa decisão, o executado impetrou mandado de segurança, alegando a impenhorabilidade dos proventos de aposentadoria.
- O Tribunal Regional a quo, ao observar que o executado percebia o valor de apenas um salário mínimo de proventos, concedeu-lhe a segurança.
V. Diante disso, o exequente, litisconsorte passivo, interpôs recurso ordinário, sustentando ser “plenamente possível a penhora parcial de salário ou benefício previdenciário para satisfação de verba de caráter alimentar“. Requereu a manutenção da decisão atacada.- Contudo, não obstante a alteração na jurisprudência dessa Corte Superior, que passou a considerar possível a determinação de penhora de vencimentos realizados na vigência do CPC de 2015 para satisfação de débitos de natureza trabalhista, desde que limitada a 50% do montante recebível, observou-se que o caso dos autos possui verdadeiras particularidades.
VII. Da leitura dos documentos colacionados com a inicial, ficou comprovado que o executado, hoje com 75 anos de idade, percebe proventos de aposentadoria no valor de um salário mínimo.
VIII. Destarte, realizando-se uma ponderação entre o direito do exequente de ver seu crédito satisfeito e a própria subsistência do executado, o qual seria condenado a sobreviver com metade de um salário mínimo até a satisfação total do débito, concluiu-se que este se sobressai em detrimento daquele, com base na dignidade da pessoa humana, fundamento da república (art. 1º, III, da Constituição da República).
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Recurso ordinário de que se conhece e a que se nega provimento.
A decisão foi unânime.
Processo: RO-1002653-49.2018.5.02.0000