Impenhorabilidade de bem de família tem de ser alegada antes da assinatura da carta de arrematação, decide STJ

Ao negar provimento ao recurso especial interposto por uma devedora, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou que é incabível a alegação de impenhorabilidade de bem de família após a realização do leilão judicial do imóvel penhorado e o término da execução, caracterizado pela assinatura do auto de arrematação.

O colegiado considerou que, a partir dessa assinatura, surgem os efeitos do ato de expropriação em relação ao devedor e ao arrematante, independentemente do registro no cartório de imóveis, o qual se destina a consumar a transferência da propriedade com efeitos perante terceiros.

No caso dos autos – uma execução de título extrajudicial –, a devedora invocou a proteção ao bem de família, com base na Lei 8.009/1990, cerca de dois meses depois da arrematação de parte de um imóvel de sua propriedade. O Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) negou o pedido, sob o fundamento de que tal alegação deveria ter sido feita antes da arrematação.

Bem leiloado deixa de pertencer ao devedor antes da transferência de propriedade

Ao STJ, a devedora argumentou que, como a carta de arrematação não havia sido registrada na matrícula do imóvel, a execução não teria terminado, de acordo com o artigo 694 do Código de Processo Civil de 1973. Ela também apontou precedentes da corte que teriam admitido a análise da impenhorabilidade do bem de família após a arrematação.

Segundo a ministra Isabel Gallotti, relatora do recurso na Quarta Turma, após a conclusão do leilão, independentemente do registro da carta de arrematação no cartório, o devedor já não pode desconhecer sua condição de desapropriado do imóvel que antes lhe pertencia.

A magistrada explicou que, lavrado e assinado o auto, a arrematação é considerada perfeita, acabada e irretratável, suficiente para a transferência da propriedade do bem, nos termos do artigo 694 do CPC de 1973.

A ministra observou que, no caso analisado, transcorreram cerca de cinco anos entre a penhora e a assinatura do auto de arrematação, sem que a devedora alegasse que o imóvel seria destinado à residência da família – apesar de ela ter recorrido da penhora. \”No caso presente, a execução encontra-se exaurida em relação ao bem arrematado\”, declarou Gallotti.

Precedentes citados não se aplicam ao caso

A relatora afirmou ainda que a decisão do TJGO está alinhada com a jurisprudência do STJ, no sentido de que a impenhorabilidade do bem de família é matéria de ordem pública, que pode ser analisada pelo juiz a qualquer momento – mas apenas antes da assinatura da carta de arrematação do imóvel (AgInt no AREsp 377.850).

Ao manter o acórdão recorrido, a ministra observou que não se aplicam ao caso os precedentes do STJ indicados pela devedora – seja porque não tratam de bem de família, que é regido por lei especial (Lei 8.009/1990), seja porque não examinaram a questão sob o enfoque do artigo 694 do CPC de 1973, fundamento da decisão do TJGO.

O recurso ficou assim ementado:

RECURSO ESPECIAL. BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE. ALEGAÇÃO APÓS LAVRATURA E ASSINATURA DE ARREMATAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. ARTS. 535 CPC/1973. VIOLAÇÃO NÃO CONFIGURADA;

1. Não ofende o art. 535 do CPC/1973 o acórdão que examina, de forma fundamentada, todas as questões submetidas à apreciação judicial, circunstância que afasta a negativa de prestação jurisdicional;

2. A impenhorabilidade do bem de família é matéria de ordem pública e, portanto, pode ser arguida e examinada enquanto integrar o bem integrar patrimônio do devedor, não mais cabendo ser suscitada após a alienação judicial do imóvel e exaurimento da execução, mediante a lavratura e assinatura do auto respectivo. Precedentes;

3. Com a assinatura do auto de arrematação, operam-se plenamente os efeitos do ato de expropriação em relação ao executado e ao arrematante, independentemente de registro imobiliário, o qual se destina a consumar a transferência da propriedade com efeitos em face de terceiros;

4. Recurso especial a que se nega provimento.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1536888

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