Pedido de vista suspende julgamento de extradição do coronel Manuel Cordero

O ministro Cezar Peluso pediu vista dos pedidos de extradição (Ext 974 e Ext 1079) feitos pelos governos da Argentina e Uruguai, respectivamente, do coronel aposentado do Exército uruguaio Manuel Cordero Piacentini, acusado de participar de seqüestros, torturas, desaparições e assassinatos durante a Operação Condor.

Pedido de vista do ministro Cezar Peluso interrompeu, na tarde desta quinta-feira (11), o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF) de dois pedidos de extradição do major uruguaio Manuel Juan Cordeiro Piacentini. O militar é acusado de ter participado da Operação Condor, que teria se formado nos anos 70 para reprimir a oposição aos regimes militares que estavam no poder em vários países da América do Sul.

Tanto a Argentina, na Extradição (EXT) 974, quanto o Uruguai, por meio da Extradição 1079, argumentam que Piacentini teria participado, entre outros delitos, do “desaparecimento forçado” do cidadão argentino Adalberto Valdemar Soba Fernandes, acontecido em 1976.

Preferência

O relator dos processos, ministro Marco Aurélio, declarou prejudicado o pedido do Uruguai, lembrando que o artigo 79 da Lei 6.815/80 determina que, quando dois países pedem a extradição de uma mesma pessoa pelos mesmos fatos, “terá preferência o pedido daquele em cujo território a infração foi cometida”.

Formação de quadrilha

O ministro passou a analisar então, o pedido da Argentina. Marco Aurélio ressaltou inicialmente que o crime de formação de quadrilha imputado ao militar por um crime cometido há mais de 32 anos, cuja pena no Brasil pode atingir até 6 anos e na Argentina 10, já estaria prescrito, tanto na legislação penal brasileira (em 12 anos) quanto argentina (em 15 anos).

Homicídio

Quanto ao desaparecimento de Adalberto Fernandes, o relator disse entender que não pode se considerar o fato como um crime de seqüestro. Entende-se por desaparecimento forçado, explicou o ministro, quando o crime é praticado por grupos que atuem com autorização ou consentimento do Estado, que deixa de informar o paradeiro da pessoa. Embora o Brasil ainda não tenha assinado a Convenção Interamericana sobre Desaparecimento Forçado, disse o ministro, no caso em questão pode-se dizer que não se trata de seqüestro, e sim de homicídio.

A Lei 9.140/95 – conhecida como a Lei da Anistia, prosseguiu o relator, reconheceu como “presumidamente” mortas as pessoas desaparecidas que participaram de atividades políticas entre setembro de 1961 e outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal. Da mesma forma, disse o ministro, a legislação argentina (Lei 14.394/54) diz que a ausência da pessoa sem que dela se tenha notícia, por três anos, causa a presunção de seu falecimento.

Dessa forma, considerando que com relação ao crime de homicídio a prescrição na Argentina acontece em 15 anos, e no Brasil em 20, o ministro Marco Aurélio votou pelo indeferimento do pedido de extradição.

Anistia

O ministro concluiu dizendo entender que o caso alcança o tema da anistia. Se aprovasse a extradição, revelou o ministro, o STF poderia estar causar o esvaziamento da lei de anistia. Feridas poderão vir a ser abertas, disse o relator. “Isso não interessa ao coletivo, não interessa à sociedade”, concluiu, revelando que a anistia deve ser entendida como uma virada de página, uma busca do convívio pacífico entre os cidadãos.

Os ministros Carlos Alberto Menezes Direito, Cármen Lúcia Antunes Rocha e Eros Grau acompanharam o relator, pelo indeferimento do pedido, sem contudo se comprometerem com os argumentos do ministro Marco Aurélio no tocante à Lei de Anistia.

Divergência

Já o ministro Ricardo Lewandowski divergiu do relator, votando pelo deferimento parcial do pedido de extradição, apenas quanto ao suposto seqüestro imputado ao militar, lembrando que o crime é de caráter permanente, e portanto não pode ser considerado prescrito. O ministro deu como exemplo o caso de bebês que foram tirados de suas mães, naquela época, e até hoje se encontram em poder de outras famílias.

Outra alegação da defesa do major, de que o acusado teria recebido indulto do governo, por meio do Decreto 1.003/89, foi rebatida por Lewandowki. O ministro afirmou que esse decreto foi julgado inconstitucional. Assim, considerando estarem presentes os pressupostos pela concessão da extradição, o ministro votou pela concessão, em parte, da extradição.

Ao pedir vista dos autos, o ministro Cezar Peluso afirmou ter dificuldade em admitir a existência de um crime de homicídio sem a existência de um corpo.

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