Valorização de imóvel após rescisão contratual por atraso da obra não gera direito a indenização

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) não reconheceu o direito a indenização pela valorização de imóvel comprado na planta, pleiteada por comprador que requereu rescisão judicial do contrato de promessa de compra e venda antes da entrega do bem, em virtude de atraso na conclusão da obra.

Ao rejeitar, por unanimidade, o recurso do comprador, o colegiado registrou que a eventual valorização do imóvel não se enquadra como perdas e danos, bem como não significa a frustração de um ganho que ele pudesse legitimamente esperar.

O relator, ministro Villas Bôas Cueva, afirmou que o acréscimo de valor do imóvel pleiteado pelo comprador não decorreu da inexecução do contrato – como exigido no artigo 43, inciso II, da Lei 4.591/1964 –, mas de fatores externos, de ordem eminentemente econômica.

Rescisão do contrato e lucros cessantes

Após a incorporadora apresentar novo cronograma de conclusão da obra, com atraso de cerca de 14 meses em relação ao prazo inicial, o consumidor ajuizou ação pleiteando a rescisão do contrato de compra de dois apartamentos e a indenização de perdas e danos e de lucros cessantes.

O juiz de primeiro grau determinou a resolução do contrato e a restituição dos valores pagos pelo comprador. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) ordenou também o pagamento de lucros cessantes, com base no preço de mercado do aluguel das unidades prometidas, por todo o período do atraso até a data da rescisão do contrato.

Ao STJ, o consumidor pediu que, no cálculo da indenização por dano material, fosse incluída a valorização do imóvel no período compreendido entre a assinatura do contrato e a data prometida para a efetiva entrega do prédio.

Eventual valorização de imóvel não equivale a perdas e danos

O ministro Villas Bôas Cueva explicou que, conforme o artigo 403 do Código Civil, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes causados por efeito direto e imediato da inexecução do contrato, ainda que esta resulte de dolo do devedor. Assim, a tese do comprador dos imóveis “não encontra amparo legal”.

O relator apontou jurisprudência do STJ que diz ser a valorização de imóvel um fenômeno meramente econômico, e não fruto ou produto do bem, pois ela decorre da própria existência do imóvel no decorrer do tempo, conjugada a outros fatores, como localização e estado de conservação (REsp 1.349.788).

De acordo com o ministro, não há relação de causalidade entre o prejuízo alegado pelo adquirente e o comportamento da incorporadora, pois, ainda que não houvesse atraso da obra, poderia ocorrer uma mudança no preço do imóvel ao longo do tempo.

“O inadimplemento contratual verificado na hipótese caracteriza, sob o prisma da causa eficiente, um evento de natureza secundária e meramente condicionante, incapaz de produzir o liame necessário à indução do dever de indenizar”, afirmou.

Comprador poderia esperar conclusão da obra

Villas Bôas Cueva lembrou que, no caso de adiamento na entrega, além da rescisão contratual, o artigo 43-A, parágrafo 2º, da Lei 4.591/1964 faculta ao comprador esperar pela conclusão da obra, de modo a incorporar ao seu patrimônio uma eventual valorização do imóvel adquirido na planta, com direito à indenização de 1% do valor efetivamente pago à incorporadora, para cada mês de atraso (pro rata die).

Para o ministro, no entanto, ao optar por desfazer o negócio, o comprador preferiu receber a integralidade dos valores pagos, devidamente atualizados, a aguardar uma eventual e incerta valorização futura dos apartamentos prontos – circunstância que não gera para a incorporadora o dever de indenizar.

“A eventual frustração da expectativa de lucro ventilada na hipótese não decorre de um ato compulsório imposto pelo vendedor, mas da opção pela resolução antecipada do contrato, livremente exercida pelo próprio adquirente”, concluiu o relator.

O recurso ficou assim ementado:

RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. CONSUMIDOR. INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA. COMPRA E VENDA. IMÓVEL. ENTREGA. ATRASO. ALTERAÇÃO. CRONOGRAMA. RESOLUÇÃO JUDICIAL. CONTRATO. OPÇÃO. ADQUIRENTE. STATUS QUO ANTE. RETORNO. RESTITUIÇÃO. VALORIZAÇÃO. PERDAS E DANOS. NÃO INTEGRAÇÃO. VIOLAÇÃO. LEI FEDERAL. AFASTAMENTO. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. SIMILITUDE FÁTICA. AUSÊNCIA.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3⁄STJ).
2. Não se conhece do recurso especial interposto pela alínea “c” do permissivo constitucional quando ausente a similitude fática entre os casos confrontados.
3. De acordo com o artigo 43, inciso II, da Lei nº 4.591⁄1964, o incorporador deve responder civilmente pela execução da incorporação, devendo indenizar os adquirentes dos prejuízos que a estes advierem do fato de não se concluir a edificação ou de se retardar injustificadamente a conclusão das obras.
4. Eventual valorização do imóvel não se enquadra no conceito de perdas e danos. Não representa uma diminuição do patrimônio do adquirente, nem significa a perda de um ganho que se devesse legitimamente esperar.
5. O suposto incremento do valor venal do imóvel não decorre, de forma direta e imediata, da inexecução do contrato, mas de fatores extrínsecos, de ordem eminentemente econômica.
6. A frustração da expectativa de lucro ventilada na hipótese não decorre de ato compulsório imposto pelo vendedor, mas da opção pela resolução antecipada do contrato livremente exercida pelo adquirente.
7. Recurso especial conhecido e não provido.

Leia o acórdão no REsp 1.750.585.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1750585

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