Servidor com especialização de interesse do órgão e de relação direta com o cargo ocupado tem direito ao adicional de qualificação

Uma servidora do Ministério Público da União (MPU) garantiu o direito de voltar a receber o adicional de qualificação ao concluir o curso de pós-graduação. A decisão é da 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) que confirmou a sentença da 6ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal.

O adicional de qualificação foi criado pela Lei nº 11.415, de 2006. Desde janeiro de 2007, a autora teve o benefício implementado em sua folha de pagamento em razão de comprovar conclusão de pós-graduação em Administração Hospitalar. Após análise entre o conteúdo do curso e as atribuições do cargo da servidora, a Secretária de Gestão de Pessoas do MPU e a Coordenação de Pagamento do ente público suspenderam o recebimento do adicional e exigiram a devolução dos valores já recebidos.

No 1º grau, a requerente alegou que não teve direito ao devido processo legal e que não seriam devidos os descontos de valores pagos por erro da administração e recebidos de boa-fé pelo servidor. Também atestou que além de disciplinas específicas, o curso abordou temas de Teoria Geral da Administração, Administração de Recursos Humanos, Contabilidade Geral, dentre outros.

Na apelação do TRF1, a União argumentou que, nos casos em que o curso de especialização não tem correspondência com as atividades desempenhadas pelo servidor, inexiste interesse público que sustente a concessão do referido adicional. E como o certificado de pós-graduação da servidora é em Administração Hospitalar, não há relação com as atribuições do cargo de analista administrativo.

Em seu voto, a relatora, juíza federal convocada Olívia Mérlin Silva, enfatizou que “a jurisprudência do TRF1 tem firmado a possibilidade de regulamentação da lei, amparando a interpretação no sentido de que o interesse público deve ser preservado, exigindo-se a correlação entre o curso e o cargo exercido”.

Contudo, para a magistrada, a interpretação não pode ser restrita, especialmente no caso de cargos de analista administrativo que sequer exigiram formação de nível superior em uma carreira específica. “Não há como se concluir, na hipótese em concreto, que o curso feito não possui qualquer relação com a área administrativa. Não se pode desprezar que se trata de um curso na área de Administração, cujo conteúdo engloba disciplinas como Teoria Geral da Administração e Administração de Recursos Humanos, contribuindo para o aprimoramento técnico e o bom desempenho das funções executadas no cargo ocupado”, afirmou.

A decisão unânime do Colegiado manteve o adicional e condenou a União ao pagamento das parcelas suprimidas a partir do ajuizamento da ação, devidamente corrigidas e acrescidas dos juros moratórios, observando-se o Manual de Cálculos da Justiça Federal.

O recurso ficou assim ementado:

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO. ANALISTA ADMINISTRATIVO DO MPU. ADICIONAL DE QUALIFICAÇÃO. LEI 11.415/2006. PORTARIA PGR/MPU 289/2007. CURSO NA ÁREA DE ADMINISTRAÇÃO. ESTUDO DE MATÉRIAS COM CONTEÚDO SEMELHANTE ÀQUELE EXIGIDO NO EDITAL PARA EXERCÍCIO DAS FUNÇÕES DE ANALISTA ADMINISTRATIVO. CORRELAÇÃO ENTRE O CURSO E AS ATRIBUIÇÕES DO CARGO ESTABELECIDA. DIREITO À PERCEPÇÃO DAS PARCELAS DEVIDAS DESDE A IMPETRAÇÃO. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE.

  1. Discute-se o direito líquido e certo da impetrante, Analista Administrativo do Ministério Público Federal de continuar percebendo o adicional de qualificação instituído pela Lei nº 11.415/2006 que foi implementado em sua folha desde 01.01.2007 em razão da comprovação de conclusão do curso de pós-graduação em “Administração Hospitalar”.

  2. Esta Primeira Turma tem firmado em seus precedentes o entendimento de que o adicional de qualificação previsto na Lei é devido aos servidores que possuam certificado de especialização e que a formação acadêmica seja do interesse do órgão e tenha relação direta com as atribuições do cargo efetivo ocupado pelo Servidor. (AC 0023503-84.2011.4.01.3400, DESEMBARGADORA FEDERAL GILDA SIGMARINGA SEIXAS, TRF1 – PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 01/03/2018; AMS 0025596-25.2008.4.01.3400, DESEMBARGADOR FEDERAL JAMIL ROSA DE JESUS OLIVEIRA, TRF1 – PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 24/03/2015 PAG 422)

  3. Conforme já assentou a Corte Regional: “Uma interpretação razoável dos dispositivos atinentes à matéria se faz necessária. Não se deve visar normatividade tão restrita que inviabilize a percepção da vantagem, nem fixar regra tão elástica que desvirtue a intenção primária da lei instituidora, qual seja, a qualificação profissional do servidor para uma melhor prestação do serviço público.” (AMS 0025512-24.2008.4.01.3400/DF, Rel. Desembargador Federal Kassio Nunes Marques, Primeira Turma, e-DJF1 p.762 de 02/07/2013).

  4. Não há como se concluir na hipótese em concreto que o curso feito não possui qualquer relação com a área administrativa. Ainda que se compreenda que a impetrante não empregue todos os conhecimentos do curso em benefício do serviço, visto que é voltado à gestão em campo diverso daquele em que é desempenhado o seu trabalho no Ministério Público, não se pode desprezar que se trata de um curso na área de administração, cujo conteúdo engloba disciplinas como Teoria Geral da Administração e Administração de Recursos Humanos, contribuindo para o aprimoramento técnico e bom desempenho das funções executadas no cargo ocupado.

  5. Quanto à condenação ao pagamento das parcelas suprimidas a contar do ajuizamento do mandado de segurança, estas certamente são devidas como um corolário lógico da concessão da segurança. Ainda que a medida liminar concedida tenha se limitado a impossibilitar os descontos até que fosse assegurado o contraditório no âmbito do processo administrativo, o que depois se revelou ter acontecido, a sentença reconheceu o direito líquido e certo e a ilegalidade do ato administrativo que suprimiu o pagamento do adicional de qualificação. A nulidade do ato importa em sua ineficácia. O pagamento das parcelas é devido pela Administração, limitado ao momento da impetração.

  6. Apelação da União e remessa necessária desprovidas.

  7. Apelação da Impetrante provida para acrescer à sentença a condenação ao pagamento das parcelas do adicional de qualificação suprimidas a partir do ajuizamento da ação, devidamente corrigidas e acrescidas dos juros moratórios, observando-se o Manual de Cálculos da Justiça Federal.

Processo nº: 0010939-10.2010.4.01.3400

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