Aposentado que pagou advogado com mesa de sinuca não terá reembolso de honorários

Um aposentado que precisou entregar uma mesa de sinuca usada para garantir sua defesa em ação de cobrança de dívida – que acabou julgada inexistente – não terá direito ao reembolso dos valores dispendidos com seu advogado. A decisão, em sentença da comarca da Capital, foi mantida no julgamento de apelação pela 1ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, em matéria sob a relatoria do desembargador Luiz Fernando Boller.

Dono de um bar no Monte Verde, região norte de Florianópolis, o aposentado conta que foi surpreendido certo dia com a presença de um oficial de justiça em seu estabelecimento para notificá-lo sobre uma dívida de R$ 58 mil junto a concessionária de serviço de água e saneamento. Lembra que passou mal na ocasião e precisou inclusive ser levado ao hospital para exames do coração. “Nunca devi nada para ninguém”, garantiu.

A ação tramitou com o pedido de cobrança da empresa e, por parte do consumidor, o pleito para declaração da inexistência do débito, devolução em dobro do valor exigido, danos morais e mais o ressarcimento dos gastos com sua defesa. A justiça reconheceu apenas a impropriedade da fatura. Na apelação, o desembargador Boller seguiu o entendimento de 1º Grau, a partir da premissa de que a ação de cobrança ajuizada, inobstante ter sido julgada improcedente, não configura ato ilícito de sua proponente.

Para o relator, não existem nos autos elementos capazes de comprovar violação a direito de personalidade que efetivamente tenha superado o mero dissabor. A cobrança indevida, prosseguiu, por si só não caracteriza dano moral indenizável. O pretendido reembolso do valor gasto com sua defesa foi também rechaçado de pronto pela câmara, baseado em entendimento uníssono do STJ: “os custos decorrentes da contratação de advogados não são indenizáveis, sob pena de atribuir ilicitude a qualquer pretensão questionada judicialmente”.

No caso concreto, aliás, chamou a atenção do relator que o próprio aposentado admitiu não ter pago nenhum valor pecuniário ao seu defensor, mas sim entregue uma mesa de sinuca antiga. “Fato, todavia, não comprovado nos autos, tampouco demonstrado que seu valor realmente seja de R$ 5.815,07”, concluiu. Por conta disso, a câmara decidiu por unanimidade manter a sentença. O aposentado ainda foi condenado ao pagamento dos honorários recursais no percentual de 1% sobre o valor atribuído a causa, exigibilidade suspensa em razão da concessão da justiça gratuita em 2º grau, após comprovar perceber benefício previdenciário de aproximadamente R$ 2.100,00.

O recurso ficou assim ementado:

APELAÇÃO.AÇÃO DE COBRANÇA E RECONVENÇÃO.SUSCITADO INADIMPLEMENTO DE FATURAS RELATIVAS AOS SERVIÇOS DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA E SANEAMENTO BÁSICO.PLEITO RECONVENCIONAL PARA DECLARAR A INEXISTÊNCIA DA DÍVIDA, E CONDENAR A COMPANHIA CATARINENSE DE ÁGUAS E SANEAMENTO NA REPETIÇÃO DO INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAL E MORAL.VEREDICTO DE IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO, E PARCIAL ACOLHIMENTO DA RECONVENÇÃO, DECLARANDO A INEXISTÊNCIA DO DÉBITO.INSURGÊNCIA DO DEMANDADO RECONVINTE.AMBICIONADA REPARAÇÃO POR ALEGADO DANO MORAL, SOB A ALEGAÇÃO DE QUE A LIDE LHE TERIA CAUSADO PREOCUPAÇÕES E SOFRIMENTO.TESE INSUBSISTENTE.INEXISTENTE COMPROVAÇÃO DE VIOLAÇÃO A DIREITO DA PERSONALIDADE QUE EFETIVAMENTE SUPERE O MERO DISSABOR.COBRANÇA INDEVIDA QUE, POR SI SÓ, NÃO CARACTERIZA DANO MORAL INDENIZÁVEL.PROLOGAIS.

“‘A cobrança indevida, via de regra, configura mero dissabor, incapaz de gerar danos morais. Todavia, é possível que os contornos do caso concreto mostrem-se extraordinários, hipótese em que o normal aborrecimento poderá dar lugar a sentimentos de intensa frustração, angústia ou constrangimento. In casu, não logrando êxito a Autora em comprovar que os descontos efetuados em sua conta bancária causaram-lhe transtornos que ultrapassam o mero desconforto ou contratempo, mister afastar a condenação ao pagamento de compensação pecuniária por danos morais’ (Des. Joel Dias Figueira Júnior).” (TJSC, Apelação Cível n. 5000279-86.2019.8.24.0034, de Itapiranga, rel. Des. José Maurício Lisboa, Primeira Câmara de Direito Civil, j. em 10/09/2020).

ALMEJADO REEMBOLSO DE VALOR SUPOSTAMENTE GASTO COM O PAGAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.ASSERÇÃO IMPROFÍCUA.INADMISSIBILIDADE DE INDENIZAR QUANTIA DISPENDIDA COM A CONTRATAÇÃO DE CAUSÍDICA DEFENSORA.AÇÃO DE COBRANÇA AJUIZADA PELA CASAN QUE, INOBSTANTE TENHA SIDO JULGADA IMPROCEDENTE, NÃO CONSUBSTANCIA ATO ILÍCITO.APELANTE QUE, ADEMAIS, ADMITIU NÃO TER PAGO A ADVOGADA COM DINHEIRO, MAS MEDIANTE A DAÇÃO EM PAGAMENTO DE UMA MESA DE SINUCA ANTIGA.FATO, TODAVIA NÃO DEMONSTRADO, TAMPOUCO SEQUER COMPROVADO QUE SEU VALOR REALMENTE SEJA DE R$ 5.815,07, COMO PRETENDIDO. PRECEDENTES.

“Os custos decorrentes da contratação de advogados não são indenizáveis, sob pena de atribuir ilicitude a qualquer pretensão questionada judicialmente. Ademais, a atuação judicial na defesa de interesses das partes é inerente ao exercício regular de direitos constitucionais, como o contraditório, a ampla defesa e o amplo acesso à Justiça” (STJ, Recurso Especial n. 1.837.453/SP, rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, j. em 10/03/2020).

SENTENÇA MANTIDA.RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Apelação n. 0300338-32.2019.8.24.0052.

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