A medida foi considerada desproporcional e inadequada ao caso concreto
– A Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho cassou decisão da 1ª Vara do Trabalho de Itumbiara (GO) que havia determinado a suspensão e a apreensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) de um dos sócios de duas empresas, visando ao pagamento de dívidas trabalhistas. Para o colegiado, a medida não observou os critérios da razoabilidade, da proporcionalidade e da adequação ao caso concreto.
Risco de vida
O sócio prejudicado impetrou mandado de segurança, no Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (GO), contra a decisão que, na fase de execução definitiva de reclamação trabalhista movida contra as empresas CPPO Projetos e Construção, havia determinado a suspensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) de seu sócio, como medida coercitiva para assegurar o pagamento da dívida.
Ele argumentava que, após a falência da empresa, não conseguira mais se recolocar no mercado de trabalho e, portanto, não adquirira novos bens, e que a apreensão do documento não iria interferir, concretamente, na sua capacidade financeira para quitação da dívida. Sustentava, ainda, que a medida, além de ofender o direito constitucional de ir e vir, colocava em risco a sua vida, “sobretudo no período crítico, sofrido pela totalidade da população, de pandemia”.
O TRT, porém, entendeu que a apreensão não afeta o direito de locomoção e é medida lícita, após o esgotamento de todas as tentativas de satisfação do débito junto à empresa e aos sócios.
Adequação
O relator do recurso do sócio, ministro Dezena da Silva, explicou que a adoção das medidas atípicas previstas na lei exige que o juiz observe os parâmetros de adequação, razoabilidade e proporcionalidade em relação às causas que sustentam a insolvência da empresa executada. É necessário, assim, que se aponte como a adoção dessa medida extrema pode viabilizar o pagamento do crédito, além de se demonstrar a prática de atos, pelo devedor, capazes de justificar a determinação de suspensão da CNH.
Seria necessário evidenciar, por exemplo, a ostentação de sinais de riqueza ou de padrão elevado de vida incompatíveis com o não pagamento da obrigação, de modo a comprovar que o devedor, embora tendo patrimônio, esteja frustrando deliberadamente a execução. O juiz, porém, não o fez.
Assim, o colegiado entendeu que a suspensão da CNH não se revela medida útil, proporcional e adequada à satisfação da dívida, caracterizando-se como medida abusiva que viola direito líquido e certo do sócio.
O recurso ficou assim ementado:
RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ATO COATOR QUE SUSPENDEU A CHN DO IMPETRANTE. MEDIDA ATÍPICA DE EXECUÇÃO. ART. 139, IV, DO CPC DE 2015. DEMONSTRAÇÃO DA ADEQUAÇÃO, PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE DA MEDIDA NÃO OCORRIDA NO CASO CONCRETO. ABUSIVIDADE DO ATO COATOR. SEGURANÇA CONCEDIDA. PRECEDENTES.
1. Cuida-se de Mandado de Segurança impetrado contra decisão proferida pelo Juízo da 1.ª Vara do Trabalho de Itumbiara que, em fase de execução definitiva nos autos do processo matriz, determinou a suspensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) do Impetrante, com fundamento no art. 139, IV, do CPC de 2015.
2. Cabe assinalar, a princípio, que a mera insolvência do devedor não basta para autorizar o uso de medidas atípicas de execução fundamentadas no art. 139, IV, do CPC de 2015. A jurisprudência desta Corte se firmou no sentido de que a adoção das medidas atípicas previstas no referido dispositivo legal exige a observância, pelo Magistrado, dos parâmetros necessários de adequação, razoabilidade e proporcionalidade da medida consistente na suspensão da CNH do devedor frente às causas que sustentam a insolvência do executado. Em outros dizeres, é necessário que se aponte em que sentido a adoção dessa medida extrema pode viabilizar o pagamento do crédito exequendo, além de se demonstrar a prática de atos, pelo devedor, capazes de justificar a determinação de suspensão da CNH, tais como a ostentação de sinais de riqueza , ou mesmo a adoção de padrão elevado de vida , incompatíveis com o inadimplemento da obrigação constituída no título executivo judicial, de modo a comprovar que o devedor, embora possuindo patrimônio, esteja frustrando deliberadamente a execução.
3. No caso vertente, a Autoridade Coatora não faz menção alguma nesse sentido, isto é, não há, no Ato Coator, a apreciação da questão sob a perspectiva de sua razoabilidade, proporcionalidade e adequação ao caso concreto, tampouco menção à suposta prática de ocultação de patrimônio por parte do devedor.
4. É dizer, assim, que, para o caso concreto, a suspensão da CNH não se revela medida útil, proporcional e adequada à satisfação do crédito exequendo, caracterizando-se, por conseguinte, como medida abusiva a violar direito líquido e certo do Impetrante, impondo, por conseguinte, a concessão da ordem de segurança. Precedentes desta e. SBDI-2.
5. Recurso Ordinário conhecido e provido.
A decisão foi unânime.
Processo: ROT-10342-49.2020.5.18.0000