Empresa de saneamento indenizará ajudante por ausência de banheiro em via pública

O empregador cometeu um ato ilícito ao não garantir local apropriado para necessidades fisiológicas.

A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a Sanepav Saneamento Ambiental Ltda. ao pagamento de indenização a um ajudante geral de Jundiaí (SP) que realizava a poda de árvores e roça de calçadas sem contar com instalações sanitárias. Para o colegiado, ainda que se trate de trabalho externo, em via pública, o empregador cometeu ato ilícito por omissão ao não garantir ao empregado local apropriado para as suas necessidades fisiológicas.

“Pelo caminho”

O juízo da 2ª Vara do Trabalho de Jundiaí havia deferido indenização no valor de R$ 10 mil. A sentença levou em conta depoimentos que demonstraram que, na ausência de banheiros, os empregados “faziam as necessidades fisiológicas pelo caminho” e tinham de almoçar em praças, ruas e calçadas, pois também não havia lugar adequado para as refeições. Seus pertences ficavam no veículo da empresa que os levava até os locais de trabalho e lá ficava estacionado. Segundo a juíza, os fatos constatados eram potencialmente lesivos aos direitos de personalidade do empregado, “que teve que lidar com as condições precárias de trabalho”.

Via pública

Contudo, o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas/SP) excluiu da condenação o pagamento da indenização, por entender que, diante das características do trabalho, realizado em via pública, sem lugar fixo prestabelecido, seria inviável o fornecimento de sanitários, ainda que fosse do tipo químico. Para o TRT, o ajudante poderia usar  banheiros de restaurantes, lanchonetes, postos de gasolina e outros estabelecimentos, no horário do intervalo.

Dignidade

Prevaleceu, no julgamento do recurso de revista do empregado, o voto do ministro Lelio Bentes Corrêa, no sentido de que a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas constitui direito social constitucionalmente assegurado aos empregados.

Segundo o ministro, ainda que se trate de trabalho externo, a empresa deixou de observar a integralidade da Norma Regulamentadora 24 do Ministério do Trabalho, que trata das condições sanitárias e de conforto nos locais de trabalho. “Esse ato ilícito atinge a dignidade do trabalhador, em razão da humilhação e do constrangimento suportados, ao não dispor de um ambiente adequado aos patamares mínimos de higiene e saúde necessários para que o ser humano execute seu trabalho”, ressaltou.

Indenização

O ministro salientou que, em caso análogo, o TST firmou entendimento de que o não fornecimento de instalações sanitárias pelo empregador configura dano moral indenizável, ainda que o empregado trabalhe em via pública.

O recurso ficou assim ementado:

AGRAVO INTERNO . AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO A ACÓRDÃO PROLATADO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.467/2017 . INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. LABOR EM VIA PÚBLICA. AUSÊNCIA DE FORNECIMENTO DE INSTALAÇÕES SANITÁRIAS. INOBSERVÂNCIA DA NORMA REGULAMENTADORA N.º 24 DO MINISTÉRIO DO TRABALHO. Infirmados os fundamentos expendidos na decisão mediante a qual se negou provimento ao Agravo de Instrumento, dá-se provimento ao Agravo Interno para determinar o processamento do Agravo de Instrumento.

AGRAVO DE INSTRUMENTO . RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO A ACÓRDÃO PROLATADO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.467/2017. SUCESSÃO DE EMPRESAS . INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. LABOR EM VIA PÚBLICA. AUSÊNCIA DE FORNECIMENTO DE INSTALAÇÕES SANITÁRIAS. INOBSERVÂNCIA DA NORMA REGULAMENTADORA N.º 24 DO MINISTÉRIO DO TRABALHO. TRANSCENDÊNCIA SOCIAL DA CAUSA RECONHECIDA . Reconhecida a transcendência social da controvérsia, bem como demonstrada violação dos artigos 1º, III, e 5º, X, da Constituição da República, dá-se provimento ao Agravo de Instrumento a fim de determinar o processamento do Recurso de Revista.

RECURSO DE REVISTA . APELO INTERPOSTO A ACÓRDÃO PROLATADO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.467/2017. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. LABOR EM VIA PÚBLICA. AUSÊNCIA DE FORNECIMENTO DE INSTALAÇÕES SANITÁRIAS. INOBSERVÂNCIA DA NORMA REGULAMENTADORA N.º 24 DO MINISTÉRIO DO TRABALHO. TRANSCENDÊNCIA SOCIAL DA CAUSA RECONHECIDA . 1 . Cinge-se a controvérsia a definir sobre o direito do empregado que labora em via pública, na poda de árvores e roça de calçadas, à indenização por danos morais em razão do não fornecimento instalações sanitárias pelo empregador. 2. Considerando que a inviolabilidade da intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas constitui direito social constitucionalmente assegurado aos empregados, resulta inafastável o reconhecimento da transcendência da causa com relação aos reflexos gerais de natureza social . 3 . No caso dos autos, consoante se infere do quadro fático delineado pelo Tribunal Regional, resulta inequívoco o não fornecimento de instalações sanitárias ao obreiro. Concluiu a Corte de origem que, diante das características do labor do reclamante, realizado em via pública, sem lugar fixo preestabelecido, resulta inviável o fornecimento de sanitários, podendo o autor fazer uso dos banheiros de restaurantes, lanchonetes, postos de gasolina e outros estabelecimentos, no horário do intervalo. 4. Ainda que se cuide de labor externo, em via pública, não há dúvidas de que o empregador cometeu um ato ilícito por omissão ao não garantir ao obreiro local apropriado para as suas necessidades fisiológicas, deixando de observar, portanto, a integralidade da Norma Regulamentadora n.º 24 do Ministério do Trabalho. Tal ato ilícito indubitavelmente atinge a dignidade do trabalhador, em virtude da humilhação e do constrangimento suportados ao não dispor de um ambiente de trabalho adequado aos patamares mínimos de higiene e saúde necessários para que o ser humano execute seu labor. 5. Por ocasião do julgamento de controvérsia similar à dos presentes autos, já se pronunciou a colenda SBDI-I desta Corte superior, em sua composição completa , pela configuração de dano moral indenizável em razão da ausência de fornecimento de instalações sanitárias a empregado que labora em via pública (E-Ag-RR-1152-59.2017.5.09.0019, Relator Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, DEJT de 07/08/2020). 6. Recurso de Revista conhecido e provido.

Processo: RR-12172-73.2017.5.15.0021

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