A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que declarou a nulidade da adjudicação de um imóvel em execução de título extrajudicial, porque o bem já havia sido arrolado no plano de recuperação judicial da empresa devedora.
O colegiado considerou que o credor pode propor a execução no juízo competente, mas cabe ao juízo da recuperação autorizar a excussão de bens de empresa em recuperação, ainda que a constrição seja destinada ao pagamento de dívidas extraconcursais.
O recurso teve origem em agravo de instrumento interposto pelo Ministério Público contra decisão que, nos autos de execução de título extrajudicial promovida contra empresa em recuperação, deferiu a adjudicação de imóvel objeto de penhora. A recuperação foi pedida em 2008 e deferida em 2009 – antes da execução do título extrajudicial –, e, entre os bens arrolados, já constava o imóvel que foi posteriormente penhorado na execução.
O agravo foi acolhido pelo TJSP, segundo o qual, depois de aprovado e homologado o plano de recuperação, os bens nele relacionados não podem ser objeto de alienação ou oneração, pois é preciso garantir aos credores a segurança de recebimento dos seus créditos na recuperação.
Opção do credor pela forma de execução do título extraconcursal
No recurso especial, o autor da execução alegou que a Lei 11.101/2005 não proíbe a excussão de bens do ativo permanente da sociedade em recuperação. Segundo ele, a legislação impede que o devedor aliene seus bens, mas não proíbe que o Judiciário os exproprie para satisfazer crédito não sujeito à recuperação.
Além disso, o exequente questionou a legitimidade do MP para interpor o agravo, afirmando que a autorização legal para o órgão intervir na recuperação não significa que ele possa atuar na execução de créditos não sujeitos a esse processo.
O ministro Villas Bôas Cueva, relator no STJ, explicou que o MP tem o papel institucional de zelar, em nome do interesse público, pela consecução do plano de recuperação, o que justifica atuar nas execuções contra a empresa devedora, tendo em vista os possíveis efeitos em sua saúde financeira e na capacidade de se recuperar.
Em relação à competência do juízo da recuperação para acompanhar e autorizar a excussão de bens da devedora, o relator destacou que os créditos constituídos após o deferimento do pedido recuperacional, por serem extraconcursais, não se submetem aos seus efeitos, sendo facultado ao credor propor a respectiva execução.
A execução, complementou o magistrado, é processada pelas regras aplicáveis a qualquer outro processo executivo e perante o juízo competente, ao qual cabe promover todos os atos processuais, exceto a apreensão e a alienação de bens. Ressaltou, ainda, que, compete ao juízo da recuperação acompanhar e autorizar a excussão de bens da empresa em recuperação, ainda que destinados à satisfação de créditos extraconcursais.
Credor pode habilitar seu crédito na falência
No caso dos autos, Villas Bôas Cueva observou que, não fosse o fato de a recuperação judicial ter sido convolada em falência em 2012, seria possível determinar a remessa do processo ao juízo da recuperação, tanto para a averiguação da natureza extraconcursal do crédito executado quanto para que fosse verificada a viabilidade de adjudicação do bem sem o comprometimento do plano.
“No entanto, presente essa peculiar circunstância, e reconhecida a efetiva competência do juízo recuperacional para acompanhar e autorizar a excussão de bens da empresa – que, à época, ainda estava em recuperação –, não resta alternativa à recorrente senão habilitar seu crédito nos autos da falência, observada, se for o caso, a preferência legal estabelecida no artigo 84 da Lei 11.101/2005”, concluiu o ministro.
Foram opostos Embargos de Declaração que foram rejeitados, desta forma colecionamos a ementa original.
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. PARTE EXECUTADA. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. BEM IMÓVEL. INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. POSSIBILIDADE. ADJUDICAÇÃO. ANULAÇÃO. ALIENAÇÃO DE BENS. COMPETÊNCIA. JUÍZO RECUPERACIONAL.1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 1973 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3⁄STJ).2. Não há falar em falha na prestação jurisdicional se o Tribunal de origem motiva adequadamente sua decisão, solucionando a controvérsia com a aplicação do direito que entende cabível, ainda que em desacordo com a expectativa da parte.3. A incompetência de órgão fracionário de tribunal deve ser alegada pela parte interessada na primeira oportunidade que tiver para se manifestar nos autos, sob pena de preclusão.4. O papel institucional conferido ao Ministério Público, de zelar, em nome do interesse público (função social da empresa), pela consecução do plano de recuperação judicial, justifica a sua atuação nas execuções propostas contra a empresa recuperanda, ainda que não seja obrigatória a sua intervenção.5. Os créditos constituídos após o deferimento do pedido de recuperação judicial, por serem extraconcursais, não se submetem aos seus efeitos, sendo facultado ao credor propor a respectiva execução, que se processa pelas regras ordinárias aplicáveis a qualquer outro feito executivo e perante o juízo competente, a quem cabe promover todos os atos processuais, exceto a apreensão e a alienação de bens.6. Compete ao juízo da recuperação acompanhar e autorizar a excussão de bens da empresa em recuperação, ainda que destinados à satisfação de créditos extraconcursais.7. Anulada a adjudicação de bem imóvel em virtude da efetiva competência do juízo recuperacional para acompanhar e autorizar a excussão de bens da empresa e convolada a recuperação em falência, não resta outra alternativa à credora senão habilitar seu crédito nos autos da falência, observada, se for o caso, a preferência legal estabelecida no art. 84 da Lei nº 11.101⁄2005.8. Recurso especial não provido.