A 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) manteve a condenação de um ex-presidente da Associação das Sociedades Indígenas de Jenipapo dos Vieiras/MA. De acordo com os autos, apesar de notificado, o gestor deixou de prestar contas dos recursos públicos federais repassados pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa) para a execução de ações de atenção à saúde indígena.
O ex-dirigente foi condenado à suspensão dos direitos políticos pelo prazo de três anos e ao pagamento de multa civil equivalente a 10 vezes o valor da última remuneração, além de a proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais. A sentença foi confirmada pelos desembargadores da Turma que, no entanto, afastaram a condenação no que se refere ao pagamento de honorários advocatícios.
Em seu recurso ao TRF1, o requerido alegou a inexistência de ato ímprobo, informando que seu ato se tratou de mero atraso na entrega da prestação de contas, bem como na ausência de dolo.
Ao analisar o processo, o relator, juiz federal convocado pelo TRF1 Marllon Sousa, afirmou que para configurar improbidade administrativa faz-se necessário estar evidenciado “o elemento subjetivo doloso na conduta praticada pelo agente público, consubstanciada na livre e espontânea vontade de praticar atos contrários aos deveres de honestidade, imparcialidade e de legalidade” que se encontram apontados na lei que rege a matéria.
Réu tinha ciência – Segundo o magistrado, a má-fé e a falta de probidade no trato da coisa pública revelam o comportamento doloso do réu, “vez que agiu de forma ilícita e ciente da antijuridicidade de seu comportamento, ou seja, consciente de que estava transgredindo regras e princípios constitucionais e legais” ao se omitir de prestar contas de recursos públicos recebidos sem observar os princípios que regem a pública administração.
O juiz convocado ainda ressaltou que não tendo o apelante demonstrado a aplicação dos recursos e nem apresentado a prestação de contas, embora ciente de que era obrigado a fazê-lo, ficou demonstrada a omissão dolosa e deliberada de prestar contas com o objetivo de ocultar irregularidades na gestão da verba pública federal.
Desse modo, concluiu o relator, comprovada a materialidade e a autoria, bem como o dolo na atuação do representante da Associação de Saúde das Sociedades Indígenas de Jenipapo, deve ser mantida a sentença que considerou configurada a hipótese do art. 11, VI, da Lei 8.429/92.
O recurso ficou assim ementado:
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. RESPONSÁVEL POR ASSOCIAÇÃO PRIVADA. FUNASA. PRESTAÇÃO DE CONTAS. ART.11, VI, DA LEI 8.429/92. MATERIALIDADE E AUTORIA. ELEMENTO SUBJETIVO. DEMONSTRADOS. SANÇÕES AJUSTADAS. CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. NÃO CABIMENTO. APELAÇÃO PROVIDA EM PARTE. 1. Consideram-se atos de improbidade administrativa as condutas dolosas tipificadas nos artigos 9º, 10 e 11 da Lei n. 8429/1992, configurando-se o elemento subjetivo na vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos citados artigos, não bastando a voluntariedade do agente, é o que dispõe o §§1º e 2º do art. 1º da Lei nº 8.429/1992, após a edição da Lei 14.230 de 25 de outubro de 2021. 2. O MPF atribuiu ao acusado a prática de ato de improbidade previsto no art.11, VI, da Lei 8.429/92, por ausência da prestação de contas de verba pública recebida da FUNASA, entre os anos de 2004 e 2005. 3. Ato ímprobo relativo à ausência de prestação de contas comprovado pelo conjunto probatório existente nos autos. É induvidoso que o requerido, embora obrigado a prestar contas, deixou deliberadamente de fazê-lo, a fim de ocultar irregularidades na aplicação de verba pública. 4. Elemento subjetivo necessário à configuração dos atos de improbidade administrativa, devidamente identificado. O deliberado descaso com a coisa pública e descumprimento das regras da Lei 8.429/92 demonstrou a violação aos princípios da administração pública. A má-fé e o desprezo com a coisa pública revelam o comportamento doloso do requerido, que agiu de forma ilícita e ciente da antijuridicidade de seu comportamento. 5. Sanções estabelecidas ajustadas aos novos parâmetros do art. 12 da Lei de Improbidade Administrativa e em observância aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. 6. Condenação da parte requerida ao pagamento de honorários advocatícios afastada. A Corte Especial do STJ, em observância ao entendimento firmado no âmbito dos órgãos fracionários deste Tribunal, consolidou o entendimento no sentido de que, em razão da simetria, descabe a condenação em honorários advocatícios da parte requerida em ação civil pública, quando inexistente má-fé, de igual sorte como ocorre com a parte autora, por força da aplicação do art. 18 da Lei n. 7.347/1985 (EAREsp 962.250/SP, Rel. Ministro OG Fernandes, Corte Especial, DJe de 21/08/2018) (STJ. AgInt no REsp 1.736.894/ES, Segunda Turma, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, DJe de 10/09/2018). 7. Apelação parcialmente provida para adequar a sanção imposta e afastar a condenação em honorários advocatícios.
O Colegiado, acompanhando o voto do relator, deu parcial provimento à apelação do requerido para adequar a sanção a ele imposta e afastar a condenação em honorários advocatícios.
Processo: 0095905-97.2015.4.01.3700