Proposta de teses estabelece formas diferentes para empresas estatais em geral e de economia mista com regime concorrencial
O procurador-geral da República, Augusto Aras, encaminhou ao Supremo Tribunal Federal (STF) parecer em que sugere fixação de tese sobre o Tema 1.022 da sistemática de repercussão geral. O tema trata da possibilidade de dispensa imotivada de empregado de empresa pública e de sociedade de economia mista admitido por concurso público. Além de sugerir a tese, Aras manifestou-se pelo desprovimento do Recurso Extraordinário 688.267.
Empregados do Banco do Brasil, admitidos por concurso público e demitidos sem justa causa, questionam no STF acórdão do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que os impede de serem reintegrados aos seus respectivos empregos. Eles argumentam que a demissão sem justa causa teria violado os princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade e da publicidade, constantes do art. 37, caput, II, e art. 41, da Constituição Federal. Afirmam, ainda, que somente poderiam ser dispensados por justo motivo devidamente apurado, apontando que os entes da Administração Pública indireta exercem múnus estatal, e, por isso, submetem-se aos princípios basilares do direito administrativo.
Apresentada ao Plenário Virtual, o STF reconheceu a existência de repercussão geral da controvérsia, mesmo tendo em julgamento de outro recurso (RE 589.998) fixado a tese do Tema 131 de que “os empregados públicos, como regra, não fazem jus à estabilidade prevista no art. 41 da Constituição Federal, ressalvando, porém, o dever de motivação da dispensa, por incidência necessária dos princípios da impessoalidade e da isonomia na Administração Pública direta e indireta”.
Ao reconhecer a existência de repercussão geral do RE 688.267, o STF aponta que levou em consideração as particularidades da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) e as múltiplas diferenças existentes entre aquela empresa pública e instituições com o Banco do Brasil para firmar a tese vinculante de que há a obrigação de motivar o ato de demissão.
Natureza jurídica das estatais – Para Aras, embora tenham regimes jurídicos que se aproximam, empresas públicas e sociedades de economia mista, e mesmo essas entre si, guardam peculiaridades que necessitam ser examinadas e conduzem a conclusões diversas quanto ao dever de motivação das demissões. “Embora, a priori, as empresas estatais apresentem natureza jurídica de direito privado, submetem-se a regime jurídico heterogêneo, na medida em que se sujeitam a normas de direito público e também a normas de direito privado”, explica.
“As empresas estatais, tendo sempre como escopo a realização do interesse público, podem sofrer maior ou menor derrogação das normas de direito privado em favor de certas regras de direito público, uma vez que o seu regime jurídico não coincide, na integralidade, com o dos entes da Administração Pública, tampouco com o dos titulares do setor privado”, afirma o procurador-geral da República no parecer.
Segundo ele, a influência das normas de direito público sobre os atos praticados por empresas estatais é impactada pela natureza jurídica que ostentam, pelo tipo de serviço público prestado e pela atividade econômica desenvolvida, inclusive para os fins da relação jurídico-empregatícia e para a necessidade de motivação dos respectivos atos de demissão, tendo em conta a dinâmica do regime concorrencial a que eventualmente se submetam, e a necessidade de segurança e controle sobre os atos praticados em nome do interesse público.
“O caráter de prestadora de típico serviço público e executora de políticas públicas, bem como sua performance no mercado – se de atividade econômica stricto sensu ou em sentido amplo, em regime concorrencial ou monopolístico – é que há de mensurar a maior ou menor vinculação da estatal aos princípios da Administração Pública, inclusive para os fins do regime jurídico-administrativo e das obrigações do respectivo ente governamental”, afirma Aras em um dos trechos do documento.
O procurador-geral da República explica que as sociedades de economia mista que atuam em regime de monopólio ou que são responsáveis pela execução de políticas públicas e as empresas públicas sofrerão maior influência das normas de direito público, com as restrições necessárias ao atingimento do interesse público, uma vez que desempenham típico múnus público e sua gestão está sob forte influência do Poder Público.
Já as estatais que exercem atividade econômica em sentido estrito, que atuem no livre mercado, estão desprendidas de certas restrições impostas à Administração Pública. Mesmo públicas em suas origens, tais empresas hão de utilizar meios, instrumentos e processos comuns ao setor empresarial para que realizem suas operações em igualdade de condições com a iniciativa privada. “Para estatais dessa natureza, impor a observância de regras e ritos voltados ao setor público significa interferir na lógica empresarial e obstaculizar o seu funcionamento em isonomia com a livre iniciativa, acarretando-lhe desvantagem que pode desequilibrar o mercado concorrencial”, destaca.
Para Augusto Aras, esse é o caso do Banco do Brasil. “Em atenção à lógica empresarial e ao equilíbrio do mercado econômico, as sociedades de economia mista que exploram atividade econômica stricto sensu em regime de concorrência hão de ser dispensadas da obrigação de motivar formalmente a demissão de seus empregados”, diz.
No entanto, explica, as sociedades de economia mista que atuam em regime de monopólio e que são responsáveis pela execução de políticas públicas, bem como as empresas públicas, têm a obrigação de motivar, em ato formal, a dispensa de seus empregados. E ressalta que, para todos os casos, se verificada ilegalidade ou abuso de poder, ressalva-se, em homenagem ao princípio da inafastabilidade da jurisdição, a possibilidade de controle jurisdicional do ato de demissão.
Propostas de teses – Dessa forma, o procurador-geral da República opinou pelo desprovimento do recurso extraordinário e sugeriu as propostas de teses de repercussão geral: I – As sociedades de economia mista que atuam em regime de monopólio ou que são responsáveis pela execução de políticas públicas e as empresas públicas têm a obrigação de motivar, em ato formal, a demissão de seus empregados; II – As sociedades de economia mista que exploram atividade econômica stricto sensu em regime de concorrência podem dispensar seus empregados sem motivação em ato formal, ressalvada a possibilidade de controle jurisdicional do ato, se verificada ilegalidade ou abuso de poder.
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Íntegra do parecer no Recurso Extraordinário 688.267