É cabível a suspensão do cumprimento de sentença em caso de intervenção em entidade de previdência complementar

Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), nas hipóteses de intervenção em entidade de previdência complementar, é cabível a suspensão do cumprimento de sentença pelo período de duração da medida interventiva, aplicando-se as diretrizes da Lei 6.024/1974.

Com base nesse entendimento, por unanimidade, a Turma deu parcial provimento ao recurso especial de uma entidade de previdência complementar que, em fase de cumprimento de sentença, buscou suspender a execução de uma ação de cobrança de um credor.

O pedido da entidade foi rejeitado em primeira e segunda instâncias com os fundamentos de que a entidade da previdência complementar não se confunde com instituição financeira e, portanto, não poderia se beneficiar de dispositivos da Lei 6.024/1974, como a suspensão das execuções (artigo 6º).

Aplicação subsidiária da Lei 6.024/74 permite a suspensão da execução

Ao analisar o caso, a relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, destacou pontos da Lei Complementar 109/2001, que disciplina os planos de previdência complementar. Entre os dispositivos, ela citou a regra do artigo 62 que possibilita a aplicação subsidiária da legislação sobre intervenção e liquidação extrajudicial das instituições financeiras (Lei 6.024/1974) nos casos de liquidação e intervenção das entidades de previdência complementar.

Além disso, a ministra lembrou que nas hipóteses de liquidação extrajudicial das entidades de previdência complementar, a LC 109/2001 já prevê a suspensão de ações e execuções iniciadas sobre direitos e interesses relativos ao acervo da entidade liquidanda (artigo 49, inciso I).

“Mister reconhecer que tal efeito deve ser estendido às hipóteses de intervenção na entidade, também em virtude da própria interpretação teleológica e sistemática do regramento específico”, afirmou Nancy Andrighi.

Por outro lado, a ministra rejeitou a aplicação de regras da Lei 6.024/1974 para limitar o prazo de suspensão das ações, conforme define o artigo 4º, pois a LC 109/2001 é expressa quanto ao assunto no artigo 45. “Nessa hipótese, havendo regramento expresso, não há razão para aplicar outra legislação”, declarou a magistrada.

Levantamento dos valores previamente bloqueados não é efeito automático

Por fim, a ministra esclareceu que o levantamento dos valores previamente bloqueados não é efeito automático da ordem de suspensão da execução, até porque a sua manutenção não afeta o tratamento igualitário dos credores.

De acordo com Nancy Andrighi, o regime geral de suspensão da execução é aquele previsto no artigo 923 do Código de Processo Civil (CPC), segundo o qual suspensa a execução, não serão praticados atos processuais, podendo o juiz, entretanto, salvo no caso de arguição de impedimento ou de suspeição, ordenar providências urgentes.

“Cabe à entidade demonstrar, concretamente, a necessidade e a urgência da liberação dos valores bloqueados, não se prestando para tanto a mera referência à situação financeira deficitária que deu causa a sua própria intervenção”, concluiu a relatora.

O recurso ficou assim ementado:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. GRATUIDADE DA JUSTIÇA E SUPOSTO EXCESSO DE EXECUÇÃO. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7⁄STJ. ENTIDADE FECHADA DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR SOB REGIME EXCEPCIONAL DE INTERVENÇÃO. LEI COMPLEMENTAR Nº 109⁄2001. INTERVENÇÃO DECRETADA PELO PERÍODO NECESSÁRIO AO EXAME DA SITUAÇÃO DA ENTIDADE E ENCAMINHAMENTO DE PLANO DESTINADO À SUA RECUPERAÇÃO. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DA LEI Nº 6.024⁄1974 QUE DISPÕE SOBRE INTERVENÇÃO E LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL DE INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. SUSPENSÃO DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. NECESSIDADE. SUCESSIVAS PRORROGAÇÕES. POSSIBILIDADE. ESTORNO DOS VALORES PENHORADOS. DESNECESSIDADE. MANUTENÇÃO DOS VALORES BLOQUEADOS. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Ação de cobrança, atualmente em fase de cumprimento de sentença, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 10⁄11⁄2021 e concluso ao gabinete em 4⁄8⁄2022.
2. O propósito recursal consiste em definir se, quando decretada intervenção em entidade de previdência complementar, é cabível a suspensão do cumprimento de sentença pelo período de duração da medida interventiva e, em decorrência disso, devem ser levantados os valores previamente bloqueados.
3. A Lei Complementar nº 109⁄2001 estabelece que (I) “a intervenção será decretada pelo prazo necessário ao exame da situação da entidade e encaminhamento de plano destinado à sua recuperação” (art. 45) e (II) se aplicam “à intervenção e à liquidação das entidades de previdência complementar, no que couber, os dispositivos da legislação sobre a intervenção e liquidação extrajudicial das instituições financeiras” (art. 62).
4. Quando do julgamento do REsp 1.734.410⁄SP, 3ª Turma, DJe 24⁄8⁄2018, fixou-se (I) a aplicabilidade da Lei nº 6.024⁄1974, direcionada às instituições financeiras, de maneira subsidiária às intervenções de entidades da previdência complementar, e (II) a desnecessidade de observação estrita do prazo de seis meses previsto no art. 4º da Lei nº 6.024⁄1974, sendo admissível mais de uma prorrogação do período de duração da medida de administração excepcional.
5. Na análise do REsp 1.796.664⁄RS, 3ª Turma, DJe 22⁄11⁄2019, decidiu-se que, a despeito de a LC nº 109⁄2001 referir que haverá, nas hipóteses de liquidação extrajudicial, a suspensão das ações e execuções iniciadas sobre direitos e interesses relativos ao acervo da entidade liquidanda (art. 49, I), mister reconhecer que tal efeito deve ser estendido às hipóteses de intervenção na entidade de previdência complementar.
6. O levantamento dos valores previamente bloqueados não é efeito automático da ordem de suspensão da execução, até porque a sua manutenção não afeta o tratamento igualitário dos credores. Precedentes.
7. Hipótese em que o Tribunal de origem decidiu por não suspender o cumprimento de sentença sob os fundamentos de que (I) a entidade de previdência complementar não se confunde com instituição financeira e, portanto, não pode se beneficiar da referida suspensão e (II) as sucessivas prorrogações do período de intervenção federal impedem a concessão do benefício.
8. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, parcialmente provido para determinar a suspensão do cumprimento de sentença pelo período necessário ao exame da situação da entidade e encaminhamento de plano destinado à sua recuperação.

Leia o acórdão no REsp 2.006.054.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 2006054

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