Acusado de contrabando tem pedido liberdade provisória mantida pelo TRF1 em observância a princípios constitucionais

Por entender que as medidas cautelares impostas pelo Juízo da 1ª Vara da Subseção Judiciária de Divinópolis/MG se mostram suficientes para garantia da ordem pública, a 4ª Turma do TRF 1ª Região, negou provimento ao recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Federal (MPF) que tinha como objetivo manter preso um réu que foi flagrado transportando em um furgão, cento e três caixas de cigarros importados, sem a respectiva documentação.

Após a prisão do recorrido, o Juiz da 1ª Instância converteu a prisão em flagrante em liberdade provisória, mediante compromisso e fiança, no valor de 5 salários mínimos, e comparecimento periódico trimestral em juízo, a fim de justificar suas atividades.
Insatisfeito, o MPF recorreu ao Tribunal sustentando que o acusado não poderia ficar em liberdade provisória, pois não possui ocupação lícita, dedicando-se profissionalmente ao contrabando de cigarros, ou seja, faz do crime seu meio de vida, o que representa notório risco para a ordem pública.

Ao analisar o caso, o relator, desembargador federal Néviton Guedes, destacou inicialmente que no sistema jurídico brasileiro a liberdade é a regra e a prisão processual é a exceção. “A Constituição Federal, no inciso LXVI do art. 5º, estabelece que ninguém será levado à prisão ou nela mantido quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança”, afirmou.

“Orientando-se pelo texto da Constituição Federal, garantiu o legislador infraconstitucional, por meio da prisão preventiva, a possibilidade de restrição da liberdade locomotora durante o curso da investigação ou do processo criminal, como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria”, explicou o magistrado.

Para a decretação da prisão preventiva, o relator esclareceu que é imprescindível a presença dos seus pressupostos, prova de autoria e de materialidade, e de um de seus fundamentos, risco à ordem pública, à instrução ou à aplicação da lei penal. Além disso, de acordo a jurisprudência firmada pela Turma após a vigência da Lei nº 12.403/2011, para que o réu seja mantido em prisão preventiva exige-se também que não seja cabível sua substituição por outra medida cautelar.

Para o desembargador federal, a decisão da 1ª Instância está correta diante da falta de justificativa concreta para a convicção de que a soltura do paciente implicará ameaça à garantia da ordem pública ou à aplicação da lei penal.

A presença da materialidade do delito, bem como dos indícios da autoria, não resultam em elementos suficientes para justificar a decretação da prisão preventiva se não estiver demonstrado de forma concreta sua necessidade, fazendo-se necessária a aferição do risco aos bens jurídicos tutelados pelo art. 312, do CPP, atendo-se a elementos concretos, que indiquem ser a conduta do agente efetiva probabilidade de representar perigo à ordem pública, à ordem econômica, à instrução criminal ou à aplicação da Lei Penal, o que não ocorreu na espécie, disse o magistrado ao finalizar seu voto.

O recurso ficou assim ementado:

PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. ART. 334 DO CÓDIGO PENAL. CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ART. 5º, INCISO LXVI. PRISÃO PREVENTIVA. REQUISITOS AUTORIZADORES DO ART. 312, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. FALTA DE ELEMENTOS PARA FUNDAMENTAR A SEGREGAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO. 1. Recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Federal em face de decisão que converteu a prisão em flagrante do recorrido em liberdade provisória, mediante compromisso e fiança, no valor de 05 (cinco) salários mínimos (art. 310, inciso III, do CPP), e comparecimento periódico trimestral em juízo, a fim de justificar suas atividades e proibição de ausentar-se da Comarca de Passos/MG por mais de 05 (cinco) dias, sem autorização judicial. 2. O recorrido foi detido em 05/09/2017, em Pimenta/MG, quando policiais militares abordaram-no na condução de um furgão, onde havia 103 (cento e três) caixas de cigarros importados, sem a respectiva documentação. Ainda, na posse do flagranteado foram encontrados diversos cheques, sendo que alguns deles em valor superior a R$ 9.000,00 (nove mil reais), anotações sobre marcas de cigarros e R$ 1.832,50 (mil reais, oitocentos e trinta e dois e cinquenta centavos) em espécie, dentre outros itens. 3. O juízo a quo decidiu pela conversão da prisão em liberdade provisória ao fundamento de que “a prisão cautelar é medida de exceção, somente se justificando naquelas situações em que ficar demonstrada, concretamente, alguma das hipóteses previstas no art. 312 CPP, o que não é bem o caso dos autos, dos quais se extrai que apesar dos registros criminais juntados, não há qualquer registro de condenação com trânsito em julgado, e, o delito em tela foi praticado sem violência ou grave ameaça”. 4. Estabelece a Constituição Federal, no inciso LXVI do art. 5º, que ninguém será levado à prisão ou nela mantido quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança. No sistema jurídico brasileiro, a liberdade é a regra e a prisão processual é a exceção. Orientando-se pelo texto da Constituição Federal, garantiu o legislador infraconstitucional, por meio da prisão preventiva, a possibilidade de restrição da liberdade locomotora durante o curso da investigação ou do processo criminal, como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. 5. Para a decretação da prisão preventiva é imprescindível a presença dos seus pressupostos, prova de autoria e de materialidade, e de um de seus fundamentos, risco à ordem pública, à instrução ou à aplicação da lei penal. 6. A validade do decreto de prisão cautelar pressupõe que o julgador apoie sua decisão nas circunstâncias fáticas do caso concreto, de modo a evidenciar que a liberdade do paciente pode trazer risco à ordem pública, à ordem econômica, à instrução criminal ou à aplicação da lei penal, nos termos do art. 312 do CPP. Precedentes. 7. Após a vigência da Lei nº 12.403/2011, para a decretação da prisão preventiva, exige-se, além da presença dos requisitos do art. 312 do CPP, que não seja cabível sua substituição por outra medida cautelar, conforme diretriz contida no art. 282, § 6º, CPP. Precedentes. 8. Correta a decisão recorrida diante da falta de justificativa concreta para a convicção de que a soltura do paciente implicará ameaça à garantia da ordem pública ou à aplicação da lei penal. Possível, na hipótese, a concessão da liberdade provisória mediante o estabelecimento de condições legalmente previstas. 9. A presença da materialidade do delito, bem como dos indícios da autoria, não resultam em elementos suficientes para justificar a decretação da prisão preventiva se não estiver demonstrado de forma concreta sua necessidade, fazendo-se necessária a aferição do risco aos bens jurídicos tutelados pelo art. 312, do CPP, atendo-se a elementos concretos, que indiquem ser a conduta do agente efetiva probabilidade de representar perigo à ordem pública, à ordem econômica, à instrução criminal ou à aplicação da Lei Penal, o que não ocorreu na espécie. 10. A Procuradoria Regional da República na 1ª Região manifestou-se pelo desprovimento do recurso. 11. Recurso em sentido estrito a que se nega provimento.

Diante do exposto, a Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso em sentido estrito do MPF nos termos do voto do relator.

Processo nº: 0003860-61.2017.4.01.3811

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