Em ação de consignação em pagamento, o Juízo da 1ª Vara Federal da Seção Judiciária de Mato Grosso negou o pedido dos autores para quitação de financiamento de aquisição de imóvel pela forma pretendida. Esses, inconformados, recorreram ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), e o processo foi julgado pela 7ª Turma.
No apelo, os requerentes sustentaram que consignaram em juízo o valor do saldo restante calculado de acordo com o Sistema da Amortização (SAC) e que, mesmo assim, tiveram os nomes inscritos nos cadastros de inadimplentes.
Argumentaram os autores que o laudo técnico que apresentaram não foi contestado pela Caixa Econômica Federal (Caixa) e requereram a inversão do ônus da prova (ou seja, a Caixa teria de comprovar que o valor calculado por eles não está correto) ou, alternativamente, pediram a aplicação do Sistema Gauss na elaboração dos cálculos.
Em síntese, o SAC é um modelo em que o pagamento do valor financiado ocorre de forma constante, mas as parcelas serão compostas pelos juros que foram acordados durante a concessão do financiamento imobiliário. O Método de Gauss, pretendido pelos apelantes, procura identificar a evolução de um financiamento com pagamentos mensais com juros simples, dessa forma, excluindo-se a capitalização dos juros.
Sistema Gauss – Ao analisar o processo, o relator, desembargador federal Jamil de Jesus Oliveira, explicou que, conforme o art. art. 539 e seguintes do Código de Processo Civil (CPC), a ação de consignação em pagamento é proposta pelo devedor contra o credor que se recusar a receber o valor devido ou exigir valor superior ao supostamente devido e “tem por finalidade a liberação do devedor de sua obrigação, com a declaração judicial de que o valor consignado é suficiente para a quitação da dívida”.
O magistrado verificou, ainda, que somente se aplica o Código de Defesa do Consumidor (CDC), com a inversão do ônus da prova, aos contratos de financiamento quando houver cláusula abusiva ou ilegalidade que a justifique, o que não é o caso deste contrato. Os apelantes, disse, não apresentaram indícios de irregularidade da instituição financeira, apresentando apenas os cálculos contábeis da parte deles.
Em relação ao sistema de amortização da dívida, o contrato prevê a adoção do SAC, destacou o relator, livremente convencionado entre as partes. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) não veda seu uso porque não provoca “desequilíbrio econômico-financeiro no contrato, enriquecimento ilícito ou qualquer outra ilegalidade”, e, por isso, não se justifica a revisão do contrato para adoção do Método Gauss.
O Sistema Gauss, requerido pelos apelantes, não é um método de amortização, conforme a jurisprudência citada pelo desembargador, assim expressada: “O sistema Gauss nada tem a ver com a noção jurídica de mútuo e desconsidera a necessidade de remunerar o mutuante pelo que ele não pôde fruir porque estava à disposição do mutuário, pelo tempo e taxa de juros remuneratórios convencionados”.
O recurso ficou assim ementado:
AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. PRETENSÃO DE PURGAÇÃO DA MORA. PRETENSÃO DE SUBSTITUIÇÃO DO SISTEMA DE AMORTIZAÇÃO CONSTANTE (SAC), LIVREMENTE ADOTADO NO CONTRATO, PELO MÉTODO GAUSS. DESCABIMENTO. CLÁUSULA CONTRATUAL. JUROS E ENCARGOS. LEGALIDADE. QUITAÇÃO DA DÍVIDA. INOCORRÊNCIA. HONORÁRIOS RECURSAIS. SENTENÇA MANTIDA. 1. Cuida-se de apelação interposta pelos autores contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Federal da Seção Judiciária do Mato Grosso que, na Ação de Consignação em Pagamento ajuizada em face da Caixa Econômica Federal, objetivando a quitação do financiamento do contrato de aquisição de imóvel, julgou improcedente o pedido consignatório. 2. Nos termos do art. 539 e seguintes do CPC, a ação de consignação em pagamento tem por finalidade a liberação do devedor de sua obrigação, com a declaração judicial de que o valor consignado é suficiente para a quitação da dívida. 3. Em que pese ser pacífico o entendimento pela aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor (CDC) aos contratos de financiamento celebrados com instituições financeiras (Súmula n. 297 do STJ), somente se justifica se forem identificadas cláusulas contratuais abusivas ou mesmo ilegalidade que justifique a intervenção do Poder Judiciário, não sendo plausível a inversão do ônus da prova sem que haja sequer indícios dessa ilegalidade. Precedentes deste Tribunal declinados no voto. 4. A jurisprudência também já definiu pela legalidade da utilização do Sistema de Amortização Constante (SAC) para cálculo de prestações de financiamentos e empréstimos, não acarretando, por si só, a incidência de juros sobre juros, tratando-se de modalidade de amortização que resulta em prestações decrescentes, com juros reduzindo a cada prestação. 5. Portanto, descabe a aplicação de outro método de cálculo das prestações que não o livremente contratado entre as partes. Não existe vedação legal à utilização da Tabela Price (SFA), do SAC ou do Sacre, estes sistemas de amortização não provocam desequilíbrio econômico-financeiro no contrato, enriquecimento ilícito ou qualquer outra ilegalidade, cada um deles possui uma configuração própria de vantagens e desvantagens. Na ausência de nulidade na cláusula contratual que preveja a utilização de qualquer um destes sistemas, na ausência de óbices à prática de juros compostos, não se justifica a revisão do contrato para a adoção do Método Gauss. (STJ, AREsp n. 1.989.628, Ministro Marco Aurélio Bellizze, DJe de 25/02/2022.) 6. No caso dos autos, o contrato celebrado entre as partes prevê, em sua Cláusula Quinta, a adoção do Sistema de Amortização Constante (SAC), não tendo os apelantes apresentado sequer indícios de irregularidade por parte da ré, limitando-se a requerer inversão do ônus da prova e apresentando cálculos contábeis, produzidos unilateralmente, sem que fosse por eles requerida produção de prova. 7. Não se afigura possível a utilização do Sistema Gauss, que não é um método de amortização, em substituição do sistema previsto no contrato. Precedentes declinados no voto. 8. Honorários advocatícios recursais fixados, nos termos do art. 85, § 11, do CPC. 9. Apelação dos autores desprovida.
Portanto, concluiu o magistrado, não ocorreu a quitação da dívida, e a sentença deve ser mantida. O Colegiado, por unanimidade, acompanhou o voto do relator.
Processo: 1002589-51.2017.4.01.3600