A pauta do Superior Tribunal de Justiça (STJ) para o ano forense de 2021 inclui diversos temas repetitivos, cujo julgamento afetará a tramitação de ações distribuídas por todo o país e terá impacto na vida de milhões de brasileiros. Além das novas controvérsias afetadas para o rito dos recursos repetitivos e dos julgamentos já iniciados, outros três temas foram selecionados para revisão de tese.
Confira a seguir o que está previsto para análise nos órgãos julgadores do tribunal durante o primeiro semestre deste ano judiciário, que começa nesta segunda-feira (1º).
Plano de saúde
Entre os destaques da pauta dos repetitivos, estão processos que envolvem o direito do consumidor na área da saúde – todos em tramitação na Segunda Seção. O tema mais recente é o 1.069, que versa sobre a obrigatoriedade de custeio, pelos planos de saúde, de cirurgia plástica em paciente submetido a cirurgia bariátrica. O relator é o ministro Villas Bôas Cueva (REsp 1.870.834 e outro).
No acórdão de afetação, o ministro destacou que a jurisprudência do STJ se encontra “de certo modo uniformizada” no sentido de considerar ilegítima a recusa de cobertura para plástica em segurado que passou por bariátrica, caso haja expressa orientação médica.
No Tema 1.067, será definido se as operadoras de saúde são obrigadas a arcar com o tratamento de fertilização in vitro. Segundo o relator da controvérsia (REsp 1.822.420 e outros), ministro Marco Buzzi, o tribunal vem adotando o entendimento de que as seguradoras não têm o dever de custear o procedimento, salvo previsão contratual.
Ainda de acordo com o ministro, o Núcleo de Gerenciamento de Precedentes (Nugep) informa que há 83 processos relacionados ao tema na seção de direito privado. “A presente discussão já foi apreciada pelos órgãos colegiados componentes da Segunda Seção em outras 270 lides”, acrescentou Buzzi na decisão de afetação.
Previdência
Na Primeira Seção, o direito previdenciário integra o rol de matérias sob o rito dos repetitivos. Um dos destaques é o Tema 979, que já começou a ser julgado. A relatoria é do ministro Benedito Gonçalves.
O debate diz respeito à devolução de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da administração da Previdência Social. Benedito Gonçalves está com o recurso especial (REsp 1.381.734) para ajustes no voto antes de o colegiado fixar a tese.
Também no ramo previdenciário, está na pauta da seção de direito público o Tema 862, em que será delimitado o termo inicial do auxílio-acidente decorrente do término do auxílio-doença. A relatora é a ministra Assusete Magalhães (REsp 1.729.555 e outro).
Os dois casos foram selecionados como representativos de controvérsia pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP). Os recorrentes requerem o recebimento de auxílio-acidente desde a data da cessação do auxílio-doença acidentário, defendendo, assim, a reforma do entendimento do TJSP, que estabeleceu como termo inicial do benefício a data da citação.
Tribunal do júri
A Terceira Seção afetou para julgamento no rito dos repetitivos o Tema 1.063, no qual está em discussão se a competência para desclassificar o crime de homicídio doloso imputado a motorista embriagado é exclusiva do tribunal do júri. A matéria tem a relatoria da ministra Laurita Vaz.
O recurso especial (REsp 1.863.084) em tramitação no colegiado foi interposto pelo Ministério Público de Goiás (MPGO) após o Tribunal de Justiça goiano desclassificar o crime de homicídio doloso para culposo no caso de um homem acusado de atropelar duas pessoas. Para o MPGO, a decisão da corte estadual usurpou a competência do tribunal do júri, que seria o único responsável por determinar ou não a desclassificação do delito.
IAC
Em 2021, além dos repetitivos, o STJ deve julgar cinco Incidentes de Assunção de Competência (IACs). No segundo semestre do ano passado, dois novos incidentes foram admitidos pela Primeira Seção. Ambos têm como relatora a ministra Regina Helena Costa.
No IAC 9, o colegiado vai dirimir controvérsia (REsp 1.834.896) em torno da exigência de exame toxicológico de larga janela de detecção para a renovação da Carteira Nacional de Habilitação de motoristas autônomos de transporte coletivo escolar.
No acórdão que admitiu o incidente, Regina Helena Costa afirmou que a matéria possui expressiva relevância jurídica, econômica e social, pois abrange tanto a “segurança de crianças e adolescentes” quanto o “significativo impacto financeiro” para condutores do transporte escolar e laboratórios de exame toxicológico.
Outro IAC em pauta é o de número 2, cujo julgamento na Segunda Seção está suspenso por pedido de vista do ministro Marco Buzzi.
Sob a relatoria do ministro Luis Felipe Salomão, o processo (REsp 1.303.374) vai definir se o prazo anual de prescrição se aplica a todas as pretensões atinentes a segurado e segurador – e não apenas às ações indenizatórias. Em seu voto, Salomão conheceu parcialmente do recurso, dando-lhe provimento.
Linha Amarela
Na Corte Especial, os ministros devem dar continuidade ao julgamento de recursos contra a decisão do presidente do STJ, ministro Humberto Martins, que autorizou a prefeitura do Rio de Janeiro a retomar a administração da Linha Amarela. Um pedido de vista do ministro João Otávio de Noronha interrompeu a apreciação do caso.
Na primeira sessão de julgamento da Suspensão de Liminar e de Sentença 2.792, Humberto Martins, relator da matéria, votou a favor da pretensão do município e contra os interesses da concessionária. O presidente do STJ concluiu que a prorrogação do contrato por longo período caracteriza uma espécie de monopólio privado, efetivado por meio de questionáveis aditivos em uma concessão que teve início em 1994.
“Um contrato que quebra as regras do edital, perpetuando-se no tempo; um contrato em que foi retirado todo o risco à empresa concessionária; um contrato em que a empresa se recusa a prestar contas; um contrato de inacreditável Taxa Interna de Retorno; esse contrato, sim, representa ameaça à segurança contratual”, enfatizou Martins em sua decisão.
Investigações
Ainda na Corte Especial, há expectativa quanto aos desdobramentos de procedimentos investigativos com repercussão no cenário político nacional.
Entre os destaques, estão as denúncias oferecidas pelo Ministério Público Federal contra o governador afastado do Rio de Janeiro, Wilson Witzel; o presidente do Partido Social Cristão (PSC), Everaldo Dias Pereira – o Pastor Everaldo –, e outros integrantes de suposta organização criminosa acusada de desviar recursos e receber propinas no governo fluminense, inclusive no âmbito da rede estadual de saúde.
O ministro Benedito Gonçalves é o relator das investigações, que correm sob segredo de Justiça. Em 2020, a Corte Especial confirmou uma série de medidas coercitivas decretadas pelo ministro relator, a exemplo do afastamento do governador Wilson Witzel e da prisão preventiva do Pastor Everaldo.
Outra frente investigativa que deve movimentar a Corte ao longo deste ano é a Operação Faroeste, que apura esquema de venda de decisões judiciais relativas à grilagem de terras no oeste baiano. O ministro Og Fernandes é o relator do caso, no qual já foram denunciados cinco desembargadores e três juízes do Tribunal de Justiça da Bahia, levando à abertura da Ação Penal 940.
Empréstimo compulsório
Nas seções especializadas do tribunal, um dos destaques da pauta é a perspectiva de retomada da análise dos embargos de declaração da Eletrobras contra a decisão que determinou que a estatal deve arcar com juros de 6% sobre valores de empréstimo compulsório não convertidos em ações, até a data do efetivo pagamento aos consumidores (EAREsp 790.288).
Até o momento, há quatro votos a favor dos embargos e três contrários – incluindo o voto do ministro relator, Gurgel de Faria. O julgamento na Primeira Seção foi interrompido por pedido de vista da ministra Assusete Magalhães.
Efeito estufa
Também está na pauta da seção de direito público o mandado de segurança impetrado pela Associação das Distribuidoras de Combustíveis contra a Resolução 8/2020 do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), que estabeleceu, até 2030, as metas compulsórias anuais de redução de gases do efeito estufa para a venda de combustíveis no país. O pedido de liminar foi rejeitado pelo relator do Mandado de Segurança 27.093, ministro Gurgel de Faria.
De acordo com o ministro, as metas já eram conhecidas pelos distribuidores de combustível desde 2018, nos termos da Resolução 5/2018 do CNPE. O relator lembrou que a nova meta fixada para o ano passado já reduz em 50% o patamar anterior, em razão da Covid-19.
Pacote Anticrime
A interpretação de novidades trazidas pela Lei 13.964/2019 é objeto de processos em curso na Terceira Seção. Com pedido de vista do ministro Joel Ilan Paciornik, o RHC 131.263 debate a possibilidade de conversão da prisão em flagrante em preventiva ou a sua decretação de ofício durante o curso de investigação ou de ação penal.
De relatoria do ministro Sebastião Reis Júnior, o caso em discussão envolve um acusado pelo crime de tráfico de drogas detido por determinação judicial sem que tenham sido ouvidos, antes, o Ministério Público ou a defesa. A Defensoria Pública de Goiás alega que as alterações legais promovidas pelo chamado Pacote Anticrime condicionam a prisão preventiva à prévia manifestação do MP ou da autoridade policial.
No HC 596.340, a seção de direito penal vai resolver sobre a retroatividade dos acordos de não persecução penal, inovação do Pacote Anticrime. O habeas corpus foi impetrado pela defesa de um réu denunciado pela prática do crime de furto qualificado, que confessou o delito, mas teve negado o pedido para negociar um acordo após parecer contrário do Ministério Público do Tocantins. Em liminar, o relator, ministro Rogerio Schietti Cruz, suspendeu a ação penal até o julgamento definitivo do habeas corpus.
Mais investigações
Nas turmas, o início do ano deve ser marcado também por processos criminais examinados em caráter urgente pela presidência do STJ durante o período de recesso forense e de férias coletivas dos ministros. É o caso do HC 636.740, em que o presidente do tribunal, ministro Humberto Martins, deferiu liminar para substituir por prisão domiciliar a preventiva decretada contra o então prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella.
O agora ex-prefeito e outras pessoas são investigadas em operação que apura a existência de um esquema de pagamento de propinas na prefeitura carioca. O relator da matéria é o ministro Antonio Saldanha Palheiro, da Sexta Turma.
No colegiado, outro feito que deve ter o mérito julgado é o HC 632.489, no âmbito do qual o ministro relator, Nefi Cordeiro, suspendeu a ação penal contra o padre Robson de Oliveira Pereira. Ele responde pelos crimes de apropriação indébita e lavagem de capitais supostamente praticados por organização criminosa que teria desviado recursos doados por fiéis à Associação Filhos do Pai Eterno, em Trindade (GO).
Ainda nas turmas
Na Terceira Turma, há a expectativa do exame de um recurso (AREsp 1.732.782) do presidente Jair Bolsonaro contra acórdão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro que o condenou a pagar R$ 150 mil a título de danos morais coletivos – com juros e correção monetária – por declarações homofóbicas proferidas em um programa televisivo, em 2011, quando era deputado federal. A relatoria do agravo é do ministro Villas Bôas Cueva.
Também no direito privado, a Quarta Turma deve prosseguir com o julgamento do recurso especial (REsp 1.081.149) que trata da incidência ou não da taxa Selic no caso de dívidas civis derivadas de danos contratuais e extracontratuais. O processo, cujo relator é o ministro Luis Felipe Salomão, tem como pano de fundo um caso de inscrição indevida em cadastro de inadimplentes.
Na área do direito público, um dos destaques é o REsp 1.361.388, oriundo de ação popular movida contra a Federação Nacional das Empresas de Seguros Privados e de Capitalização (Fenaseg) e mais 64 seguradoras privadas, em razão da sistemática adotada para o repasse das verbas do prêmio do DPVAT entre 1988 e 1998 – o que teria gerado um prejuízo inicial de R$ 45 milhões.
A União recorre contra a declaração de prescrição, com base no artigo 21 da Lei da Ação Popular (Lei 4.717/1965), por considerar que a ação de ressarcimento ao erário é imprescritível. O ministro Og Fernandes é o relator da matéria. Ele votou para negar provimento ao recurso, cuja análise foi suspensa por pedido de vista do ministro Herman Benjamin.
O ministro Herman Benjamin é o relator de um caso de disputa de terras em Santa Catarina, na reserva indígena Toldo Pinhal, da etnia Kaingang (REsp 1.586.943).
A Fundação Nacional do Índio (Funai) recorreu contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) que anulou portaria do Ministério da Justiça, de 2007, a qual havia determinado a ampliação da área indígena. Para o TRF4, não foram comprovadas nem a posse da terra à época da promulgação da Constituição Federal de 1988 nem a tradicionalidade da ocupação indígena em período remoto.
Videoconferência
Os julgamentos por videoconferência na Corte Especial, nas seções e nas turmas do tribunal foram prorrogados até 26 de fevereiro, nos termos da Resolução STJ/GP 27/2020. As sessões ordinárias e extraordinárias em ambiente virtual foram implementadas em abril passado, como uma das medidas de enfrentamento da Covid-19.
As ações de prevenção do novo coronavírus são reavaliadas regularmente pela presidência do STJ, com base na evolução da pandemia e nas informações prestadas pelas autoridades sanitárias.
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Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):
APn 940
AREsp 1732782
EAREsp 790288
HC 596340
HC 632489
HC 636740
MS 27093
REsp 1081149
REsp 1303374
REsp 1361388
REsp 1381734
REsp 1729555
REsp 1822420
REsp 1834896
REsp 1863084
REsp 1870834
RHC 131263
SLS 2792
REsp 1586943