Uma empresa do ramo de transportes com sede em Mato Grosso recorreu ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) pedindo que a Agência Nacional dos Transportes Terrestres (ANTT) analise e decida, no prazo de trinta dias, um requerimento administrativo. No caso, o pedido se refere à autorização para operar na linha Goiânia/GO-Vila Rica/MT.
Segundo a empresa, cabe à diretoria da ANTT deliberar sobre o pedido de concessão da licença operacional. Como isso não teria ocorrido, a instituição pediu no TRF1 que a Agência se abstenha de paralisar os serviços da impetrante no sentido de não multar e nem apreender os veículos sob a alegação de falta de autorização para operar.
Ao examinar a apelação, a relatora, desembargadora federal Kátia Balbino, afirmou que, no caso em questão, o impasse afeta a exploração de serviços de transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros, cujo entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) é o de que o Poder Judiciário não pode, a pretexto de suprir a omissão do Executivo, autorizar funcionamento e manutenção de serviços de transportes sob pena de desorganizar o modelo político da divisão de tarefas pelos Poderes.
De acordo com a magistrada, a legislação interestadual de passageiros permite, independentemente de licitação, que a Administração proceda à autorização dentro dos conceitos e requisitos legais, para a prestação do serviço regular de transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros, em consonância com o que estabelece o art. 21 da Constituição Federal.
A Resolução ANTT 4770/2015, publicada para regulamentar a Lei nº 12.996/2014, dispõe sobre a prestação do serviço regular de transporte rodoviário coletivo interestadual e internacional de passageiros sob o regime de autorização, esclarecendo as regras e gerando maior competitividade entre os interessados, possibilitando que eles disputem os mercados disponíveis em igualdade de condições, além de lhes oportunizar a solicitação de novos mercados.
Requerimento devidamente analisado – A ANTT informou que a análise foi realizada e constatou que a empresa não possuía autorização para operar quase a totalidade dos mercados secundários solicitados e, dessa forma, o pleito foi indeferido e o resultado informado à empresa. A Agência esclareceu, ainda, que a empresa já opera na linha Goiânia/GO-Vila Rica/MT, cujos mercados foram autorizados administrativamente, não havendo relação com a análise do requerimento, objeto dos autos que está em discussão.
Diante dos fatos, a desembargadora votou no sentido do não provimento
do recurso por não identificar atraso na análise do pedido administrativo e entendeu que o requerimento foi devidamente analisado, ainda que de forma diversa do pretendido pela impetrante.
Ademais, disse a magistrada que não cabe ao Poder Judiciário substituir a Administração no juízo de conveniência e oportunidade e determinar a análise de requerimento referente a um novo mercado, uma vez que compete à ANTT tal análise.
O recurso ficou assim ementado:
MANDADO DE SEGURANÇA. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. TRANSPORTE RODOVIÁRIO INTERESTADUAL E INTERNACIONAL DE PASSAGEIROS. REGIME DE SERVIÇO PÚBLICO. LEI 10.233/01 COM ALTERAÇÃO PELA LEI 12.996/2014. EXIGÊNCIA DE LICITAÇÃO DISPENSADA. NECESSIDADE DE OUTORGA DE AUTORIZAÇÃO PARA REGULAR EXPLORAÇÃO DO SERVIÇO. RESOLUÇÃO ANTT 4.770/2015. CONVENIÊNCIA E OPORTUNIDADE DO PODER PÚBLICO. OMISSÃO DO PODER EXECUTIVO. OUTORGA A TÍTULO PRECÁRIO PELO PODER JUDICIÁRIO. DESCABIMENTO. SENTENÇA MANTIDA.
1. Em exame controvérsia afeta à exploração de serviços de transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros.
2. Não pode o Poder Judiciário, a pretexto de suprir a omissão do Executivo, autorizar o funcionamento/manutenção de serviços de transportes, sob pena de desorganizar o modelo político da divisão de tarefas pelos Poderes (REsp 1.264.953/PR, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, Primeira Turma, julgado em 03/03/2015, DJe 12/03/2015).
3. As Leis nº 12.996/2014 e 12.815/2013, que alteraram a Lei 10.233/2001, trouxeram significativas mudanças ao cenário do transporte terrestre coletivo interestadual de passageiros, ao permitir, independentemente de licitação, que a Administração proceda à autorização dentro dos conceitos e requisitos legais, para a prestação do serviço regular de transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros, em consonância com o que estabelece o art. 21, XII, ‘e’, da CF/88.
4. A Resolução ANTT nº 4.770, de 25.06.2015, regulamentou a Lei nº 12.996/2014, dispondo sobre a prestação do serviço regular de transporte rodoviário coletivo interestadual e internacional de passageiros, sob o regime de autorização, esclarecendo as regras e gerando maior competitividade entre os interessados, possibilitando que eles disputem os mercados disponíveis em igualdade de condições, além de oportunizar-lhes a solicitação de novos mercados.
5. A autorização de serviço público é ato unilateral, discricionário e precário de que a Administração Pública se utiliza para tornar possível o desempenho de certa atividade de interesse público pelo particular.
6. Compete à ANTT a análise do requerimento administrativo. Prerrogativa da Administração de condicionar a concessão dessas autorizações ao atendimento dos critérios discricionários que lhe são próprios, considerando que toda modificação implica em grandes alterações no sistema de transporte rodoviário de passageiros, como a definição de linhas, itinerários, pontos de parada e de todo o esquema operacional inerente à prestação do serviço, que deve ser embasada em um complexo estudo de viabilidade técnica e econômica, elaborado por meio de pesquisas e estudos específicos de tráfego e de demanda de serviços de transporte, cuja promoção compete à ANTT, nos termos do art. 24, inc. I, da Lei n. 10.233/2001.
7. Não cabe ao Poder Judiciário substituir a Administração no juízo de conveniência e oportunidade e determinar a análise de requerimento referente a um novo mercado, assim como também não lhe compete autorizar precariamente a exploração do serviço público em questão, sob pena de intervenção em esfera reservada a outro Poder, em flagrante afronta ao quanto disposto no art. 2º da Constituição da República.
8. Apelação a que se nega provimento.
9. Sem condenação ao pagamento de honorários advocatícios (art. 25 da Lei 12.016/2009).
Em conformidade com o voto da relatora, a 6ª Turma do TRF1 decidiu, por unanimidade, manter a sentença negando o pedido requerido pela impetrante.
Processo: 1015107-57.2018.4.01.3400