A 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região negou provimento à apelação de um empresário contra a sentença que o condenou pelo crime previsto no art. 171 do Código Penal (estelionato). O apelante teria manipulado a demissão sem justa causa do empregado, em acordo com ele, para que o empregado pudesse levantar indevidamente o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e cinco parcelas do seguro desemprego. Isso aconteceu quando, na verdade, o que ocorreu foi a demissão a pedido do empregado.
Segundo a relatora do caso, desembargadora federal Maria do Carmo Cardoso, a defesa do apelante requereu a absolvição do empresário argumentando que não foi comprovado nos autos o dolo do acusado, e também que ele não teria recebido nenhuma vantagem decorrente do fato a ele imputado, e, ainda, que ele não sabia que o acordo feito com o empregado era crime.
No entanto, a magistrada, no voto, destacou que, além de a materialidade ter sido devidamente demonstrada nos autos por meio dos documentos apresentados com o inquérito policial, tais como o Termo de Rescisão de Contrato de Trabalho e o Termo de Declarações do acusado em sede policial, no tocante à autoria o próprio réu afirmou a prática delitiva. Ele teria dito ter aceitado realizar a dispensa do empregado, como se a loja efetivamente o tivesse dispensado sem justa causa, de modo a permitir que o empregado sacasse o FGTS e recebesse o seguro desemprego. Também teria acordado com o empregado que ele devolveria ao declarante o valor relativo à multa rescisória de 40% do FGTS. “Desse modo, pode-se conferir o elemento subjetivo do tipo, qual seja, o dolo, com a finalidade de obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita”, salientou a desembargadora federal.
Quanto à alegação de que o apelante desconhecia a proibição da conduta por ele praticada, havendo hipótese de erro de proibição, a magistrada afastou a possibilidade ao considerar as declarações prestadas pelo réu, que confirmavam o conhecimento da lei. “Consoante a jurisprudência desta Terceira Turma, para que fique configurado o erro de proibição sobre a ilicitude do fato é necessário que seja demonstrado que o agente não tinha, de forma alguma, conhecimento ou noção de sua conduta ilícita, proibida pelo Direito Penal. Erra-se quanto ao caráter proibido da conduta ao se acreditar, fundamentadamente, lícita uma ação ilícita. O agente carece do conhecimento potencial da proibição que recai sobre um fato típico e ilícito. Não configurado o erro de proibição no presente caso, não se pode falar em causa de exclusão da culpabilidade. Não assiste razão à tese defendida pelo apelante, portanto”, concluiu.
O recurso ficou assim ementado:
PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIME DE ESTELIONATO MAJORADO. ART. 171, § 3º, DO CÓDIGO PENAL. SAQUE/RECEBIMENTO INDEVIDO DO FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO – FGTS/SEGURO DESEMPREGO. FALSIFICAÇÃO DE TERMO DE RESCISÃO DE CONTRATO DE TRABALHO. OBTENÇÃO DE VANTAGEM ILÍCITA. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO DEMONSTRADOS. DOSIMETRIA ADEQUADA. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.
1. Materialidade, autoria e dolo devidamente demonstrados na sentença.
2. Os valores depositados nas contas do FGTS/seguro desemprego de cada trabalhador, enquanto não sacados na forma da lei, são utilizados para fomentar programas sociais de habitação popular, saneamento básico e infraestrutura urbana (art. 9, § 2º da Lei 8.036/1990), de tal sorte que o indevido levantamento representa prejuízo ao Fundo de Garantia e, em última análise, ao desenvolvimento do país. A legislação específica disciplina quando os saques podem ser feitos.
3. A dosimetria não merece reforma, uma vez que a valoração ocorreu de forma motivada e adequada e as penas fixadas se mostraram razoáveis e suficientes para a repressão do ilícito, revestindo-se, também, de nítido caráter educativo.
4. Apelação a que se nega provimento.
A decisão foi unânime.
Processo 0000775-14.2019.4.01.3806
Curtir isso:
Curtir Carregando...