STF valida suspensões de cláusulas coletivas de trabalho sobre jornada de motoristas de carga

Por 6 votos a 5, Plenário entendeu que as decisões da Justiça do Trabalho examinaram casos concretos, sem invalidar cláusulas pactuadas.

O Supremo Tribunal Federal (STF) manteve a validade de decisões da Justiça do Trabalho que suspenderam cláusulas de acordos e convenções coletivas de trabalho, pactuadas entre transportadoras de carga e motoristas, que estabeleciam que a categoria não estava sujeita ao controle de jornada antes da vigência da Lei 12.619/2012. Por maioria de votos, o colegiado julgou improcedente a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 381, ajuizada pela Confederação Nacional dos Transportes (CNT).

Meios tecnológicos

As decisões questionadas pela CNT levaram em conta que a existência de meios tecnológicos de controle da jornada afastaria a aplicação automática da norma ​geral do artigo 62, inciso I, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)​, que dispensa do controle das oito horas diárias de trabalho profissionais que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário. Com isso, as transportadoras foram condenadas ao pagamento de horas extras e de trabalho em dias de descanso ocorridos antes da vigência da Lei 12.619/2012, que estabeleceu a jornada de oito horas para a categoria.

Situações concretas

Prevaleceu, no julgamento, o voto divergente da ministra Rosa Weber, proferido na sessão de 26/5, no sentido da improcedência das ações. Segundo a ministra, as decisões da Justiça do Trabalho examinaram situações concretas segundo a norma da CLT, mas concluíram, nos casos específicos, que o controle da jornada de trabalho era viável. A ministra salientou que as decisões não afastaram acordos nem a norma da CLT, apenas consideraram possível o controle de jornada nos casos analisados e, por isso, determinaram o pagamento de horas extras.

Óticas diversas

O julgamento foi retomado nesta quarta-feira (1º) com o voto do ministro Dias Toffoli, que acompanhou a divergência para declarar a improcedência da ação. Para ele, o Supremo não poderia analisar essa controvérsia em bloco, pois as convenções anexadas pela CNT apresentam diferentes redações, e as decisões judiciais também analisam a questão sob óticas diversas, dando margem a diferentes interpretações.

Ele salientou que essas nuances são matéria de prova e não comportam uma resposta geral e abstrata, cabendo às instâncias ordinárias dar uma solução para cada caso concreto. Também votaram pela improcedência a ministra Cármen Lúcia e os ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Ricardo Lewandowski.

Supremacia da negociação

Último a votar, o ministro Luiz Fux, presidente do Tribunal, acompanhou o entendimento do relator, ministro Gilmar Mendes, de que as decisões do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e de Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) seriam inválidas, porque a Constituição Federal assegura a supremacia da negociação coletiva. Segundo Fux, acordos e convenções coletivas de trabalho devem ser respeitados e valer como lei efetiva para reger as relações trabalhistas, desde que negociados por procedimento regular e com a anuência de representantes das categorias.

O ministro lembrou, ainda, que a Constituição permite a supressão de alguns direitos, entre eles a duração do trabalho, por meio da negociação coletiva. Também julgaram procedente a ação os ministros Nunes Marques, André Mendonça e Alexandre de Moraes.

O recurso ficou assim ementado:

ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. DECISÕES EMANADAS DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO E DOS TRIBUNAIS REGIONAIS DO TRABALHO. MOTORISTAS PROFISSIONAIS EMPREGADOS. DURAÇÃO DO TRABALHO ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 12.619/2012. AFASTAMENTO DO CONTROLE DO HORÁRIO DE TRABALHO POR MEIO DE NEGOCIAÇÃO COLETIVA. INADMISSIBILIDADE. CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE HORAS EXTRAS E HORAS TRABALHADAS EM DIAS DE REPOUSO. ACORDOS E CONVENÇÕES COLETIVAS DO TRABALHO. LIMITES CONSTITUCIONAIS À AUTONOMIA NEGOCIAL COLETIVA. GARANTIA DO PATAMAR CIVILIZATÓRIO MÍNIMO. 1. ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO AJUIZADA CONTRA DECISÕES JUDICIAIS DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO E DE TRIBUNAIS REGIONAIS DO TRABALHO NAS QUAIS RECONHECIDO A MOTORISTAS DO TRANSPORTE RODOVIÁRIO DE CARGAS O DIREITO A HORAS EXTRAORDINÁRIAS E AO PAGAMENTO PELO TRABALHO EM DIAS DE DESCANSO ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI 12.619/2012, A DESPEITO DE PREVISTA, QUANTO A ELES, EM CONVENÇÕES COLETIVAS DE TRABALHO, A APLICAÇÃO DO ART. 62, I, DA CLT, EM RAZÃO DA IMPOSSIBILIDADE DE CONTROLE DA JORNADA. 2. COMPREENSÃO DA MAIORIA DOS MINISTROS NO SENTIDO DO CABIMENTO DA ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO, DIANTE DA RELEVÂNCIA CONSTITUCIONAL DA CONTROVÉRSIA E DA EXISTÊNCIA DE QUADRO DE INSEGURANÇA JURÍDICA E ECONÔMICA DECORRENTE DA DIVERGÊNCIA DE DECISÕES ENTRE TRIBUNAIS. VENCIDA, NO PONTO, A CORRENTE MINORITÁRIA, INAUGURADA PELA MINISTRA RELATORA, QUANTO AO NÃO CONHECIMENTO DA ADPF, POR ENVOLVER A SUBSUNÇÃO DAS CLÁUSULAS COLETIVAS A CASOS CONCRETOS, SEM QUE CONFIGURADO CONFLITO EM RELAÇÃO A NORMAS HETERÔNOMAS TRABALHISTAS. 3. REAFIRMAÇÃO DA DIRETRIZ ASSENTADA NO JULGAMENTO DO TEMA Nº 152 DA REPERCUSSÃO GERAL (RE 590.415, REL. MIN. ROBERTO BARROSO), QUANTO À PREVALÊNCIA DAS NORMAS COLETIVAS DO TRABALHO SOBRE O PADRÃO GERAL HETERÔNOMO JUSTRABALHISTA, NOTADAMENTE EM FACE DE AUTORIZAÇÃO CONSTITUCIONAL EXPRESSA (CF, ARTS. 7º, VI, XIII E XIV), DESDE QUE ASSEGURADA A PRESERVAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS DE ABSOLUTA INDISPONIBILIDADE, CORRESPONDENTES AO PATAMAR CIVILIZATÓRIO MÍNIMO ASSEGURADO PELO TEXTO CONSTITUCIONAL, TAL COMO OCORRE EM RELAÇÃO ÀS HORAS EXTRAS E AO REPOUSO SEMANAL REMUNERADO (CF, ART. 7º, XV E XVI), ENTRE OUTROS. 4. INOCORRÊNCIA, NO CASO, SEGUNDO OS VOTOS DA MAIORIA, DE SITUAÇÃO DE RECUSA DOS ÓRGÃOS DA JUSTIÇA DO TRABALHO EM RECONHECER A VALIDADE DOS CONTRATOS COLETIVOS DE TRABALHO. DECISÕES QUE APENAS RECONHECEM NÃO INCIDIR, EM RELAÇÃO AOS MOTORISTAS PROFISSIONAIS EMPREGADOS, A NORMA INSCRITA NO ART. 62, I, DA CLT, DIANTE DA CONSTATAÇÃO, IN CONCRETO, DA EXISTÊNCIA DE MEIOS IDÔNEOS AO CONTROLE DA DURAÇÃO DIÁRIA DE TRABALHO REALIZADA POR ESSA CATEGORIA ESPECÍFICA DE TRABALHADORES. 5. ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO CONHECIDA E JULGADO IMPROCEDENTE O PEDIDO.

Leia mais:

Jornada de motoristas de carga: julgamento sobre validade de decisões trabalhistas prossegue na próxima sessão

 

Deixe uma resposta

Iniciar conversa
Precisa de ajuda?
Olá, como posso ajudar