UNIÃO deve fornecer medicamento à portadora de doença no sistema sanguíneo

Atividades de trabalhadoras de empresa do Mato Grosso do Sul não podem ser exercidas a distância

Decisão da Primeira Vara Federal de Corumbá/MS autorizou o afastamento e o pagamento de salário-maternidade a gestantes de uma empresa em virtude da pandemia da Covid-19. A companhia atua na área de recreação e lazer e não há possibilidade de as empregadas desenvolverem as funções a distância.

A ação foi proposta sob a alegação de que não está claro na Lei 14.151/2021, que trata do afastamento da empregada gestante durante a pandemia, a quem cabe o custeio da remuneração no período e de que o ônus não deve ser atribuído à empregadora.

Documentos juntados aos autos demonstraram que a empresa, localizada em Corumbá/MS, desenvolve atividades exclusivamente presenciais de recreação e de lazer e conta com diversas empregadas, sendo algumas delas gestantes.

Ao analisar o caso, o juiz federal Felipe Bittencourt Potrich ponderou que a legislação determinou que grávidas fossem afastadas das atividades presenciais para exercerem as funções remotamente sem prejuízo da remuneração. No entanto, segundo ele, a norma não tratou dos casos em que o trabalho é realizado de forma exclusivamente presencial e de quem seria a responsabilidade pelo pagamento.

Ao determinar o afastamento e o pagamento do benefício, o magistrado frisou que a Constituição Federal de 1988 conferiu especial proteção à saúde, à maternidade, à família e à infância e que a Convenção 103 da Organização Internacional do Trabalho, Internalizada pelos decretos 58.820/66 e 10.088/19, estabelece que as prestações devidas em razão dessas condições devem ser custeadas por seguros obrigatórios ou fundos públicos e não pelo empregador.

“Seja por força da Constituição Federal, seja por norma supralegal, cabe efetivamente ao Estado a proteção dos bens jurídicos em questão”, ressaltou.

O magistrado também lembrou que o artigo 394-A da CLT, na redação dada pela Lei 13.467/17, prevê o pagamento do auxílio-maternidade quando não for possível que a gestante ou a lactante afastada exerça suas atividades em local salubre na empresa.

Assim, o juiz federal concedeu tutela de urgência e autorizou a empresa afastar as empregadas gestantes com atribuições não compatíveis com o trabalho à distância, na forma da Lei 14.151/2021 e determinou à empresa o pagamento do salário-maternidade, mediante compensação com os valores devidos a título de contribuição social sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos.

O recurso ficou assim ementado:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO DE ALTO CUSTO. SOLIRIS (ECULIZUMAB). PACIENTE PORTADOR DE SÍNDROME HEMOLÍTICO-URÊMICA ATÍPICA. NECESSIDADE DEMONSTRADA. DIREITO À SAÚDE. DEVER DO ESTADO. APELAÇÃO DESPROVIDA.

1. O Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp 1.657.156/RJ, submetido à sistemática dos recursos repetitivos, estabeleceu a seguinte tese, a ser observada nos processos distribuídos a partir daquela decisão: Constitui obrigação do Poder Público o fornecimento de medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS, desde que presentes, cumulativamente, dos seguintes requisitos: (i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; (ii) Incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; e (iii) Existência de registro na ANVISA do medicamento.

2. No caso em apreço, há relatórios, prescrições e exames médicos que comprovam ser a autora portadora de síndrome hemolítico-urêmica atípica (SHUa), doença sistêmica rara, grave e fatal. Além disso, a autora é beneficiária da justiça gratuita e o medicamento eculizumabe-SOLIRIS® possui registro na ANVISA.

3. Conquanto a perícia médica realizada nos autos tenha sido desfavorável à pretensão da autora, ao consignar que o eculizumabe-SOLIRIS® não trouxe qualquer melhora ao seu estado de saúde e que inexistem provas de que o medicamento seja eficaz para este tipo de enfermidade, o fato é que não cabe unicamente à Administração decidir qual o melhor tratamento médico que deve ser aplicado ao paciente, uma vez que a autoridade administrativa não pode limitar o alcance dos dispositivos constitucionais.

4. Uma leitura constitucional do caso demonstra que o postulado da dignidade da pessoa humana não permite, em nenhuma hipótese, o estabelecimento rígido do fornecimento de determinado medicamento/tratamento, sem chances de modificação, somente para que assim se onere menos o Estado.

5. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça entende pela desnecessidade de realização de prova pericial, sendo suficiente a receita fornecida pelo médico. Nesse sentido: AgRg no REsp 1173795/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 13/05/2014, DJe 21/05/2014.

6. À vista disso, cumpre asseverar que o tratamento com eculizumabe-SOLIRIS® tem, sim, dado resultados positivos, como se verifica pelos relatórios médicos acostados aos autos, datados de 01.01.2017 e 06.09.2017, os quais reiteram a necessidade de continuidade de ministração do medicamento, diante da recuperação parcial da função renal da paciente.

7. Considerando, assim, o alto custo do referido medicamento e não tendo a autora condições de custeá-lo, negar-lhe o fornecimento pretendido implicaria desrespeito às normas constitucionais que garantem o direito à saúde e à vida.

8. Apelação desprovida.

Procedimento Comum Cível 5000587-10.2021.4.03.6004

Deixe um comentário

Precisa de ajuda?