Engenheiro consegue anular lotação definitiva que causaria prejuízo à sua estrutura familiar

Contratado em regime de 15 dias embarcado por 21 de folga, ele teria de trabalhar oito horas por dia fora de seu domicílio

A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o exame de um recurso da Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobras) contra a declaração da ilicitude da lotação definitiva de um engenheiro de Brasília (DF) em Macaé (RJ). A Turma fundamentou a decisão na impossibilidade do reexame de fatos e provas que levaram as instâncias anteriores à conclusão de que a mudança resultaria em prejuízo imediato à estrutura familiar do empregado.

Transferência

Na reclamação trabalhista, o engenheiro disse que fazia serviços de prospecção de petróleo em alto mar, em regime de escala de 15 dias embarcado e 21 em terra, quando ficava em Brasília com sua esposa, servidora concursada do Senado Federal. Relatou que, após o nascimento prematuro do primeiro filho, então com um ano e oito meses, a esposa passara por um longo processo depressivo pós-parto.

Durante a segunda gravidez, também de risco, parte de sua seção foi desmobilizada, e ele recebeu ordens de permanecer em Macaé em regime administrativo de oito horas diárias. Na ação, ele pedia a declaração de ilicitude da mudança e sua lotação no escritório da empresa em Brasília.

A Petrobras, em sua defesa, sustentou que tinha sofrido redução do seu quadro funcional e que as atividades desenvolvidas pelo engenheiro têm sua gerência em Macaé, onde seria melhor aproveitado.

Proteção da família

O juízo de primeiro grau e o Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (DF/TO), ao examinar o mérito do pedido e o recurso ordinário, declararam a ilicitude na transferência. Segundo o TRT, embora o contrato de trabalho e a CLT prevejam a possibilidade de alteração do regime de trabalho e de transferência, o caso envolve outros direitos relevantes a serem ponderados.

Na decisão, o TRT observa que, embora a lotação em Brasília possa não ser a ideal, do ponto de vista empresarial, a pretensão da transferência tem menor importância quando confrontada com a proteção à família, à saúde, à maternidade e à infância e com o princípio da dignidade da pessoa humana.

Com isso, declarou ilícita a mudança definitiva para Macaé e facultou à Petrobras aproveitar a força de trabalho do engenheiro da forma que considerar mais conveniente, mediante teletrabalho ou retorno ao regime anterior, desde que não implique a mudança de domicílio.

Questões fáticas

A relatora do recurso de revista da Petrobras, ministra Maria Helena Mallmann, explicou que, ao deferir o pedido do engenheiro, o primeiro e o segundo graus consideraram questões fáticas peculiares, como a comprovação, por depoimentos e atestados, que a esposa precisava de cuidados psicológicos e psiquiátricos.

Além da constatação de que a empresa, com atuação nacional, tem posto de trabalho em Brasília, foi registrado na sentença, cujos fundamentos foram transcritos pelo TRT, que o empregado, admitido como engenheiro de produção, caso continuasse em Macaé, trabalharia na área de orçamento, e não diretamente na exploração de petróleo em águas profundas.

O recurso ficou assim ementado:

AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. COMPETÊNCIA TERRITORIAL . RECLAMAÇÃO AJUIZADA NO DOMÍCILIO DO RECLAMANTE. POSSIBILIDADE.

O disposto no art. 651, § 3º, da CLT deve ser interpretado à luz da garantia constitucional de acesso à justiça (art. 5º, XXXV, da Constituição Federal), do princípio trabalhista da proteção, bem como em observância ao contraditório e a ampla defesa. Nesse sentido, esta Corte Superior firmou o entendimento de que o foro do domicílio do empregado será considerado competente quando lhe for mais favorável do que a regra do art . 651 da CLT e a empresa possuir atuação nacional.

Notoriamente , a Petrobras, ora reclamada, possui atuação em âmbito nacional, com capacidade financeira suficiente para arcar com os custos do processo em qualquer lugar onde as ações trabalhistas são ajuizadas, sem prejuízo do exercício do contraditório e da ampla defesa.

Precedentes.

Agravo a que se nega provimento.

TRANSFERÊNCIA. LICITUDE DA ALTERAÇÃO DO REGIME DE TRABALHO . SÚMULA 126 DO TST.

Na hipótese, a Corte a quo reconheceu a ilegalidade da transferência do reclamante para Macaé-RJ, determinando que ele passe a laborar no escritório da empresa em Brasília. Verifica-se que foram consideradas pela Corte de origem questões fáticas peculiares, a saber: risco grave e irreversível à família, inclusive com prejuízos à saúde desta, especialmente considerando o estado gestacional de sua esposa, além de já terem um filho menor de 2 anos.

Consignou o Regional ter sido comprovado por depoimentos e atestados que a esposa do reclamante precisou de cuidados psicológicos e psiquiátricos , tendo ressaltado que a transferência permanente do Autor para localidade diversa do domicílio de sua família resultaria em prejuízo imediato à sua estrutura familiar.

Constatou-se também que a reclamada, empresa com atuação nacional , possui posto de trabalho em Brasília-DF, no qual o reclamante prestou serviços desde o deferimento da liminar, ficando em contato constante com a equipe de Macaé/RJ.

Na hipótese, portanto, as Instâncias Ordinárias verificaram aspectos que indicavam a necessidade de deferimento do pleito do reclamante, como, por exemplo, a atenção ao direito e princípio constitucional de proteção à instituição da família e à unidade familiar (art. 226 e seguintes da CF).

Diante do contexto fático-probatório delineado, insuscetível de reexame nesta instância extraordinária, nos termos da Súmula nº 126/TST, não se verifica violação direta e literal dos dispositivos legais e constitucionais indicados.

Não prospera o agravo da parte, dadas as questões jurídicas solucionadas na decisão agravada. Em verdade a parte só demonstra o seu descontentamento com o que foi decidido.

Não merece reparos a decisão. Agravo a que se nega provimento

Esse contexto fático-probatório, de acordo com a ministra, não é suscetível de reexame no TST, conforme dispõe a Súmula 126. A decisão foi unânime.

Processo: Ag-AIRR-738-82.2017.5.10.0003

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