Representando a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), o professor da Faculdade de Direito da Universidade do Rio de Janeiro (Uerj) Gustavo Binenbojm afirmou na manhã desta segunda-feira (12), no Supremo Tribunal Federal (STF), que é “incontroverso” que a Constituição Federal e as leis infraconstitucionais não comtemplam expressamente o direito ao esquecimento, “como se fora uma espécie de direito à amnesia coletiva, o direito à queima dos arquivos da sociedade”.
Binenbojm participa da audiência pública realizada para discutir a aplicabilidade ou não “do direito ao esquecimento” na esfera civil. No caso, o STF ouve especialistas para julgar o Recurso Extraordinário (RE) 1010606, que teve repercussão geral reconhecida. O recurso foi interposto contra decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) que manteve sentença negando o pedido de reparação de danos feito pelos familiares da vítima de um crime de grande repercussão, ocorrido no Rio de Janeiro, na década de 1950. A família alega que o próprio tempo fez com que o crime fosse esquecido pela mídia e questiona a reconstituição e utilização do caso, sem autorização, em programa de TV. Pede indenização pela exploração comercial desautorizada de imagem pública de pessoa morta.
Mestre e doutor em Direito Público pela Uerj, Binenbojm destacou a importância da audiência que, segundo ele, “definirá o futuro da liberdade de expressão e da imprensa no Brasil”. Segundo ele, o caso concreto foi julgado improcedente em todas as instâncias do Judiciário “porque é evidente que aqui há o direito da imprensa de veicular informações públicas, há um direito do público de se informar sobre esse episódio, lamentavelmente histórico, da nossa historiografia policial”.
Ele também classificou o pedido feito no processo como uma “pretensão indenizatória substitutiva a uma pretensão inibitória da liberdade de imprensa”, que apresenta um “direito impreciso, vago, imprestável e inservível a se elevar à condição de um contra valor justificável a limitar direitos preferenciais, como são os direitos à liberdade de expressão e de informação”. O professor ressaltou ainda ser “falaciosa” a ideia de que o direito à informação se refere apenas a fatos contemporâneos. “Ao contrário, o direito à informação envolve também fatos pretéritos. A veiculação, a discussão, a crítica sobre fatos passados é matéria essencial para a construção da memória coletiva e da historiografia social, como aliás assegurada também na Constituição nos artigos 215 e 216.”
Por fim, Binenbojm chamou atenção para a imprecisão conceitual e a indefinição dos limites do que seria o direito ao esquecimento. Ele questionou, por exemplo, quanto tempo terá que se passar para que alguém tenha o direito de impedir uma publicação sobre um fato relativo à sua biografia e quais seriam as circunstâncias históricas ou de interesse público que devem envolver o direito ao esquecimento. “Certamente, cada especialista nessa sala terá uma opinião, cada juiz brasileiro terá uma visão. E a minha visão é de que essa é uma poção letal para o direito à informação na sociedade brasileira e em qualquer lugar do mundo”, alertou.
Ele destacou ainda que as Supremas Cortes no mundo são “uníssonas” em afirmar que a liberdade de informação só pode ser relativizada, embora não seja um direito absoluto, por razões estritamente definidas e precisas, que impeçam a instauração de um regime de ampla discricionariedade. Caso contrário, afirmou, ter-se-ia a abertura de uma “caixa de Pandora”.