Contrato de parceria com empresa de patinetes afasta responsabilidade de plataforma digital

Para a 4ª Turma, o contrato entre a Grin e a Rappi não era de prestação de serviços

A Rappi Brasil Intermediação de Negócios Ltda., com sede em São Paulo (SP), não pode ser responsabilizada subsidiariamente pelos encargos trabalhistas devidos a um mecânico que fazia a manutenção de patinetes elétricos da Grin Mobilidade oferecidos pela plataforma digital. Para a maioria da Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, o contrato firmado foi de parceria, e não de prestação de serviços.

Dispensa

O mecânico foi dispensado em 3/6/2020, mas não recebeu as verbas rescisórias. Por isso, ajuizou a ação contra as duas empresas, argumentando que, embora contratado pela Grin, sempre havia trabalhado em benefício da Rappi.

Situação delicada

A Grin confirmou que não pagara as verbas devidas, porque estaria em “delicada situação financeira” em razão da pandemia da covid-19.

Tecnologia intermediadora

Por sua vez, a Rappi sustentou que é uma empresa de tecnologia intermediadora, que explora uma plataforma tecnológica para permitir aos seus usuários a oferta e a procura de bens e serviços. A Grin, por sua vez, seria a empresa especializada em serviços de mobilidade urbana que utilizaria a plataforma da Rappi para aluguel de bicicletas e patinetes.

Terceirização

O juízo da 75ª Vara do Trabalho de São Paulo condenou a Grin e, subsidiariamente, a Rappi ao pagamento das parcelas devidas ao mecânico. A sentença foi confirmada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP), que considerou que a Rappi era tomadora dos serviços prestados pela Grin e, portanto, a relação era de terceirização da manutenção de patinetes.

Transferência de tarefas

O relator do recurso de revista da Rappi, ministro Alexandre Ramos, explicou que a terceirização – e, consequentemente, a responsabilidade subsidiária do tomador de serviços – pressupõe a atomização da cadeia produtiva e a transferência de tarefas para outra empresa intermediadora e fornecedora de mão de obra.

Dinâmica do mercado

Segundo ele, não se enquadram nessa hipótese várias relações mercantis que, na dinâmica moderna de mercado, são estabelecidas entre empresas para distribuição ou fornecimento de bens e serviços, como nos casos de revenda de produtos e contratos de facção ou de franquia.

Parceria

No caso, com base nas informações da decisão do TRT, o relator concluiu que houve, na verdade, um contrato de parceria, pelo qual uma empresa oferecia a locação de seus patinetes elétricos na plataforma digital da outra, e não de prestação de serviços com fornecimento de mão de obra. A relação, portanto, era estritamente comercial.

Ficou vencida a ministra Maria Cristina Peduzzi, para quem os fatos registrados pelo TRT caracterizavam a terceirização, e a revisão dessa premissa exigiria o reexame de fatos e provas, vedado em recurso de revista (Súmula 126 do TST). A ministra apontou, ainda, questões processuais que, a seu ver, impediriam o exame do recurso.

O recurso ficou assim ementado:

1. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017.

RAPPI BRASIL INTERMEDIAÇÃO DE NEGÓCIOS LTDA. MANUTENÇÃO DE PATINETES ELÉTRICOS. UTILIZAÇÃO DISPONIBILIZADA EM PLATAFORMA DIGITAL. CONTRATO DE PARCERIA. TERCEIRIZAÇÃO NÃO CONFIGURADA. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 331 DO TST. RESPONSABILIZAÇÃO SUBSIDIÁRIA INDEVIDA. I. Diante da potencial contrariedade à Súmula 331, IV, do TST (má aplicação), dá-se provimento ao agravo para processar o recurso de revista. II. Agravo de instrumento provido.

2. RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017.

RAPPI BRASIL INTERMEDIAÇÃO DE NEGÓCIOS LTDA. MANUTENÇÃO DE PATINETES ELÉTRICOS. UTILIZAÇÃO DISPONIBILIZADA EM PLATAFORMA DIGITAL. CONTRATO DE PARCERIA. TERCEIRIZAÇÃO NÃO CONFIGURADA. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 331 DO TST. RESPONSABILIZAÇÃO SUBSIDIÁRIA INDEVIDA. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA DA CAUSA RECONHECIDA. I. O entendimento consagrado na Súmula nº 331, IV, desta Corte, diz respeito à hipótese em que há contratação de mão de obra, por meio da intermediação de empresa prestadora, para a realização de determinado serviço à empresa tomadora. Logo, a terceirização e a consequente responsabilidade subsidiária do tomador de serviços, na forma do referido verbete sumular, pressupõe a atomização da cadeia produtiva e das atividades empresariais, com a transferência de tarefas para outra empresa intermediadora e fornecedora de mão de obra. Dessa hipótese diferem as múltiplas e diversas relações mercantis que, na moderna dinâmica de mercado, são estabelecidas entre empresas, para distribuição ou fornecimento de bens e serviços. II. No caso dos autos, extrai-se do quadro fático delineado no acórdão regional que houve, na verdade, celebração de contrato de parceria, pelo qual uma empresa disponibilizou a locação de seus patinetes elétricos na plataforma digital da outra, e não de prestação de serviços (com fornecimento de mão de obra). Inaplicável, portanto, a responsabilidade subsidiária de que trata a Súmula 331, IV, do TST. III. Recurso de revista conhecido e provido.

Processo: RR-1000832-08.2020.5.02.0075 

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