McDonald’s deve indenizar cliente por assalto à mão armada em drive-thru

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu nesta terça-feira (18) que a rede de fast-food McDonald’s tem responsabilidade pelos danos sofridos por consumidor que foi vítima de assalto à mão armada no momento em que comprava produtos no drive-thru do restaurante. Com a decisão, o colegiado manteve indenização por danos morais fixada em R$ 14 mil pela Justiça de São Paulo.

“No caso dos autos, configurada efetivamente a falha do serviço, não parece razoável – apenas por não se tratar de estacionamento propriamente dito, mas de local em que o cliente parqueia o seu automóvel, em um estreito corredor, muitas vezes ficando encurralado aguardando atendimento, inclusive tarde da noite –, afastar a responsabilidade do fornecedor”, apontou o relator do recurso especial, ministro Luis Felipe Salomão.

O sistema drive-thru é aquele em que o cliente é atendido sem sair do carro, normalmente disponível em restaurantes ou lanchonetes do tipo fast-food.

De acordo com o processo, enquanto comprava um lanche na cabine do drive-thru de uma loja McDonald’s no bairro de Moema, na capital paulista, o cliente foi abordado por um homem armado, que roubou sua carteira e a chave do veículo. Segundo a vítima, durante a abordagem do assaltante, nenhum dos funcionários do restaurante teria tentado ajudá-lo.

Serviço defeituoso  

Em primeira instância, o juiz condenou o McDonald’s a indenizar o cliente por danos morais no valor de R$14 mil. O magistrado aplicou o Código de Defesa do Consumidor e enfatizou o caráter defeituoso do serviço que não fornece ao consumidor a segurança por ele esperada. A sentença foi mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo.

Por meio de recurso especial, a Arcos Dourados Comércio de Alimentos Ltda. – operadora de restaurantes próprios e franqueadora da marca McDonald’s – alegou que não tem o dever legal de manter segurança armada em seus estabelecimentos, tampouco de evitar que ações criminosas ocorram nos locais onde a rede atua. Segundo o McDonald’s, o roubo à mão armada não constitui um risco inerente às suas atividades, de forma que não seria possível prever a ocorrência do crime.

O ministro Luis Felipe Salomão destacou inicialmente que o roubo com uso de arma de fogo é fato de terceiro equiparável à força maior, apto a excluir, como regra, o dever de indenizar, por ser evento “inevitável e irresistível, acarretando uma impossibilidade quase absoluta de não ocorrência do dano”.

No entanto, o relator observou que, em diversas situações, o STJ reconhece a obrigação de indenizar, a exemplo de delitos no âmbito das atividades bancárias, em estacionamentos pagos ou mesmo em estacionamentos gratuitos de shoppings e hipermercados.

Benefícios financeiros

Nesse contexto, Salomão apontou que a rede de restaurantes, ao disponibilizar o serviço de drive-thru aos seus clientes, acabou atraindo para si a obrigação de indenizá-los por eventuais danos causados.

“Isto porque, assim como ocorre nos assaltos em estacionamentos, a recorrente, em troca dos benefícios financeiros indiretos decorrentes desse acréscimo de conforto aos consumidores, assumiu o dever implícito de qualquer relação contratual de lealdade e segurança, como incidência concreta do princípio da confiança”, afirmou o ministro.

O ministro disse que, ao facilitar o atendimento com a abertura de seu balcão para o lado externo da loja, o McDonald’s possibilitou o aumento dos seus próprios lucros com a elevação do dinamismo de sua atividade. Por outro lado, ressaltou, a rede também permitiu que seus clientes fiquem menos protegidos, “salvo se passar a adotar a correspondente vigilância para o serviço, o que parece ser seu dever”.

“Portanto, diante de tais circunstâncias trazidas nos autos, tenho que o serviço disponibilizado foi inadequado e ineficiente, não havendo falar em caso fortuito ou força maior, mas sim fortuito interno, porquanto incidente na proteção dos riscos esperados da atividade empresarial desenvolvida e na frustração da legítima expectativa de segurança do consumidor médio, concretizando-se o nexo de imputação na frustração da confiança a que fora induzido o cliente”, concluiu o ministro.

No voto que foi acompanhado de forma unânime pelo colegiado, Salomão destacou que a configuração de responsabilização da rede de fast-food também advém da própria publicidade veiculada pela empresa, em que há a promessa de segurança aos clientes.

O recurso ficou assim ementado:

RESPONSABILIDADE CIVIL E CONSUMIDOR. RECURSO ESPECIAL. ASSALTO À MÃO ARMADA EM DRIVE-THRU DE ESTABELECIMENTO COMERCIAL. FORTUITO INTERNO. FATO DO SERVIÇO. RELAÇÃO DE CONSUMO. OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR.

1. O drive-thru, em linhas gerais, é a forma de atendimento ou de serviço diferenciado de fornecimento de mercadorias em que o estabelecimento comercial disponibiliza aos seus clientes a opção de aquisição de produtos sem que tenham que sair do automóvel. O consumidor é atendido e servido ao “passar” com o veículo pelo restaurante, mais precisamente em área contígua à loja.

2. Assim como ocorre nos assaltos em estacionamentos, a rede de restaurantes, ao disponibilizar o serviço de drive-thru em troca dos benefícios financeiros indiretos decorrentes desse acréscimo de conforto aos consumidores, assumiu o dever implícito de lealdade e segurança em qualquer relação contratual, como incidência concreta do princípio da confiança (inteligência da Súm. 130 do STJ).

3. Ao estender a sua atividade para a modalidade drive-thru, a lanchonete buscou, no espectro da atividade econômica, aumentar os seus ganhos e proventos, pois, por meio do novo serviço, ampliou o acesso aos seus produtos e serviços, facilitou a compra e venda, aumentou as suas receitas, perfazendo um diferencial competitivo para atrair e fidelizar ainda mais a sua clientela. Por conseguinte, chamou para si o ônus de fornecer a segurança legitimamente esperada em razão dessa nova atividade.

4. De fato, dentro do seu poder de livremente contratar e oferecer diversos tipos de serviços, ao agregar a forma de venda pelo drive-thru ao empreendimento, acabou por incrementar, de alguma forma, o risco à sua atividade, notadamente por instigar os consumidores a efetuar o consumo de seus produtos de dentro do veículo, em área contígua ao estabelecimento, deixando-os, por outro lado, mais expostos e vulneráveis a intercorrências como a dos autos.

5. Aliás, o sistema drive thru não é apenas uma comodidade adicional ou um fator a mais de atração de clientela. É, sim, um elemento essencial de viabilidade da atividade empresarial exercida, sendo o modus operandi do serviço, no qual o cliente, em seu veículo, aguarda por atendimento da empresa.

6. Ademais, configurada a responsabilização da fornecedora em razão da própria publicidade veiculada, em que se constata a promessa de segurança de seus clientes.

7. Na hipótese, diante de tais circunstâncias trazidas aos autos, verifica-se que o serviço disponibilizado foi inadequado e ineficiente, não havendo falar em caso fortuito ou força maior, mas sim em fortuito interno, porquanto incidente na proteção dos riscos esperados da atividade empresarial desenvolvida e na frustração da legítima expectativa de segurança do consumidor-médio, concretizando-se o nexo de imputação na frustração da confiança a que fora induzido o cliente. O fornecedor, por sua vez, pelo que consta dos autos, não demonstrou ter adotado todas as medidas, dentro de seu alcance, para inibir, dificultar ou impedir o ocorrido na área reservada ao circuito drive-thru tampouco comprovou que o evento tenha se dado em outra área sobre a qual não tenha ingerência.

8. Recurso especial não provido.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1450434

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