Afastada responsabilidade de concessionária por acidente fatal na Rodovia Ayrton Senna

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que afastou a responsabilidade da concessionária por um acidente fatal ocorrido na Rodovia Ayrton Senna, em São Paulo, próximo à cidade de Itaquaquecetuba. O acidente deixou duas vítimas.

No recurso especial, os pais das vítimas alegavam que a instalação de barreiras entre as pistas poderia ter evitado a tragédia, mas o colegiado seguiu o entendimento do tribunal paulista no sentido de que a causa do acidente não foi a falta de segurança na rodovia administrada pela concessionária, mas a imprudência do condutor de um dos veículos envolvidos.

“Como se viu, a Rodovia Ayrton Senna estava dentro das normas de segurança exigíveis, e o acidente se deu por fatos que não tinham relação com alguma deficiência ou falta de segurança que se pudesse atribuir à concessionária”, apontou o relator do recurso, ministro Marco Aurélio Bellizze.

De acordo com os autos, em fevereiro de 2003, o carro das vítimas foi atingido por outro automóvel que trafegava no sentido contrário e que, após o estouro de um dos pneus, ficou descontrolado e atravessou o canteiro central.

Normas de segurança

Em primeira instância, o magistrado condenou a concessionária ao pagamento de danos materiais, além de danos morais correspondentes a 200 salários mínimos para cada um dos autores da ação.

Entretanto, o TJSP afastou a responsabilidade da concessionária por entender que o acidente foi causado exclusivamente pelo motorista do carro que atravessou o canteiro. Ainda segundo o tribunal paulista, a Rodovia Ayrton Senna é uma das vias mais seguras e modernas do Brasil e está de acordo com as exigências de segurança da Associação Brasileira de Normas Técnicas e do Departamento Nacional de Estradas de Rodagem.

Por meio de recurso especial, os pais das vítimas alegaram, entre outros pontos, que o laudo pericial juntado aos autos demonstrou que a rodovia, no trecho específico onde ocorreu o acidente, não é segura. O laudo também apontou que a instalação de uma barreira de concreto no trecho teria evitado as mortes.

Ainda segundo os pais, a concessionária tinha a obrigação legal de fornecer o máximo de segurança possível na estrada, cuja velocidade é de até 120 km/h, mas não adotou nem mesmo medidas de segurança minimamente satisfatórias.

Outros acidentes

O ministro Marco Aurélio Bellizze destacou que o TJSP, ao afastar a responsabilidade da concessionária, apontou que a instalação de barreiras de proteção nas rodovias deve ser feita com moderação, de acordo com recomendações técnicas. Segundo o tribunal paulista, se a barreira estivesse instalada no local do acidente, o veículo que perdeu o controle poderia ter batido no guard rail e voltado para a mesma pista, atingindo outros veículos, ou até mesmo explodido com a batida.

“Em outras palavras, o que poderia ter parado o veículo, impedindo-o de atravessar o canteiro central e atingido o veículo dos filhos dos autores, poderia também ter causado mais mortes”, afirmou o relator.

O ministro também disse que, conforme apontado pelo TJSP, não seria possível à concessionária tomar precauções contra todas as hipóteses de acidentes decorrentes da má conduta dos usuários da rodovia.

“Com efeito, embora seja desejado por todos, não há possibilidade de que uma rodovia seja absolutamente segura contra todo e qualquer tipo de acidente, sobretudo quando causado por imprudência ou imperícia de motoristas, como ocorrido na espécie”, concluiu o ministro ao manter o julgamento do TJSP.

O recurso ficou assim ementado:

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. RESPONSABILIDADE DA CONCESSIONÁRIA. AUSÊNCIA DE NEXO DE CAUSALIDADE. CULPA EXCLUSIVA DE TERCEIRO RECONHECIDA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. EXCESSO DE VELOCIDADE E IMPRUDÊNCIA DO CONDUTOR DO VEÍCULO. EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE. RODOVIA QUE SE ENCONTRAVA DENTRO DAS NORMAS REGULAMENTARES DE SEGURANÇA DA ABNT E DO DNER. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO FUNDAMENTADA NAS PROVAS COLHIDAS NOS AUTOS, NOTADAMENTE NOS LAUDOS TÉCNICOS JUNTADOS PELA RÉ E NO LAUDO PERICIAL REALIZADO. AUSÊNCIA DE VÍCIOS NO ACÓRDÃO RECORRIDO. INEXISTÊNCIA DE CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE E OMISSÃO. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO CARACTERIZADA. QUESTÕES FÁTICAS DISTINTAS DOS ACÓRDÃOS PARADIGMA E RECORRIDO. RECURSO DESPROVIDO.
1. Nos termos do que proclama a Constituição Federal, em seu art. 37, § 6º, a responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público – concessionárias e permissionárias – por danos causados a terceiros é objetiva, sendo prescindível a demonstração da ocorrência de culpa.
1.1. A configuração de tal responsabilidade, contudo, pode ser afastada em caso de culpa exclusiva da vítima, de terceiro ou, ainda, em caso fortuito ou força maior, tendo em vista que, nessas hipóteses, haverá o rompimento do nexo de causalidade.
2. Na hipótese, o Tribunal de origem, embora tenha reconhecido a responsabilidade objetiva da ré, entendeu, com base no conjunto fático-probatório dos autos, que a causa dos danos não foi a falta de segurança na rodovia, mas, sim, o desgoverno do veículo que atravessou o canteiro central – com 13 (treze) metros de largura – e atingiu o automóvel das vítimas na pista contrária, circunstância que fez romper o nexo de causalidade, afastando-se, assim, a responsabilidade civil da concessionária.
2.1. Ademais, a alegação dos recorrentes de que a instalação de uma barreira de concreto teria evitado a morte das vítimas, o que supostamente caracterizaria a deficiência na segurança da rodovia, foi devidamente afastada pelo Tribunal de origem ao consignar que a instalação desse mecanismo de segurança deve ser feita com moderação, de acordo com as normas técnicas correlatas, porquanto a existência do chamado guard rail em local desnecessário, como na hipótese, embora pudesse ter parado o veículo desgovernado, impedindo-o de atravessar o canteiro central e atingido o automóvel dos filhos dos autores, poderia também ter causado mais mortes no acidente.
2.2. Aliás, por esse motivo é que as normas da ABNT e do DNER, seguidas à risca na Rodovia Ayrton Senna (ao menos no trecho do acidente aqui examinado), conforme reconhecido pelo acórdão recorrido e pela perícia realizada, não determinam a obrigatoriedade de instalação dos guard rails em toda a rodovia, mas apenas em determinados locais onde o perigo é especialmente maior, como, por exemplo, quando há abismos, lagos, rios, dentre outros.
2.3. Embora seja desejado por todos, não há possibilidade de que uma rodovia seja absolutamente segura contra todo e qualquer tipo de acidente, sobretudo quando causado por imprudência ou imperícia dos motoristas, como ocorrido na espécie.
3. Conquanto o Tribunal de Justiça tenha feito referências a notícias extraídas da internet concernentes à qualidade da Rodovia Ayrton Senna, verifica-se que o acórdão recorrido está integralmente fundamentado nas provas colhidas nos autos, notadamente na análise dos laudos juntados pela DERSA, dos documentos emitidos pela Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo e do laudo pericial.
4. Não há que se falar em obscuridade, contradição ou omissão no acórdão recorrido, razão pela qual não se verifica a apontada violação do art. 535 do CPC⁄1973.
5. A divergência jurisprudencial não ficou devidamente caracterizada, tendo em vista a manifesta ausência de similitude fática entre os acórdãos paradigma e recorrido.
6. Recurso especial desprovido.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1762224

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