Para o TST, a dispensa foi discriminatória
A Subseção 1 em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho considerou discriminatória a dispensa de um fisiologista do São Paulo Futebol Clube durante o tratamento de câncer de próstata. Com isso, o clube deverá reintegrá-lo e restabelecer seu plano de saúde, e o processo retornará à Quinta Turma do TST para exame de matérias que não haviam sido julgadas no recurso anterior.
Dispensa
Na reclamação trabalhista, o fisiologista, contratado em 2012, disse que, no mesmo ano, foi diagnosticado com câncer e iniciou o tratamento. Em 2014, o clube chegou a lhe dar aviso-prévio, mas, ao ser informado da doença, afastou-o das atividades, mantendo o salário. Oito meses depois, foi afastado pelo INSS e ao receber alta, em 2016, foi dispensado.
Sem preconceito
O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP) acolheu o argumento da discriminação e determinou a reintegração e o restabelecimento do plano de saúde, além de deferir indenização por danos morais. Contudo, a Quinta Turma do TST reformou essa decisão, por entender que o câncer de próstata não se enquadra na Súmula 443 do TST, que presume discriminatória a dispensa em casos de doenças que gerem estigma ou preconceito.
A Turma também considerou que o clube paulistano, ciente da doença, havia permitido que o fisiologista frequentasse o local de trabalho e almoçasse no centro de treinamento, e, espontaneamente, mantido o pagamento dos salários no período do afastamento previdenciário.
Indício
No julgamento dos embargos do profissional à SDI-1, prevaleceu o voto da ministra Kátia Arruda, para quem a permissão para frequentar o centro de treinamento e a manutenção do pagamento de salários não têm relação direta com a ruptura do contrato de trabalho. Segundo a ministra, a dispensa logo após o término do benefício previdenciário é indício de que o empregador tomou a medida justamente em razão da necessidade de afastamento para tratamento.
Doença estigmatizante
O presidente do TST, ministro Lelio Bentes Corrêa, que havia pedido vista regimental do processo, associou-se à divergência, ressaltando que a jurisprudência da SDI-1 reconhece a natureza estigmatizante do câncer de próstata. Em voto convergente, ele elogiou a conduta do São Paulo de manter os salários durante o afastamento previdenciário, mas entendeu que não ficou demonstrada uma razão lícita e plausível para a demissão.
Ficaram vencidos os ministros Alexandre Ramos, Hugo Scheuermann, Breno Medeiros e Evandro Valadão e a ministra Dora Maria da Costa.
Tutela de urgência
No dia 10 de agosto, a ministra Kátia Arruda concedeu tutela provisória de urgência determinando que a reintegração do fisiologista no prazo de 15 dias a contar da intimação da decisão, sob pena de multa diária de R$ 5 mil.
O recurso ficou assim ementado:
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. PRELIMINAR DE NULIDADE POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. Com fundamento no artigo 282, § 2º, do CPC de 2015, deixa-se de examinar a preliminar em epígrafe. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA PRESUMIDA. CÂNCER. Em razão de provável contrariedade à Súmula nº 443 do TST, dá-se provimento ao agravo de instrumento para determinar o prosseguimento do recurso de revista. Agravo de instrumento provido. RECURSO DE REVISTA. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA PRESUMIDA. CÂNCER. O Tribunal Regional, valendo-se da presunção relativa, juris tantun , a que se refere a Súmula nº 443 do TST, reconheceu o caráter discriminatório da dispensa do reclamante e determinou sua reintegração ao emprego, por entender que o empregador não logrou comprovar que “a escolha do outro trabalhador, em detrimento do recorrente, vitimado de doença grave, tenha parâmetro diverso à própria existência da moléstia” . Ocorre que, embora o poder diretivo do empregador não seja ilimitado, é fundamental presumir a boa-fé patronal no exercício regular do seu direito de dispensar, sem justa causa, seus empregados. Nesse passo, entende este Relator que, conquanto o câncer, em geral, seja doença grave, não necessariamente gera estigma e preconceito de modo a atrair, por si só, a aplicação da Súmula nº 443/TST. Contudo, a SDBI-1 do TST, na sessão do dia 4/4/2019, ao julgar o processo nº TST-E-ED-RR-68-29.2014.5.09.0245, por maioria, decidiu em sentido contrário. Sendo assim, patenteado no acórdão regional que o reclamante está acometido por câncer de próstata, passa a ser do empregador o ônus de comprovar que a dispensa sem justa não foi discriminatória, consoante a Súmula nº 443/TST e o recente julgado da SBDI-1. No caso autos, extrai-se das premissas fáticas delineadas pelo TRT que a presunção relativa de dispensa discriminatória foi ilidida por prova em contrário, haja vista o registro de que o reclamante ficou afastado do trabalho por “bastante tempo”, tendo o reclamado contratado outro profissional para ficar em lugar. Em razão do afastamento prolongado do reclamante, o empregador se viu na necessidade de contratar substituto, inexistindo obrigação legal de, após o fim da licença médica do reclamante, permanecer com dois empregados ou de despedir um trabalhador para dar sequência ao contrato que estava suspenso. Precedente da SBDI-1 (E-RR-465-58.2015.5.09.0664, Relator Ministro: Cláudio Mascarenhas Brandão, DEJT de 26/10/2018). Ademais, consta do acórdão impugnado que o reclamante confessou não ter sofrido preconceito ou discriminação pelo reclamado em razão de sua doença durante a vigência de seu contrato. Ciente da moléstia, o reclamado permitiu que o reclamante frequentasse o local de trabalho, almoçasse no centro de treinamento, e, espontaneamente, manteve o pagamento dos salários não exigíveis no período do afastamento, aspectos que favorecem a desconstituição da presunção relativa de dispensa discriminatória. Recurso de revista conhecido e provido.
Processo: E-ED-RR-1001897-90.2016.5.02.0006