Recursos repetitivos com impacto em milhares de processos por todo o país, casos criminais envolvendo agentes políticos e julgamentos sobre questões inéditas nos mais variados ramos do direito estão na pauta do Superior Tribunal de Justiça (STJ) para o segundo semestre de 2021.
A sessão da Corte Especial que marcará a abertura do semestre forense vai acontecer nesta segunda-feira (2), a partir das 14h, com transmissão ao vivo pelo canal do tribunal no YouTube.
Confira, na sequência, um resumo com os principais assuntos previstos para os julgamentos do período.
Penhora de verba alimentar em ação de improbidade
No dia 18 de agosto, a Corte Especial analisa agravo interno contra a decisão do ministro Napoleão Nunes Maia Filho (aposentado) que negou seguimento a um questionamento do Estado de Rondônia sobre suposta divergência de interpretação a respeito da possibilidade de penhora de verba de natureza alimentar para satisfazer multa civil fixada em ação de improbidade administrativa.
Em setembro de 2018, ao julgar o Recurso Especial 1.704.379, relatado pelo ministro Mauro Campbell Marques, a Segunda Turma afirmou que a verba alimentar é impenhorável, conforme já consolidado em recurso repetitivo.
O estado sustentou que, em outros julgamentos, o STJ mitigou a aplicação desse entendimento de acordo com o caso concreto, para evitar decisões injustas ou não razoáveis. Rondônia busca retomar o desconto de 20% dos proventos de um servidor aposentado, condenado por improbidade a pagar multa de R$ 1,2 milhão.
Em embargos de divergência, a procuradoria do ente público citou julgamentos com posição contrária à da Segunda Turma. O ministro Napoleão negou seguimento aos embargos por entender que a discussão anterior foi sobre execução de título, e não sanção por improbidade administrativa. Agora, o colegiado julga o agravo de Rondônia contra essa decisão (EREsp 1.704.379).
Ações penais em discussão no STJ
Ao menos dois casos criminais de grande repercussão envolvendo autoridades com foro por prerrogativa de função devem ser julgados no segundo semestre.
Ainda sem data prevista, a Corte Especial vai analisar o recebimento de denúncia contra o governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), por supostamente ter desviado recursos públicos ao comprar respiradores de duas empresas que não eram do ramo – uma delas era loja especializada em vinhos.
Os fatos ocorreram no contexto do combate à pandemia da Covid-19 no Amazonas. O Ministério Público Federal (MPF) denunciou o governador e outras 16 pessoas. De acordo com o MPF, o governador cometeu o crime de peculato, já que teria atuado para desviar dinheiro público em favor das empresas.
O relator da ação penal, que tramita em segredo, é o ministro Francisco Falcão. O julgamento estava previsto para 30 de junho, mas foi retirado de pauta diante da apresentação de novos elementos de prova e do pedido de alguns acusados para renovação do prazo de manifestação.
Ainda segundo o MPF, uma organização criminosa foi montada no governo do Amazonas com o objetivo de desviar recursos destinados para o combate à pandemia. Somente na compra de 28 respiradores, o MPF aponta um superfaturamento de pelo menos R$ 496 mil. Há pedido de decretação da perda do cargo público, além de indenização por danos morais coletivos.
Compra de sentenças e disputa de terras
A Corte Especial também deve analisar a Ação Penal 965, resultante da Operação Faroeste, deflagrada para apurar um esquema de compra de sentenças em disputas de terras na região oeste da Bahia.
Segundo o MPF, a organização criminosa – com participação de magistrados, empresários, advogados e servidores públicos – teria praticado atos ilegais relacionados à disputa por mais de 800 mil hectares de terras, além de ter movimentado cifras bilionárias. São imputados aos denunciados os crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
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Na APn 965, um dos réus é o empresário Adailton Maturino dos Santos, que está em prisão preventiva, acusado de ser o idealizador do esquema criminoso. O ministro relator, Og Fernandes, destacou que há provas de diversos registros de identidade falsa relacionados ao empresário, bem como notícia de prisões anteriores e indícios de um vultoso patrimônio ainda não identificado completamente.
A Corte Especial deverá analisar o recebimento de denúncia em outras quatro ações penais da Operação Faroeste.
Repetitivos com julgamento em andamento
Neste segundo semestre, a Corte Especial deverá concluir o julgamento do Tema 978 dos recursos repetitivos (REsp 1.665.598 e REsp 1.667.189). O colegiado vai definir o termo inicial do prazo prescricional para o ajuizamento de ação indenizatória por pessoas que se dizem prejudicadas pela construção de usina hidrelétrica no Rio Manso: se é a data de início da construção da usina ou da ciência da exclusão do interessado da lista de pessoas a serem indenizadas.
O relator do caso, ministro Luis Felipe Salomão, acolheu em abril uma questão de ordem para definir a competência da Segunda Seção para o julgamento do recurso. Na sequência, o ministro Herman Benjamin pediu vista.
Os temas repetitivos 677, 878, 977, 1.040 e 1.056 também estão com julgamentos suspensos em razão de pedidos de vista.
Expurgos inflacionários em pauta
A Corte Especial também analisa o Recurso Especial 1.233.314, para definir se a prescrição é interrompida pela citação válida realizada nos autos de ação coletiva, em favor daqueles que optaram por ingressar posteriormente com ação individual.
O recurso é de uma cliente da Caixa Econômica Federal que tenta receber a correção monetária do saldo da caderneta de poupança, atingida pelos expurgos inflacionários em janeiro de 1989, decorrentes de plano econômico do governo federal.
A ação, proposta em 2009, foi considerada prescrita em primeira e segunda instâncias. O caso foi levado à Corte Especial, segundo o relator, ministro Luis Felipe Salomão, para que o STJ uniformize a interpretação sobre o assunto. O julgamento foi suspenso em junho por pedido de vista do ministro Mauro Campbell Marques.
Prescrição em ações sobre contrato de seguro
A Segunda Seção pode julgar o Incidente de Assunção de Competência 2 (REsp 1.303.374), no qual será discutida a aplicação do prazo anual de prescrição em todas as pretensões que envolvam interesses de segurado e segurador em contrato de seguro.
O relator é o ministro Luis Felipe Salomão, e o julgamento foi suspenso em junho por pedido de vista da ministra Nancy Andrighi. Salomão disse que a matéria em exame consiste em relevante questão de direito, com notória repercussão social e sem repetição em múltiplos processos, apta, portanto, a ser solucionada pelo incidente de assunção de competência.
Corpo estranho em alimento
Ainda na Segunda Seção, a ministra Nancy Andrighi é a relatora do REsp 1.899.304, cujo julgamento está suspenso pelo pedido de vista do ministro Marco Buzzi.
O colegiado busca firmar entendimento quanto à possibilidade de dano moral por responsabilidade objetiva do fabricante e do revendedor, no caso de consumidor que encontrou corpos estranhos em alimento (segundo o laudo, fungos, insetos vivos e mortos), sem que tenha havido a ingestão.
A Defensoria Pública de São Paulo contesta decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que descartou a indenização por danos morais para o consumidor, arbitrada na sentença em R$ 5 mil.
Prisão domiciliar para mães de filhos pequenos
No âmbito do direito penal, a Terceira Seção analisará o Recurso em Habeas Corpus 145.931, no qual se discutem as regras para a concessão da prisão domiciliar para mãe de criança menor de 12 anos. O caso é de uma mulher condenada a nove anos de reclusão em regime inicial fechado.
Houve liminar concedendo a prisão domiciliar até o julgamento de mérito na seção. O relator é o ministro Sebastião Reis Júnior, e o julgamento foi suspenso por pedido de vista do ministro Rogerio Schietti Cruz, em junho.
No RHC 122.036, a ser julgado pela Sexta Turma, a defesa do ex-governador do Paraná Beto Richa (PSDB) pede o trancamento de ação penal que trata de crimes de fraude a licitação e corrupção passiva. A defesa alega nulidades quanto a perícias e gravações ambientais feitas sem o conhecimento dos interlocutores.
O Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) negou o pedido, por entender que as gravações não embasaram exclusivamente a instauração da ação, e outros indícios foram suficientes para demonstrar a justa causa para o recebimento da denúncia. A relatora do caso é a ministra Laurita Vaz, que está com vista regimental do processo.
Já na Quinta Turma, os ministros vão analisar o recurso de um engenheiro denunciado pelo desabamento da laje na área de lazer de um condomínio de luxo em Vitória, ocorrido em 2016, que matou uma pessoa.
A defesa afirma que não há prova de nexo causal entre a conduta do engenheiro e o desabamento da laje, pois ele foi apenas autor de projetos, não tendo participado de nenhuma etapa da construção.
O relator do RHC 138.369, ministro Felix Fischer, decidiu monocraticamente pela rejeição do recurso, por considerar que não é possível falar em inépcia da denúncia ou falta de justa causa para a ação penal, no curso da qual o profissional terá todos os meios de defesa. Após recurso do engenheiro, cabe ao colegiado a decisão sobre trancar ou não a ação.
Aplicação da Selic na reparação de danos
Entre os casos de destaque que serão julgados pelas turmas do STJ no segundo semestre está o REsp 1.081.149, no qual a Quarta Turma decidirá sobre a incidência ou não da Taxa Selic nas dívidas civis, especialmente quando relacionadas a reparações de danos contratuais e extracontratuais, tendo em vista os diferentes marcos iniciais dos juros moratórios e da correção monetária embutidos na Selic.
Segundo o relator, Luis Felipe Salomão, a controvérsia é relativa à interpretação a ser dada ao artigo 406 do Código Civil. O Ministério da Economia, o Banco Central, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) e outras entidades foram chamados para atuar como amici curiae.O julgamento foi suspenso por pedido de vista regimental do relator logo após o voto do ministro Marco Buzzi, que deu parcial provimento ao recurso da consumidora, entendendo que a taxa incidente a que se refere o artigo 406 do Código Civil é a do artigo 161, parágrafo 1º, do Código Tributário Nacional, ou seja, de 1% ao mês, ou 12% ao ano.
O instituto do cram down na recuperação de empresas
No segundo semestre, a Quarta Turma deverá concluir o julgamento do AREsp 1.551.410, relatado pelo ministro Antonio Carlos Ferreira. Nesse recurso, que está com pedido de vista do ministro Luis Felipe Salomão, o colegiado analisa o instituto do cram down, aplicado em processos regidos pela Lei de Recuperação Judicial e Falências (Lei 11.101/2005).
O instituto possibilita a aprovação do plano de recuperação da empresa mesmo sem o cumprimento dos requisitos previstos na lei. O objetivo do cram down é a preservação da empresa, ainda que em detrimento de interesses exclusivos de determinadas classes de credores.
No caso, o Banco do Brasil recorre de decisão do relator que aplicou o cram down. Segundo Antonio Carlos Ferreira, o STJ entende pela possibilidade de aplicação do instituto, mitigando as condições estabelecidas no artigo 58 da Lei 11.101/2005, em circunstâncias que podem evidenciar o abuso de direito por parte do credor recalcitrante quanto ao plano de recuperação proposto.
Atraso em pagamentos das obras de Xingó
A Segunda Turma deverá concluir o julgamento do REsp 1.611.929, relatado pelo ministro Mauro Campbell Marques. O caso está com pedido de vista da ministra Assusete Magalhães.
O recurso trata de pedido de indenização feito por empresas de engenharia e construção contra a Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf), em decorrência de atrasos no pagamento de faturas relativas ao contrato de empreitada e seus aditivos para as obras da Usina Hidrelétrica de Xingó.
A Chesf foi condenada a pagar indenização de R$ 23,7 milhões. No STJ, União, Chesf e também as empresas recorrem da decisão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5), especialmente quanto ao valor da indenização e dos encargos.
Ressarcimento por retenção de valores do DPVAT
No REsp 1.361.388, a Segunda Turma analisa recurso contra decisão do TRF4 que entendeu ser de cinco anos o prazo prescricional para o ajuizamento de ação que visa o ressarcimento de danos causados aos cofres públicos, quando a hipótese não é de ato de improbidade administrativa.
Na origem, um cidadão de Chapecó (SC) entrou com ação popular questionando a forma de repasse das verbas do seguro DPVAT, criado para indenizar as vítimas de acidentes automobilísticos ou seus sucessores.
Segundo o autor da ação, as seguradoras fizeram deduções indevidas ao longo de vários anos nas verbas repassadas ao Sistema Único de Saúde (SUS) pelo atendimento de acidentados, gerando prejuízo milionário aos cofres da União.
Quem entrou com o recurso especial foi a União, discutindo o prazo prescricional para o pedido de ressarcimento de danos ao erário – no caso, a devolução dos valores que teriam sido retidos pelas seguradoras. A União afirma que a pretensão de ressarcimento ao erário é imprescritível, o que permitiria o prosseguimento da ação popular para a devolução dos valores.
O relator é o ministro Og Fernandes, e o julgamento foi suspenso por pedido de vista do ministro Herman Benjamin.
Improbidade administrativa e a Operação Lava Jato
A Segunda Turma vai analisar, no REsp 1.890.353, se foi válido o aditamento de petição inicial de ação por improbidade administrativa para incluir o pedido de danos morais sofridos pela Petrobras em razão dos episódios investigados na Operação Lava Jato.
As construtoras acusadas de improbidade nas fraudes contra a estatal recorrem da decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) que admitiu o aditamento. Já a Petrobras sustenta que a celebração de acordo de leniência por algumas das empresas rés não prejudica a sua pretensão de ver reparados os danos morais decorrentes do abalo de imagem sofrido por ela.
O relator, ministro Herman Benjamin, deu provimento parcial ao recurso da Petrobras e rejeitou o recurso das construtoras. O julgamento foi suspenso por pedido de vista do ministro Og Fernandes.